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Trump: agressivo, e globalista, como nunca

Em discurso à Assembleia Geral, Trump foi ameaçador e agressivo como poucas vezes visto no plenário da ONU

Trump: agressivo e globalista, Trump pediu por união - a ele e sua pauta (Eduardo Munoz/Reuters)

Trump: agressivo e globalista, Trump pediu por união - a ele e sua pauta (Eduardo Munoz/Reuters)

TL

Thiago Lavado

Publicado em 19 de setembro de 2017 às 15h28.

“Nós vamos destruir totalmente a Coreia do Norte caso sejamos forçados a nos defender ou defender nossos aliados”. A frase sem brechas a interpretações foi o ponto alto no discurso do presidente americano Donald Trump na Assembleia Geral da ONU, nesta terça-feira. Trump falou também sobre como a Coreia do Norte representa uma ameaça comum ao mundo, que deve ser combatida em conjunto. “A única solução para a Coreia do Norte é acabar com seu programa nuclear. O ‘homem foguete’ está em uma missão suicida. Se a maioria de bons não agir contra o pequeno número de maus, então o mal irá triunfar”.

Trump também falou do apoio do governo do Irã a grupos terroristas como o Hezbollah, criticou o acordo nuclear com o país (firmado pela gestão anterior) e falou sobre o combate no Afeganistão, no Iraque e na Síria a grupos terroristas, que ameaçam a soberania de seus vizinhos. Trump disse ainda que é preciso fazer mais para restaurar a democracia na Venezuela.

Foi um discurso direto e ameaçador como poucas vezes a Assembleia das Nações Unidas presenciou. Ainda assim, Trump surpreendeu ao estender a mão à ONU e aos aliados como nunca havia feito desde sua campanha. Falou de alianças, da importância da ONU na manutenção da paz nos últimos 70 anos — uma organização severamente criticada por ele no ano passado —, e até reiterou seu apoio à Europa, à ONU e às coalizões de aliados dos Estados Unidos, como a Otan. Trump relembrou o Plano Marshall, que reconstruiu a Europa após a segunda guerra, e parabenizou a ONU e a União Africana pelo trabalho nas missões de paz e pela liderança em temas humanitários.

O que fica do discurso de Trump? Primeiro, a ameaça de guerra com a Coreia voltou à pauta em termos mais claros do que nunca. Segundo, Trump mostrou uma mudança de postura em seu governo. Ele continua vendo o mundo como uma mesa de negociações, sem espaço para valores ou temas humanitários. Mas vem percebendo que, isolado de seus maiores aliados, e dos organismos internacionais, tem pouca chance de sucesso.

“Todos os líderes responsáveis do mundo têm a obrigação de servir a seus cidadãos e a democracia ainda é o melhor veículo para elevar a condição humana. Mas trazer uma vida melhor  para a população também requer que trabalhemos juntos em harmonia e unidade a fim de criar um futuro seguro e pacífico para todas as pessoas”, disse Trump no discurso à Assembleia Geral da ONU.

A mesma mudança de postura tem sido vista dentro de casa. Trump tem dialogado com democratas, se afastou dos republicanos e negociou projetos de maneira política. No último final de semana, espalhou-se a notícia de que Trump voltaria atrás com sua saída do Acordo Climático de Paris. A “saída da saída” foi dada pelo jornal The Wall Street Journal e dizia que, em Montreal numa reunião sobre meio-ambiente com mais de 30 ministros das principais nações do mundo, o governo Trump considerava voltar ao acordo sob circunstâncias melhores para os Estados Unidos.

O caso foi desmentido por um dos principais assessores econômicos do presidente, Gary Cohn, nesta segunda-feira. “Consistentemente com o anúncio do presidente em junho, nós estamos saindo do Acordo de Paris, ao menos que possamos trabalhar em cima de termos mais favoráveis aos Estados Unidos”, disse. Outros ministros presentes na reunião no Canadá, como o alemão Jochen Flasbarth, disseram que os enviados americanos haviam sido mal interpretados.

