Donald Trump: presidente dos Estados Unidos (ANDREW CABALLERO-REYNOLDS /AFP)
Agência de notícias
Publicado em 17 de março de 2025 às 15h09.
A União Europeia (UE) alertou nesta segunda-feira que o congelamento imposto pelo presidente americano, Donald Trump, à mídia financiada pelos Estados Unidos, pode “beneficiar adversários comuns” entre Washington e o bloco.
A declaração foi feita após o republicano começar a demitir funcionários da Voice of America (VOA) e de outras emissoras, incluindo a Radio Free Europe/Radio Liberty (RFE/RL), após congelar seu financiamento.
Horas após Trump assinar um decreto na sexta-feira determinando o desmantelamento da agência federal que supervisiona a Voice of America, centenas de jornalistas, executivos e outros funcionários da sede da organização em Washington foram informados de que seriam colocados em licença remunerada. Trabalhadores do veículo disseram ao The Times que rapidamente perderam acesso aos seus e-mails de trabalho e a outros programas de comunicação.
Grande parte do conteúdo da Voice of America é produzida em Washington e, em seguida, transmitida para uma rede de afiliadas em todo o mundo. Com a maior parte da equipe impedida de trabalhar, pelo menos algumas das frequências de rádio da VOA na Ásia, no Oriente Médio e em outras regiões ficaram fora do ar ou passaram a transmitir apenas música, segundo relatos de funcionários.
Em outros casos, emissoras de rádio, televisão e portais digitais que utilizavam a programação da VOA continuarão operando, mas sem as contribuições dos Estados Unidos. Algumas dessas afiliadas também transmitem conteúdo fornecido por meios de comunicação estatais de países como Rússia e China, cujas narrativas eram, ao menos em parte, contestadas pela programação da Voice of America.
“Esses veículos de mídia têm sido um farol de verdade, democracia e esperança para milhões de pessoas ao redor do mundo”, disse a Comissão Europeia em comunicado ao político no domingo. “Em uma era de conteúdos não moderados e notícias falsas, o jornalismo e a liberdade de imprensa são fundamentais para a democracia”.
A porta-voz da Comissão Europeia, Paula Pinho, reforçou a mensagem à AFP, acrescentando que o congelamento do financiamento seria discutido durante uma reunião dos ministros das Relações Exteriores da UE em Bruxelas nesta segunda-feira. Mas se a União Europeia fez as declarações sem citar quais seriam os “inimigos em comum”, o presidente e CEO da RFE/RL, Stephen Capus, foi mais direto:
— O cancelamento do acordo de financiamento da Radio Free Europe/Radio Liberty será um grande presente para os inimigos da América. Os aiatolás iranianos, os líderes comunistas chineses e os autocratas em Moscou e Minsk celebrarão o fim da RFE/RL após 75 anos de existência. Dar essa vitória aos nossos adversários os tornará mais fortes e os EUA mais fracos — disse ele no sábado.
Os esforços do governo Trump para encerrar a Voice of America fazem parte de uma campanha mais ampla para enfraquecer a imprensa. A Casa Branca, por exemplo, recentemente proibiu a Associated Press de cobrir certos eventos devido à recusa da agência de notícias em se referir ao Golfo do México como “Golfo da América”. Trump e seus aliados processaram veículos de comunicação e indicaram que pretendem intensificar as ações judiciais contra a imprensa.
A Voice of America começou suas transmissões em 1942, como parte de um esforço federal para combater a propaganda nazista na América Latina e em outras regiões. Até este fim de semana, a emissora transmitia conteúdos em dezenas de idiomas e alcançava centenas de milhões de ouvintes fora dos EUA, incluindo na China e no Irã, cujos governos impõem rígidos controles sobre fontes de notícias estrangeiras.
No primeiro mandato de Trump (2017-2021), a Casa Branca criticou repetidamente a VOA, alegando que a emissora tinha um viés liberal. Os esforços do governo republicano para alinhar a emissora financiada pelos contribuintes à agenda de Trump, incluindo a realização de investigações internas sobre alguns jornalistas, foram posteriormente considerados impróprios por investigadores federais.
Neste ano, Trump agiu rapidamente para silenciar a emissora. Ele nomeou Kari Lake, uma ex-apresentadora de televisão conservadora, para comandar a Voice of America. Antes mesmo de sua chegada, a emissora começou a desencorajar seus jornalistas de fazer declarações que pudessem ser interpretadas como críticas a Trump — uma tentativa de evitar ataques por parte do presidente.
Ainda assim, no sábado a Casa Branca divulgou um comunicado acusando a Voice of America de disseminar “propaganda radical” e alegando que seus funcionários tinham um viés ideológico de esquerda. A crítica se assemelha à que Trump e seus aliados frequentemente fazem contra a mídia tradicional.
Steven Herman, um veterano correspondente da VOA, foi colocado em uma “licença justificada” por tempo indeterminado neste mês, enquanto uma investigação de recursos humanos analisava suas postagens nas redes sociais sobre o governo Trump. No sábado, ele escreveu que “fechar efetivamente a Voice of America é apagar um farol que brilhou intensamente durante alguns dos momentos mais sombrios desde 1942”.
O congelamento do financiamento da mídia afeta diversas outras emissoras norte-americanas além da Voice of America e da RFE/RL, incluindo a Radio Farda, uma emissora em persa bloqueada pelo governo do Irã, e a Alhurra, uma rede de língua árabe criada após a invasão do Iraque para contrabalançar a cobertura altamente crítica da al-Jazeera, sediada no Catar. Irã, China e Rússia têm investido fortemente em veículos de mídia estatais criados para competir com narrativas ocidentais e promover as posições de seus governos.