A frota de SP cresceu 43% nos últimos 13 anos: paulistano perde mais tempo no trânsito exposto à poluição (./Divulgação)
Vanessa Barbosa
Publicado em 10 de outubro de 2010 às 04h10.
São Paulo - Com número recorde de veículos nas ruas, o paulistano nunca passou tanto tempo no trânsito exposto aos males da poluição atmosférica. Nos últimos 13 anos, a frota de veículos na cidade de São Paulo cresceu 43%. Resultado: mais carros nas ruas ocupando pouco espaço - já que a malha viária não cresceu na mesma proporção - e maiores congestionamentos.
Implementado na cidade em 1997, o sistema de rodízio vê sua eficácia reduzida. Para se ter uma ideia, antes da vigência da restrição, o tráfego no corredor Consolação/Rebouças/Eusébio Matoso fluía a uma média de 17, 5 km/h, no horário de pico entre as 17h e as 20h. No ano passado, o índice caiu para 11,7 km/h.
Curiosamente, o rodízio foi criado para reduzir a poluição atmosférica no final da década de 90. Mas, com a evolução tecnológica dos veículos automotores, que se tornaram menos poluentes, já no ano seguinte a sua criação, o sistema passou a valer apenas para garantir da fluidez do trânsito. Entretanto, não há tráfego nem ar completamente imunes a um aumento tão intenso como o verificado em São Paulo.
"Embora a concentração de poluentes tenha diminuído e se mantido estável nos últimos anos, passamos mais tempo expostos à poluição por conta dos congestionamentos", afirma o professor de patologia Paulo Saldiva, chefe do Laboratório de Poluição Atmosférica Experimental da USP. "Nossa mobilidade está caindo".
Além da rotina diária de embreagem-primeira marcha-ponto morto, o paulistano enfrenta agora um período maior de exposição à poluição atmosférica. Quanto maior a lentidão dos veículos, mais gases poluentes são lançados no ar. A conta é simples, mas o perigo nem sempre é visível. Trata-se das micropartículas de poeira, um dos principais vilões do ar paulistano e o tipo mais maléfico ao organismo humano.
Medindo apenas 0,0025mm, elas resultam da combustão incompleta de combustíveis fósseis utilizados pelos veículos automotores e formam, por exemplo, a fuligem preta em paredes de túneis e latarias de carros. "Uma via de tráfego pesado é como uma chaminé de fábrica", diz Saldiva. "Seus níveis de poluição são até três vezes maiores que em outras vias mais tranquilas da cidade".
Apesar do dano que esse material impinge à saúde, a legislação brasileira ainda não dispõe de critérios para estabelecer o controle das emissões desse poluente. A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que a concentração de material particulado fino não ultrapasse os 10 microgramas por metro cúbico. Já os padrões dos EUA recomendam 15 microgramas por metro cúbico. Na média, São Paulo mantém índice de 15 a 20 microgramas por metro cúbico nos últimos dois anos.
Esse cenário é um composto explosivo para a saúde pública. Imperceptível a olho nu, o material particulado não encontra barreiras físicas: afeta o pulmão e pode causar asmas, bronquite, alergias e outras graves doenças cardiorrespiratórias. Em dias de alta contaminação do ar, o risco em São Paulo de morte por doenças respiratórias e cardiovasculares aumenta entre 12% e 17%. As internações hospitalares aumentam em até 25%, e as pessoas mais atingidas são idosos e crianças.
Por ano, segundo Saldiva, são contabilizados cerca de quatro mil óbitos ligados à poluição atmosférica. "O pior é que a poluição gerada pelo congestionamento pune de forma desigual diferentes níveis sociais", ressalta. "Alguém à espera de um ônibus num ponto, por mais de meia hora, por exemplo, inala doses maiores de poluentes do que alguém que volta pra casa de carro".
<hr> <p class="pagina">Estima-se que o custo da poluição atmosférica para saúde gira em torno de 200 milhões de reais, considerando só os gastos do Sistema Único de Saúde (SUS), sem incluir gastos com compra de remédio. Os números alarmantes, entretanto, não refletem uma piora na qualidade do ar paulistano. Em verdade, as condições atmosféricas da capital melhoram, e muito, nos últimos 20 anos - seja pela otimização das tecnologias veiculares, menos poluentes, seja pela vigência de programas governamentais de controle das emissões.<br><br>"Um veículo de 1983, por exemplo, emitia 33 gramas de monóxido de carbono por quilômetro rodado. Em 2008, esse mesmo veículo emitia 0,37 gramas, quase 100 vezes menos", explica Maria Helena Martins, gerente de qualidade do ar da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb). <br><br>Para ela, o aumento da frota paulistana não refletiu negativamente no ar paulistano porque foi compensada por veículos novos. "Os padrões de qualidade do ar com relação às partículas inaláveis, as MP10, só foram excedidos duas vezes em 2008, contra 162 em 1997", diz. Mas alerta: "Se a frota continuar aumentando, todo esse benefício da melhoria da qualidade do ar corre o risco de ser anulado".<br><br>Na última terça (08), das 12 estações de monitoramento da qualidade do ar na capital paulista, apenas duas indicavam boas condições. As outras dez apontavam qualidade regular. No início da semana, a Defesa Civil municipal decretou estado de atenção em toda a cidade devido ao índice de umidade relativa do ar abaixo de 30%. <br><br>"Um ar com qualidade regular é reprovável", afirma o professor Paulo Saldiva. "Ele prenuncia um aumento no número de internações e de mortes". A baixa umidade permite maior suspensão de gases poluentes na atmosfera, o que pode provocar secura nas garganta e ardência nos olhos, além de problemas respiratórios. <br><br>Segundo Maria Helena, da CETESB, recentemente as secretarias estaduais do Meio Ambiente e a de Saúde estão se reunindo para rever os padrões de qualidade do ar da região metropolitana. A conferir.</p>