Mundo

Tarifaço de Trump: países que representam 41% das importações americanas seguem sem acordo comercial

Canadá, China e México ainda negociam acordos com os EUA. Em 2024, eles exportaram US$ 1,2 trilhão ao país governado por Donald Trump

Donald Trump, presidente dos EUA: a Casa Branca confirmou a elevação de tarifas para mais de 60 países, com alíquotas de até 50% (Anna Moneymaker/AFP)

Donald Trump, presidente dos EUA: a Casa Branca confirmou a elevação de tarifas para mais de 60 países, com alíquotas de até 50% (Anna Moneymaker/AFP)

Luciano Pádua
Luciano Pádua

Editor de Macroeconomia

Publicado em 3 de agosto de 2025 às 12h12.

Última atualização em 3 de agosto de 2025 às 12h36.

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, finalmente acabou com o suspense sobre as tarifas que iria impor aos países que quisessem fazer negócios com os americanos. Na prática, as sobretaxas elevaram de 2,4% para 18,3% as tarifas médias que os EUA aplicam, nas contas do Yale Budget Lab. Mas 41% das importações americanas ainda aguardam uma definição.

Esse é o quanto as exportações de México, Canadá e China representam para a economia norte-americana. Em 2024, os EUA importaram US$ 1,2 trilhão desses três parceiros.

"Mesmo com a novela das tarifas da semana passada, os três maiores exportadores de bens para os EUA ainda não têm acordos comerciais firmados", escreveu em post Simon Evenett, professor de Geopolítica e Estratégia da escola suíça de negócios IMD.

"O próximo prazo é 12 de agosto, quando expira a 'pausa' nas tarifas contra a China. Estão em jogo 41% das importações dos EUA", complementou.

De fato, esses três países -- os grandes parceiros comerciais dos EUA -- inspiraram a maior parte da narrativa de déficit comercial percebido por Trump. No ano passado, o déficit acumulado somente com eles foi de US$ 530 bilhões.

O Canadá e o México fazem parte de um acordo de livre-comércio com os EUA, chamado USMCA, que isenta de tarifas de importação os produtos que circulam entre eles, com algumas regras, como

As negociações entre os EUA e os países seguem.

"Autoridades dos EUA se reuniram com representantes chineses em Estocolmo, e o lado chinês afirmou que os EUA concordaram com outra pausa de 90 dias nas tarifas elevadas", escreveu Evenett.

"Autoridades americanas negaram e disseram que a decisão cabe ao presidente Trump — inclusive quanto à duração da extensão."

Na semana passada, Trump anunciou mais uma extensão de 90 dias para as negociações comerciais com o México.

Com o Canadá, que passou a enfrentar tarifas de 35% dos EUA a partir de 1º de agosto, as relações se intensificaram depois que o governo liderado pelo primeiro-ministro, Mark Carney, decidiu adotar uma política externa independente (anunciando que reconheceria o Estado da Palestina). "A expectativa é de que esse compromisso canadense acabe sendo deixado de lado por ora", apontou Evenett.

Canadá e México tiveram tratamentos distintos. "Trump anunciou uma nova pausa nas tarifas mais altas aplicadas ao México", escreveu o professor. "No entanto, para o Canadá, ele aumentou as tarifas para 35% sobre os produtos que não estão cobertos pelo acordo comercial USMCA (atualmente, a maior parte dos bens canadenses de valor significativo é exportada por empresas que já se adequaram para estar cobertas por esse acordo)."

Para o especialista, considerando as cadeias de suprimentos já estabelecidas, tarifas mais altas podem impactar significativamente o custo pago pelas empresas americanas — afetando sua competitividade e também os eleitores.

"Não é difícil imaginar um cenário em que empresas americanas, altamente dependentes dessas cadeias, acabem pagando mais tarifas do que concorrentes estrangeiros sujeitos apenas à alíquota padrão de 15%", disse.

Impacto das tarifas de Trump

Evenett também preparou um documento que compila os efeitos das tarifas de Trump, anunciadas na semana passada. Segundo ele, a nova abordagem reflete uma consolidação da estratégia America First aplicada ao comércio internacional.

Na prática, 66 países foram enquadrados em faixas tarifárias de 15% ou mais, com destaque para o Brasil, que, embora tecnicamente incluído na faixa de 10%, teve um adicional de 40% imposto por ordem separada -- embora muitos produtos tenham recebido isenções.

O Canadá e o México receberam tratamento diferenciado: os produtos canadenses não cobertos pelo acordo USMCA agora pagam 35%, enquanto o México obteve uma nova extensão de 90 dias sem aumento de tarifas.

“As idiossincrasias que afetam as relações comerciais entre os Estados Unidos e Brasil, Canadá e México farão com que esses países sejam tratados de forma diferente. Permanecerá uma considerável incerteza quanto ao tratamento tarifário aplicado às suas exportações”, escreveu Evenett na análise distribuída no início de agosto.

Mesmo países do Sudeste Asiático, que conseguiram reduzir suas alíquotas adicionais, estão sob escrutínio rigoroso para evitar triangulação de produtos chineses, observou Evenett. A ordem executiva, no entanto, não detalha os critérios futuros para revisão dessas tarifas, o que mantém um ambiente de instabilidade regulatória.

"Diante da incerteza sobre as tarifas aplicáveis à China e à Índia, e dos fortes incentivos para que países da ASEAN não façam reexportação de produtos chineses, o efeito líquido provavelmente será uma forte redução no incentivo para transferir fábricas para fora da China (onde as empresas já contam com um ecossistema de fornecedores que precisaria ser reconstruído do zero em outro lugar)", escreveu.

"Sair da China pode parecer óbvio — mas ir para onde?", afirmou o especialista em comércio exterior.

Por fim, Evenett destaca que o impacto financeiro e político da medida ainda está em aberto. Caso os mercados não reajam negativamente e os efeitos inflacionários não afetem a opinião pública, há chance de que essas tarifas se tornem permanentes após as eleições legislativas.

“Minha leitura da história das tarifas de importação dos EUA, desde o início do século XIX, indica que picos tarifários acontecem e, se durarem dois anos, tendem a se manter por muitos anos", disse, no documento. "Em termos práticos, isso significa que o período entre agora e os seis meses após as eleições legislativas intermediárias dos EUA será crítico. Por esses motivos — e talvez por outros — alguns continuarão a duvidar da determinação do presidente Trump em manter tarifas de importação mais altas."

Acompanhe tudo sobre:Donald TrumpChinaMéxicoCanadá

Mais de Mundo

Dólar na máxima, tensão política e eleições: os desafios de Javier Milei na Argentina

Zelenski trabalha para viabilizar troca de 1.200 prisioneiros com a Rússia

Egito lança campanha de prisões contra ‘tiktokers’ por vídeos contra a moral pública

Netanyahu expressa 'consternação' com vídeos de reféns israelenses em Gaza