Iraque: cerca de 700 páginas de informes escritos foram analisadas pelos jornais (picture alliance / Colaborador/Getty Images)
AFP
Publicado em 18 de novembro de 2019 às 15h56.
Última atualização em 18 de novembro de 2019 às 15h57.
Centenas de documentos dos serviços de Inteligência iranianos vazados revelaram a "vasta influência" do Irã sobre o Iraque, onde os manifestantes denunciam há semanas a incompetência de seus dirigentes e a ingerência -- segundo eles -- de Teerã nos assuntos de seu país.
O jornal americano "The New York Times" e o site de jornalismo investigativo The Intercept afirmaram, nesta segunda-feira (18), terem examinado cerca de 700 páginas de informes escritos, em sua maioria em 2014 e em 2015, pelo Ministério iraniano de Inteligência e enviados por uma fonte anônima para o Intercept.
A fonte disse que queria "mostrar ao mundo o que o Irã faz em (seu) país, o Iraque".
"Estes vazamentos sem precedentes revelam a vasta influência do Irã no Iraque, detalhando anos de trabalho minucioso dos espiões iranianos para cooptar líderes do país, pagar agentes iraquianos (...) e infiltrar todos os aspectos da vida política, econômica e religiosa do Iraque", segundo o NYT.
Os documentos destacam o "papel único do general (Qasem) Soleimani", em referência ao chefe da força Al-Qods dos Guardiães da Revolução, o Exército ideológico do Irã.
Este general viaja regularmente ao Iraque. De acordo com fontes políticas ouvidas pela AFP, nas últimas semanas, presidiu reuniões em Bagdá e em Nayaf, no sul, para convencer os partidos políticos a apoiarem o primeiro-ministro, Adel Abdel Mahdi. Os manifestantes pedem a saída do premiê.
"O Irã intervém no nosso país", reclamava uma manifestante na faixa dos 40, nesta segunda, em Bagdá.
Esta mulher celebrou que o Irã também tenha sido palco de protestos desde sexta-feira, após a alta do preço da gasolina. "A faísca que começou no Iraque chegou ao Irã", afirmou.
Os iraquianos continuam saindo às ruas de Bagdá e de outras cidades para reclamar a saída de seus dirigentes, acusando-os de corrupção. Escolas e prédios do governo permaneciam fechados em Kut, Nayaf, Diwaniya e Nassiriya, no sul xiita, lugares onde o país vizinho é especialmente vaiado.
Desde o início da mobilização, em 1º de outubro, mais de 330 pessoas morreram, a maioria manifestante.
De 1980 a 1988, Irã e Iraque de Saddam Hussein, dois países petroleiros, envolveram-se em uma guerra.
Teerã se tornou um aliado de peso para o Iraque, sobretudo, nestes últimos anos, após quase uma década de domínio dos Estados Unidos. Os americanos invadiram o país em 2003, o que levou à queda do governo de Saddam Hussein.
O Irã mantém estreitos vínculos com vários políticos iraquianos e ajudaram a formar os poderosos grupos paramilitares de Hash al-Shaabi, que contribuíram para a derrota do grupo extremista Estado Islâmico.
Também se trata de um importante sócio comercial, que vende energia elétrica e gás natural para o Iraque.
Segundo o NYT e o Intercept, Teerã recorreu a grandes operações dos serviços de Inteligência para manter estes laços.
A "maior prioridade" - diz o NYT - era "manter o Iraque como cliente (...) e se assegurar de que as facções leais a Teerã permaneciam no poder".
Em um dos documentos vazados, o primeiro-ministro Adel Abdel Mahdi é descrito como alguém com uma "relação especial" com Teerã quando era ministro do Petróleo em 2014.
Ao ser contactada pela AFP, o gabinete do primeiro-ministro afirmou não ter "nenhum comentário" sobre este caso.