Donald Trump, presidente dos EUA, com a primeira-dama, Melania, ao sair da Casa Branca (Brendan Smialowski/AFP)
Repórter de macroeconomia
Publicado em 12 de julho de 2025 às 08h00.
As tarifas anunciadas pelo presidente Donald Trump contra o Brasil poderão enfrentar desafios legais dentro dos Estados Unidos, por terem razões políticas e não comerciais, avalia Valentina Sader, vice-diretora no think tank Atlantic Council, baseado em Washington, e chefe do departamento de Brasil.
"Os Estados Unidos têm superávit comercial com o Brasil. Entre os países que receberam as cartas esta semana, é o único nessa posição. Domesticamente, nos EUA, tarifas recíprocas são legalmente justificadas quando há déficit comercial, o que não é o caso aqui", diz Sader, em conversa com a EXAME.
"Portanto, se essa ameaça tarifária se concretizar, o próprio governo Trump poderá ter desafios legais internos para apoiá-la", avalia.
O presidente americano disse que vai impor uma tarifa comercial de 50% a todos os produtos brasileiros, a partir de 1º de agosto. A medida, no entanto, ainda não foi oficializada.
Trump tem adotado as novas tarifas por meio de ordens executivas, um tipo de decreto presidencial. Essas ordens têm base em poderes dados ao presidente por leis comerciais dos EUA, como a IEEPA (Lei de Emergência Econômica Internacional, em português) e a seção 301, uma parte do US Code (espécie de Código Civil americano) que trata de comércio.
Estas leis permitem aumentar tarifas a países que, na visão americana, tenham adotado práticas comerciais injustas ou discriminatórias contra produtos americanos, ou que tragam ameaça à segurança nacional, mas não prevê o uso delas para retaliações políticas.
Para punir governos considerados antidemocráticos ou que desrespeitam direitos humanos e regras internacionais, os EUA possuem a figura jurídica das sanções, que são impostas pelo Departamento do Tesouro, ligado à Casa Branca.
As sanções podem envolver um embargo à compra de produtos de um determinado país, empresa ou região, tomada de propriedades em solo americano e veto à emissão de vistos para as pessoas atingidas. No entanto, o modelo de sanções não prevê a imposição de tarifas comerciais, tratadas pelo Departamento de Comércio.
A vice-diretora vê espaço para que a nova tarifa de 50% seja negociada, e que o etanol poderá ser um ponto central da discussão.
"A Casa Branca já havia citado as tarifas brasileiras sobre o etanol americano como um exemplo de práticas comerciais desleais. Esse poderia vir a ser um ponto de negociação para uma relação econômica vista como mais benéfica para os americanos", afirma.
Sader avalia que o adiamento da entrada em vigor das novas taxas "pode indicar que o principal objetivo do governo Trump com as tarifas é, de fato, a negociação", diz.
"Considerando o histórico diplomático do Brasil, Brasília deve usar dessa ferramenta para dialogar e, sim, negociar. O prazo de 1º de agosto dá ao Brasil algum tempo", afirma.
A vice-diretora aponta ainda que a elevação da taxa ao Brasil deverá estimular a buscar outros mercados, e que uma maior aproximação dos brasileiros com a China vai gerar preocupação nos EUA.
"Nos Estados Unidos, há apoio de ambos os partidos contra a China, com medidas claras para conter a influência chinesa no mundo, mas isso é especialmente preocupante em seu próprio continente", diz Sader.
"Assim, o governo brasileiro pode estar numa posição excepcionalmente favorável para negociar essa taxa, tanto por conta dos potenciais desafios domésticos americanos quanto pelo desafio estratégico geopolítico", afirma.