Presidente Joe Biden (à esq.) e a juíza Ketanji Jackson: primeira indicação de Biden à Suprema Corte (Leah Millis/Reuters)
Carolina Riveira
Publicado em 7 de abril de 2022 às 06h00.
A juíza Ketanji Brown Jackson está a um passo de se tornar a primeira mulher negra da história da Suprema Corte americana. O Senado deve votar nesta quinta-feira, 7, para confirmar a indicação do presidente Joe Biden em favor da juíza, após seu nome ter sido sabatinado pela Comissão de Justiça no mês passado.
A jurista de 51 anos foi a primeira indicação de Biden à Suprema Corte desde que o democrata tomou posse, em janeiro de 2021. A indicação veio após o juiz Stephen Breyer, de 83 anos, decidir se aposentar voluntariamente.
A Suprema Corte tem hoje maioria de 6-3 para o grupo de juízes tidos como "conservadores", contra os chamados "liberais". A maioria virou após duas indicações que puderam ser feitas durante o mandato do ex-presidente Donald Trump.
A confirmação de Jackson não mudará esta formação, uma vez que ela substituirá o juiz Breyer, também liberal.
A decisão do magistrado em se aposentar veio em parte exatamente para garantir que Biden pudesse nomear outro juiz de visões progressistas enquanto os democratas ainda têm maioria no Congresso - a maioria pode ser perdida ainda neste ano nas eleições de meio de mandato, as chamadas midterms.
A juíza Jackson nasceu com o nome de Ketanji Onyika Brown, em Washington D.C, capital americana, e se formou pela prestigiada Harvard Law School, em 1996. Ela é casada com um médico e tem duas filhas.
Depois de formada, Jackson atuou em grandes escritórios privados dos EUA e, de modo incomum para juízes da Suprema Corte, fez parte de sua carreira como defensora pública.
A Suprema Corte teve dois juízes negros na história, mas nunca uma mulher negra. Atualmente, está na corte o magistrado Clarence Thomas (indicado na gestão do republicano George H. W. Bush, o "Bush pai"). Aos 73 anos, Thomas é frequentemente descrito como o juiz mais conservador da formação da Corte atual, e tem posições ferrenhas contra o aborto e a obrigatoriedade da vacinação.
Os democratas conseguirão levar adiante a nomeação de Jackson com sua maioria simples no Senado, apesar do pouco consenso em relação a seu nome. A Casa hoje se divide em 50-50 para democratas e republicanos, mas a vice-presidente democrata, Kamala Harris, tem o voto de minerava, o que garante maioria aos democratas.
Além disso, três senadores republicanos devem votar em seu favor.
Lisa Murkowski, do Alaska, e Mitt Romney, de Utah (que chegou a ser candidato à presidência contra Barack Obama em 2012), divulgaram os votos favoráveis a Jackson na segunda-feira, 4.
I intend to vote in support of Judge Ketanji Brown Jackson’s confirmation to be an associate justice of the U.S. Supreme Court. My statement: pic.twitter.com/uGaxx8sJn5
— Senator Mitt Romney (@SenatorRomney) April 4, 2022
Anteriormente, a senadora Susan Collins, do Maine, já havia declarado voto a favor da juíza, afirmando que "não deve concordar" com todas as suas decisões mas que seu voto é "uma rejeição da politização corrosiva" que têm tomado o Senado nas indicações para Suprema Corte.
Os apoios republicanos vêm após a confirmação de Jackson na Comissão de Justiça quase ter sido barrada em meio às disputas. Embora a nomeação só precise de maioria simples, o caso mostra a intensa divisão de posições entre democratas e republicanos no Congresso e a dificuldade para o presidente Joe Biden de passar qualquer decisão que necessite de apoio bipartidário.
Se confirmada, Jackson chegará à Suprema Corte em momento de grandes turbulências. A principal pauta no radar é a legislação americana sobre o aborto.
Uma série de estados republicanos têm passado leis para reverter a possibilidade de aborto, e o tema deve ser avaliado pela Suprema Corte ainda neste ano em meio às divergências entre as leis recentes dos estados e a jurisprudência.
O Texas votou para proibir no ano passado abortos com seis semanas de gravidez, mas especialistas em saúde argumentam que muitas mulheres sequer descobrem que estão grávidas antes deste período.
Nesta semana, Oklahoma - que tinha se tornado um grande destino para mulheres do Texas buscando o procedimento - também votou para proibir abortos. Outros estados caminham para fazer o mesmo.
A Suprema Corte está envolvida no tema porque leis como as do Texas e de Oklahoma vão contra uma decisão do próprio tribunal, no caso chamado de Roe v. Wade, em 1973.
Pela decisão da época, inspirada em princípios liberais e de direitos individuais frente ao Estado, a Corte reconheceu o direito ao aborto e estabeleceu que estados americanos teriam de permitir às mulheres realizar o procedimento até o momento em que o feto se torne "viável" - o que acontece em cerca de 23 semanas.
Em sua sabatina, Jackson foi questionada repetidas vezes sobre suas visões acerca do aborto. Ela afirmou que tem uma "visão pessoal" sobre quanto a "vida começa", mas que isso não interfere em seu trabalho de juíza.
Ela afirmou que considera que a decisão Roe v. Wade de 1973 é um precedente legal e que deve ser mantida. "Eu tenho uma crença religiosa que eu coloco de lado quando estou decidindo sobre casos", disse à Comissão de Justiça do Senado.