Um dos pontos mais chocantes da eleição do ano passado foi a promessa de Trump de que iria construir um muro em toda a fronteira com o México (que inclusive iria arcar com os custos da obra), a fim de evitar imigrações ilegais. Na semana passada, até esta que era uma das promessas mais emblemáticas e polêmicas da campanha parecia prestes a cair — ou nem ser erguida.

Em um jantar regado a comida chinesa e torta de chocolate com os líderes democratas da Câmara e do Senado, Nancy Pelosi e Chuck Schummer, respectivamente, Trump teria negociado, em troca de maiores investimentos em segurança da fronteira, seu apoio à legalização do DACA, decreto promulgado pelo ex-presidente Barack Obama para garantir o direito de cidadania a centenas de milhares de  crianças trazidas para os Estados Unidos por pais imigrantes. Trump — que durante sua campanha havia prometido acabar com o decreto — se mostrou favorável ao assunto inclusive no Twitter: “alguém realmente deseja se livrar de bons, educados e capazes jovens que têm trabalho, alguns servindo no exército? Realmente…” escreveu o presidente.

O pacto firmado com os democratas também não incluía um orçamento para a construção do famigerado muro. “Nós concordamos em cristalizar as proteções do DACA em lei rapidamente, além de trabalharmos num pacote para a segurança de fronteira, excluindo o muro, que é aceitável para ambos os lados”, disseram Pelosi e Schummer após a reunião.

Não só Trump estava abandonando uma de suas promessas de campanha relativas a imigrantes, como também postergava o muro com o México. Os conservadores, claro, ficaram malucos: o site Breitbart News, comandado pelo ex-estrategista chefe do presidente, Steve Bannon, chamou Trump de “Don da Anistia”; a articulista Ann Coulter, conhecida do público reacionário norte-americano, disse que o presidente deveria sofrer um impeachment; e até deputados republicanos disseram que “a base de Trump vai deixá-lo”.

Trump ou Trump? 

Para Robert Shapiro, professor de ciência política da Universidade Columbia, a situação é bastante controversa. “Ao mesmo tempo em que ele soa mais suave, soa também cada vez mais errático e imprevisível. Trump gravita em torno dos democratas porque os republicanos não conseguem dar o que ele quer. Ele está dizendo ‘se vocês não conseguem fazer isso, eu vou conseguir que os democratas façam”, afirmou.

Para Shapiro, a prova de até onde o presidente está disposto a ir está em questões mais cativas ao público alvo do presidente. “A questão agora é ver como Trump irá se comportar com as pautas que importam mais para ele, como a reforma tributária, e ver como sua base de apoio irá lidar com o presidente apoiando projetos fora da base. Os maiores perigos são o DACA, o muro e o Acordo de Paris”, disse.

Trump é um político solitário. E ele sabe disso. “A mídia falsa continua dizendo, ‘presidente Trump está isolado’. Eles dizem que estou isolado por lobistas, corporações, grandes nomes da política, Hollyood. BOM! Eu não os quero”, disse ele em um e-mail enviado a apoiadores de campanha no final de agosto. A ênfase em itálico foi dada pelo próprio Trump. Mesmo hoje, em seu discurso na Assembleia Geral, Trump lembrou a que veio. “Eu vou colocar a América primeiro, assim como eu espero que vocês coloquem os países de vocês em primeiro”.

Trump se importa mesmo é com sua própria visão: em 2015, no começo de sua campanha à presidência ele afirmou que se “identifica em algumas coisas como democrata”. Uma assertiva que já tinha dado em 2004. Desde 1987, quando se afiliou aos republicanos, Trump já trocou de partido cinco vezes. De acordo com o Comitê Eleitoral de Nova York, ele foi republicano de 1987 a 199, quando migrou para o partido da Independência. Em 2001, voltou para o partido Democrata para sair de novo em 2009, de volta aos republicano. Saiu do partido de novo no final de 2011, quando voltou em definitivo em abril de 2012.

Nesta terça-feira, ficou claro que Trump passou a ver a ONU como importante para a concretização de seus interesses pessoais. Ameaçar destruir a Coreia do Norte também está neste contexto. Se os demais países quiserem se unir a ele, melhor. Se não, Trump continuará sendo sozinho.

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