ELIZABETH HOLMES: sua história é boa demais para ser verdade? / Getty Images
Da Redação
Publicado em 28 de abril de 2016 às 16h00.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h26.
Em 2003, Elizabeth Holmes, então com 19 anos, tomou duas decisões. A primeira foi abandonar o curso de engenharia química na Universidade Stanford para fundar uma startup. A segunda foi passar a vestir apenas roupas pretas: calça, camisa de gola rolê, blazer, sapatos. Nos 11 anos seguintes, sempre vestindo o que chama de uniforme, Holmes trabalhou em segredo, ou em “modo invisível”, como se diz no Vale do Silício. Foi apenas em 2014 que ela anunciou a Theranos publicamente.
A promessa de Holmes era revolucionar o negócio de diagnósticos médicos. Em vez de exames de sangue demorados, realizados em equipamentos complexos e caríssimos, Holmes apresentou um sistema que dependia de apenas algumas gotas de sangue tiradas da ponta do dedo, com resultados quase instantâneos. Os ex-secretários de Estado americanos Henry Kissinger e George Shultz fazem parte do conselho de administração. Larry Ellison, o fundador da gigante do software corporativo Oracle, é um dos investidores da empresa.
Holmes é dona de metade das ações da Theranos, o que equivale a uma fortuna de 4,5 bilhões de dólares no papel, de acordo com a última avaliação da empresa. O problema é que a Theranos não conseguiu provar que sua tecnologia de fato funciona – e desde meados de abril a companhia está sob investigação do Departamento de Justiça e da SEC, o órgão que regula os mercados de capitais nos Estados Unidos. Holmes, uma loira de olhos azuis alta e atraente, apareceu em capas de revistas de negócios e logo foi comparada a inovadores como Steve Jobs (que também gostava de vestir preto e golas rolê) e Mark Zuckerberg (que abandonou Harvard para se dedicar ao Facebook). Mas o hype em torno da empreendedora durou pouco.
Depois de uma longa investigação, o The Wall Street Journal publicou uma série de reportagens afirmando que a tecnologia-chave da Theranos, uma máquina capaz de analisar as minúsculas amostras de sangue contidas no que empresa chama de nano-contêineres, simplesmente não estava pronta. A empresa já oferecia 240 exames comercialmente, mas apenas 15 deles eram realizados com a tecnologia da própria Theranos – o restante passava por equipamentos convencionais. Um mês depois da publicação das reportagens, a Theranos manteve o uso do nanocontêiner para um único exame. Todos os outros seria realizados em máquinas similares às encontradas nos laboratórios tradicionais.
Funcionários da empresa afirmaram ao WSJ que o equipamento – batizado de Edison, em homenagem ao famoso inventor americano – não produzia resultados confiáveis. Um estudo recente concluiu que os exames da empresa apontavam índices “sistematicamente mais baixos” de colesterol em comparação com concorrentes estabelecidos. A Food and Drug Administration, órgão regulador do governo americano responsável pela aprovação de remédios, repreendeu a Theranos, afirmando que o nanocontêiner é um recipiente “não-aprovado” para a coleta de sangue dos pacientes. A Walgreens, maior rede de farmácias dos Estados Unidos, oferece exames da Theranos em quiosques instalados em algumas lojas, mas já estaria tentando acabar com parceria diante da onda de notícias negativas.
A pergunta que todos se fazem é se a história da Theranos, uma empresa revolucionária e ainda por cima fundada por uma mulher – o que é raridade no Vale do Silício –, era boa demais para ser verdade. O Centers for Medicare and Medicaid Services, responsável pela regulamentação de laboratórios clínicos, afirmou que um laboratório da Theranos representava riscos para a saúde dos pacientes. A empresa afirma que um segundo laboratório – aprovado pelo órgão regulador, segundo a companhia –, foi responsável pela maior parte dos mais de 6 milhões de exames já realizados. Além da questão médica, a SEC investiga se Holmes enganou seus investidores ao ocultar o real estágio de desenvolvimento de sua tecnologia. Diante de tantas dúvidas a respeito da companhia, já há quem diga que o dano à reputação é irreparável.
(Sérgio Teixeira Jr., de Nova York)