Donald Trump, presidente dos EUA, durante evento na Casa Branca em 5 de agosto (Brendan Smialowski/AFP)
Repórter de macroeconomia
Publicado em 5 de agosto de 2025 às 18h53.
Última atualização em 5 de agosto de 2025 às 19h23.
A partir de 1h01 da madrugada desta quarta-feira, 6, passa a valer a nova tarifa de importação dos Estados Unidos contra produtos brasileiros, de 50%. Assim, o Brasil passará a ter maior tarifa individual cobrada pelos americanos para cada país.
A medida foi anunciada em 30 de julho pela Casa Branca e oficializada por uma ordem executiva. No documento, o presidente Donald Trump relaciona as tarifas aos processos na Justiça brasileira contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e contra empresas de tecnologia americanas, e pede que elas sejam extintas.
A medida, no entanto, isenta uma série de produtos que o Brasil exporta aos EUA, incluindo suco de laranja, minérios, aeronaves e petróleo. A lista completa soma cerca de 700 itens.
Ao mesmo tempo, a taxa vai incidir sobre outros itens importantes da pauta de exportações brasileiras, como a carne e o café, o que deve inviabilizar exportações brasileiras desses itens.
Segundo a Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos (Amcham), as isenções contemplam 42,3% do total das exportações que o país fez aos EUA em 2024.
Ao todo, os EUA compram cerca de 12% das exportações brasileiras. Um estudo da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), aponta que as tarifas poderão levar ao corte de 146 mil postos de trabalho no Brasil.
A medida coloca 40% adicionais de tarifas sobre a taxa de 10% anunciada em abril, adotada para todos os países, somando 50%. Assim, os itens isentos ficarão com tarifa de 10%.
As taxas ainda poderão ser revistas, para cima ou para baixo, segundo a ordem executiva. Caso o governo Trump avalie que o Brasil mudou de postura, pode baixar os percentuais. Já se houver retaliação por parte do país, o líder americano ameaçou subir as tarifas na mesma proporção do aumento brasileiro.
Há, ainda, o temor de que novas punições judiciais contra Bolsonaro e seus aliados possam levar os EUA a aumentarem as tarifas. Na noite de segunda, dia 4, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a prisão domiciliar do ex-presidente.
A ordem executiva diz que a nova cobrança não se aplica a "mercadorias que (1) sejam carregadas em um navio no porto de abastecimento e em trânsito em seu modo final de transporte antes de entrar nos Estados Unidos, antes de 0h01, hora do leste dos EUA (1h01 em Brasília, sete dias depois desta ordem (em 6 de agosto) e (2) tenha dado entrada para consumo ou retirado do depósito para consumo antes de 0h01, hora leste dos EUA, em 5 de outubro de 2025".
Desta forma, as mercadorias precisam atender duas condições para ficarem isentas da nova taxa: terem saído do porto inicial antes de 6 de agosto e terem chegado ao território americano até 5 de outubro.
"Aquelas que atendem ao primeiro item de estarem em trânsito devem ser declaradas até 5/out na aduana dos EUA para estarem isentas", diz Bernardo Leite, advogado especializado em Direito Internacional.
Além da tarifa, o presidente americano determinou uma investigação contra o Brasil por práticas comerciais desleais, com base na regra chamada de Seção 301. O processo está andamento e deverá ser concluído nos próximos meses. Por meio dele, o Brasil poderá sofrer punições comerciais adicionais.
Nas últimas semanas, o governo brasileiro buscou negociar a nova tarifa com os Estados Unidos, mas não obteve sucesso. Apesar disso, membros do governo Lula avaliam que o espaço para negociações permanece aberto mesmo após a implantação da tarifa.
Em outras ocasiões, o governo Trump já recuou ou adiou taxas após elas serem implantadas. Foi o que ocorreu em abril: uma série de cobranças individuais para países foi adiada para julho após uma queda forte no mercado de títulos da dívida americana.
Além do Brasil, Trump anunciou novas taxas para cerca de 70 países, que entrarão em vigor na quinta-feira, 7 de julho. Veja algumas das outras taxas por países, entre os principais parceiros comerciais dos EUA:
O governo Lula também deverá anunciar medidas para ajudar empresas exportadoras brasileiras que serão afetadas pelas novas taxas. Há também a possibilidade de que o país retalie as tarifas de alguma forma.
Na terça-feira, 5, horas antes de a nova tarifa entrar em vigor, Lula disse que não pretendia debater o tema em uma ligação com Trump. Na sexta-feira passada, o presidente americano disse que Lula poderia ligar para ele "quando quiser"e que "amava o povo brasileiro".
O governo americano disse que a medida é uma "resposta a políticas, práticas e ações recentes do governo do Brasil que constituem uma ameaça incomum e extraordinária à segurança nacional, à política externa e à economia dos Estados Unidos", disse a Casa Branca, em comunicado que anunciou as cobranças.
"O presidente Trump está defendendo empresas americanas contra extorsão, protegendo cidadãos americanos da perseguição política, salvaguardando a liberdade de expressão nos EUA contra a censura e salvando a economia americana de estar sujeita aos decretos arbitrários de um juiz estrangeiro tirânico", diz a nota.
O Brasil ressaltou que está aberto a negociar questões comerciais, mas não os temas judiciais, por que o poder Judiciário é independente e sujeitar suas decisões a um pedido estrangeiro representaria uma quebra da soberania nacional.
Os EUA possuem superávit comercial com o Brasil. Ou seja: vendem mais produtos para cá do que os brasileiros enviam para os americanos.
No primeiro trimestre de 2025, os dois países trocaram US$ 20 bilhões em mercadorias, sendo que os EUA tiveram superávit de US$ 653 milhões, segundo dados da plataforma Comexstat, do governo brasileiro.
Os Estados Unidos são o segundo maior parceiro comercial brasileiro, atrás da China. Os principais produtos exportados pelo Brasil para os EUA no ano passado foram:
Desde que tomou posse, em janeiro, Trump passou a aumentar tarifas de importação sobre outros países, sob argumento de que eles estariam trazendo problemas aos EUA.
Trump quer que as empresas voltem a produzir nos Estados Unidos, em vez de ter fábricas no exterior, como fazem há décadas para cortar custos. Assim, ao encarecer as exportações por meio de novas taxas, ele espera que mais indústrias se mudem para os EUA e gerem empregos no país.
Além disso, Trump reclama do déficit comercial dos EUA com os outros países, e usa as tarifas como meio de pressionar os parceiros a comprarem mais itens americanos. Em vários casos, houve acordos nesse sentido: um compromisso de maiores compras ou abertura de mercados a produtos dos EUA em troca de Trump desistir de novas taxas.
Assim, analistas apontam que Trump usa as novas taxas como um elemento de pressão. Ele cria um problema que não existia antes, as novas taxas, e exige que os outros países mudem de postura para não implantá-las.
Nesta quarta-feira, 6 de agosto, dia em que as novas tarifas de importação dos EUA para o Brasil entram em vigor, a EXAME fará um programa ao vivo para debater o cenário político e comercial das novas medidas.
A edição especial da série Macro em Pauta Internacional receberá Lucas Spadano, advogado especialista em comércio exterior que atuou na missão do Brasil na OMC, e Vinicius Vieira, professor de relações internacionais na FGV. A apresentação será feita por Rafael Balago, repórter de mundo da EXAME.
O programa começará às 10h e será exibido no site e no canal do YouTube da EXAME. Assista abaixo: