PROTESTO EM MADRI: avanço de extremistas é uma das principais causas de preocupação no 8 de março na Espanha / REUTERS/Susana Vera (Susana Vera/Reuters)
Estadão Conteúdo
Publicado em 5 de maio de 2019 às 09h33.
Madri - A brasileira Maria Dantas foi eleita há uma semana para integrar o Parlamento da Espanha pelo partido Esquerda Republicana da Catalunha. A sergipana foi votar usando uma camiseta com o rosto de Marielle Franco, vereadora carioca assassinada há pouco mais de um ano.
Nascida em Aracaju, em Sergipe, Maria, que completa 50 anos em junho, vive há 25 anos em Barcelona. Crítica do presidente Jair Bolsonaro, ela diz que a ascensão dos partidos de ultradireita na Espanha a motivou a ingressar na vida política.
A sra. vive em Barcelona há 25 anos, o que foi fazer na cidade?
Eu era delegada adjunta da Polícia Civil e queria fazer um curso de extensão em direito ambiental. O Brasil tinha uma inflação astronômica na época. Era mais caro ir para São Paulo do que ir para Barcelona. Vendi meu carro e saí do País. No fim, acabei ficando por aqui.
A sra. disse que a ascensão do movimento de ultradireita a motivou a entrar na política. Por quê?
Foi um fator decisivo. Eu nunca aceitei entrar na política de partido. Foi a sexta vez que me chamaram. Recebi diversos convites, até da prefeitura de Barcelona. Desta vez, acabei aceitando. A Catalunha está em um momento político complicado. Vivemos uma repressão absurda do Estado espanhol.
Sofremos censura e não há liberdade de expressão. Há muitos presos políticos. Em maio do ano passado, o Vox não era nada. Foi muito parecido com o que aconteceu com o Bolsonaro no Brasil. Ninguém imaginava que ele seria presidente. Meu "input" na política, portanto, vem da luta contra o fascismo, o racismo e a homofobia.
O Vox teve um total de 24 deputados eleitos para o Congresso. O que isso significa?
Não podemos estar contentes, mesmo que eles tenham conseguido um número menor do que queriam. A ideia era eleger 50 deputados. Ainda assim, a extrema direita está no Congresso. O Vox foi fundado por integrantes mais reacionários do PP. Cresceu 10% em menos de um ano e teve 2,7 milhões de votos. O PP teve uma queda absurda no Parlamento, a maior desde a redemocratização.
A sra. também alega ter sofrido preconceito como estrangeira. A imigração será uma das bandeiras de seu mandato?
Passei por muitos momentos difíceis e não tenho vergonha de dizer isso. Trabalhei sem a documentação legal como empregada doméstica e garçonete. Sofri discriminação por ser sul-americana. Por isso, minhas pautas são voltadas para os direitos humanos, imigrantes e às mulheres.
Quero acabar com os Centros de Internação de Estrangeiros. As pessoas que estão ali não cometeram nenhum crime. Elas só estão em situação irregular no país. Há muitos brasileiros nesses lugares. Outra bandeira é a imigração de forma segura. Muitos imigrantes arriscam suas vidas, ficam dias em alto-mar em um barco apertado, sem água e comida, pagando valores absurdos a quadrilhas.
A sra. foi votar com uma camiseta de Marielle Franco. Como o mundo vê o Brasil depois do assassinato dela?
A Marielle é uma figura universal. As pautas dela são internacionalistas, antirracistas, antifascistas, anti-homofóbicas e antimachistas. A Marielle permeará em minha legislatura e na mente de todos os brasileiros que defendem os direitos humanos. Ela tem praça em Paris e estamos tentando fazer algo parecido aqui em Barcelona. Meu recado para o Bolsonaro é: Marielle está mais viva do que nunca.
A sra. foi eleita pelo Esquerda Republicana da Catalunha. Quais são suas pretensões políticas?
A Esquerda Republicana, fundada em 1931, é a mais antiga organização política da Catalunha ainda ativa e seu principal objetivo é a conquista de uma sociedade mais justa e solidária, sem desigualdades entre pessoas e territórios e considera que a estrada para fazer isso é obter a independência da Catalunha.
Como você vê a vitória do PSOE, de Pedro Sánchez, que ainda terá de negociar para formar governo?
Foi um alívio e agora esperamos que haja diálogo com outros partidos de esquerda, especialmente sobre presos políticos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.