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Ucrânia recebe proposta de acordo de minerais em troca de mais apoio militar dos EUA, diz Zelensky

Minuta será estudada por Kiev, que esperava obter garantias de segurança; texto inicial contém pouca proteção e faz novas exigências que podem sobrecarregar finanças do país

Agência o Globo
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Publicado em 28 de março de 2025 às 19h39.

Última atualização em 28 de março de 2025 às 19h40.

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Mais de um mês depois que Washington e Kiev discutiram pela primeira vez um acordo para conceder aos Estados Unidos uma participação importante nos projetos de exploração de minerais, petróleo e gás da Ucrânia em troca de mais apoio militar, os dois lados voltaram à estaca zero nas negociações. O presidente ucraniano informou nesta sexta-feira que Kiev recebeu formalmente da Casa Branca uma nova proposta de entendimento, mas disse que ela exige um "estudo detalhado".

— Gostaria de observar que oficialmente, e isso é importante, o lado ucraniano, ou seja, o Gabinete de ministros da Ucrânia e meu escritório, hoje, por meio de uma nota, recebemos oficialmente as propostas dos EUA hoje — disse Zelensky em uma entrevista coletiva em Kiev.

Segundo ele, porém, a nova proposta exige um “estudo detalhado”, e um acordo final ainda está longe, embora não queira “deixar os EUA com a sensação de que a Ucrânia é contra isso em geral”.

— Apoiamos a cooperação com os EUA. Não queremos enviar nenhum sinal que possa levar os EUA a interromper a ajuda à Ucrânia — afirmou durante a entrevista coletiva, em uma clara tentativa de evitar irritar a Casa Branca, como ele fez no mês passado depois de rejeitar propostas anteriores, o que levou parcialmente os EUA a cortar temporariamente a ajuda à Ucrânia.

A nova proposta retoma a exigência inicial do presidente Trump de que a Ucrânia reembolse os EUA pelos bilhões que Kiev recebeu em ajuda militar e financeira desde a invasão em grande escala da Rússia há três anos, de acordo com três autoridades ucranianas atuais e antigas, algumas das quais falaram ao jornal New York Times sob condição de anonimato para discutir negociações delicadas.

O novo esboço também repete as versões anteriores ao omitir qualquer menção a garantias de segurança para a Ucrânia, uma cláusula que Kiev pressionou insistentemente e conseguiu incluir em um esboço no mês passado, mas que Washington resistiu por muito tempo.

Como nas propostas anteriores, a Ucrânia teria que contribuir com metade de sua receita de projetos de recursos naturais e infraestrutura relacionada, como portos e oleodutos, para um fundo de investimento controlado pelos EUA. O lucro do fundo seria reinvestido em projetos de recursos naturais ucranianos, embora a parcela exata desse lucro não tenha ficado clara.

Trump há muito tempo está interessado nos recursos minerais da Ucrânia — incluindo lítio e titânio, cruciais para a fabricação de tecnologias modernas — argumentando que obter acesso seria uma maneira de “recuperar” a ajuda que os Estados Unidos deram à Ucrânia.

Na semana passada, ele disse em discurso na Casa Branca que os EUA assinariam “muito em breve” um pacto com a Ucrânia. O secretário do Tesouro americano, Scott Bessent, por sua vez, afirmou à Fox News nesta semana que Washington havia entregado um documento finalizado de parceria que esperava que pudesse ser assinado já na próxima semana.

Segundo o vice-primeiro-ministro ucraniano, Yulia Svyrydenko, porém, a Ucrânia “está trabalhando para garantir que o acordo reflita todos os nossos interesses”. E vários congressistas ucranianos sugeriram que o governo não poderia aceitar esse acordo e que seriam necessárias novas negociações.

Kiev esperava obter garantias de segurança em troca do acesso aos recursos minerais, mas as minutas iniciais incluíam pouca proteção e novas exigências que podem sobrecarregar as finanças do país por anos, de acordo com o texto obtido pelo New York Times. Washington também teria rejeitado o envio de forças de paz para a Ucrânia, segundo o jornal americano.

Por outro lado, a nova proposta é mais específica sobre como o lucro seria compartilhado: Washington reivindicaria todo o lucro do fundo até que Kiev reembolsasse pelo menos o equivalente à ajuda dos EUA recebida durante a guerra mais 4% de juros anuais.

Washington também manteria o “direito de primeira oferta” em novos projetos e o poder de vetar a venda de recursos ucranianos a outros países. E no primeiro ano do acordo, a Ucrânia seria proibida de oferecer qualquer projeto de investimento a terceiros com condições financeiras ou econômicas melhores do que as oferecidas aos Estados Unidos.

O texto entregue esta semana ainda define os detalhes do papel da Sociedade Financeira Internacional para o Desenvolvimento, uma agência do governo dos EUA responsável por investir em empresas e projetos no exterior. A agência controlaria o fundo nomeando três membros do conselho, enquanto a Ucrânia teria apenas dois. A agência também supervisionaria cada projeto em que os ganhos do fundo fossem investidos.

Após intensas negociações sobre um acordo de minerais, a Ucrânia conseguiu, no mês passado, suavizar algumas das exigências mais rígidas de Washington e chegou a um acordo que Kiev considerou mais aceitável. Mas o acordo fracassou após uma desastrosa reunião no Salão Oval da Casa Branca que terminou com um bate-boca televisionado entre Trump e Zelensky.

Agora, as exigências que Kiev havia conseguido eliminar anteriormente — que Washington mantenha o controle do fundo e que a Ucrânia pague a ajuda anterior dos EUA — ressurgiram na última proposta, que Zelensky disse ter recebido há alguns dias. As garantias de segurança também desapareceram.

A nova proposta “efetivamente transforma a Ucrânia em uma colônia americana”, escreveu Roman Sheremeta, economista ucraniano e reitor fundador da American University em Kiev, no X.

A proposta foi relatada pela primeira vez na noite de quinta-feira por agências de notícias americanas e britânicas, incluindo o jornal Financial Times, que publicou o novo rascunho de 55 páginas.

Yaroslav Zhelezniak, um deputado ucraniano da oposição que obteve a nova minuta e revelou seus principais pontos em um vídeo na quinta-feira, disse que considerava as novas exigências uma oferta de abertura para mais negociações.

— Tenho certeza de que ela será atualizada — afirmou em uma entrevista na quinta-feira, acrescentando: — Não há nenhuma chance de que ela seja aprovada como está agora.

Ainda assim, nesta sexta, as autoridades de Kiev não rejeitaram totalmente as novas exigências americanas, lembrando-se de que as recusas anteriores haviam prejudicado as relações entre os EUA e a Ucrânia.

— Seria irresponsável criticar esse documento porque ele ainda está sendo negociado — disse Oleksii Movchan, membro do partido de Zelensky e vice-presidente da comissão parlamentar de desenvolvimento econômico, por telefone, nesta sexta-feira, ao New York Times. — O objetivo é continuar as negociações e chegar a um acordo.

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