Soldados combatem guerrilheiros das Farc: o acesso e o uso da terra e as terras improdutivas são tópicos da mesa de negociações (Luis Robayo/AFP)
Da Redação
Publicado em 13 de novembro de 2012 às 14h19.
Bogotá - O problema da terra na Colômbia, país onde 1,15% da população possui 52% da grande propriedade rural, será a primeira prova de fogo para o governo e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) na mesa de negociações que se iniciará nesta quinta-feira, dia 15, em Havana.
O tema fundiário é um assunto que está na raiz do conflito colombiano, que dura quase meio século e que somente em sua expressão de desapropriação e expulsão deixa, desde 1985, 5,5 milhões de deslocados forçados e 6 milhões de hectares arrebatados.
"A questão da terra é um tema estrutural, quase que a gênese do conflito colombiano", explicou à Agência Efe o líder agrário Andrés Gil, porta-voz da Associação Camponesa do Vale do Rio Cimitarra (ACVC), que recebeu em 2010 o Prêmio Nacional de Paz.
Gil disse que se trata de um problema não resolvido cuja importância é abordada pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) em seus relatórios de desenvolvimento humano: no país, o índice de concentração da terra, que se mede em uma escala de 0 a 1, é de 0,58.
"É um dos mais altos do mundo", lamentou o líder da ACVC, que reúne camponeses de uma região do departamento de Santander que mantiveram sua organização apesar das ações da extrema-direita armada.
No entanto, a concentração fundiária não é a única característica do problema agrário na Colômbia, onde 32% dos 46 milhões de habitantes vivem no campo.
Em um recente relatório, o PNUD alertou em Bogotá sobre o estado improdutivo de grande parte das terras aptas à agricultura, que totalizam 21,5 milhões de hectares.
Delas, somente 4,9 milhões de hectares estão cultivados, apenas 22,7%, segundo o estudo, coordenado pelo especialista Absalón Machado e que também adverte sobre a desigualdade no acesso ao crédito: 78,2% dos empréstimos vão para as mãos dos grandes e médios produtores.
O acesso e o uso da terra, as terras improdutivas, a regularização da propriedade e a proteção de áreas de reserva rurais são alguns dos tópicos desse problema que ocuparão os negociadores do governo colombiano e das Farc a partir da próxima quinta-feira.
A questão também preocupa os povos indígenas do país, no total, 102, com uma população de 1,37 milhão de pessoas, das quais quase a metade está abaixo da linha de pobreza.
"Vivemos uma situação de expropriação territorial, nos encurralaram no alto das montanhas, as terras foram se deteriorando e as famílias foram crescendo", desabafou à Efe o representante indígena Gilberto Yasué.
Yasué pertence à etnia dos nasas ou paeces, com pouco mais de 100 mil habitantes distribuídos em dez localidades do norte do departamento do Cauca, um dos mais afetados pelos conflitos internos.
Os nasas lutam pela recuperação de suas terras ancestrais, que ficaram nas mãos de grandes fazendeiros e colonos, campanha que os mantém no meio do conflito, apesar de sua decisão de despejar todos os grupos envolvidos.
"Os acordos não foram cumpridos a contento, e o Conselho Regional Indígena do Cauca (Cric) não pode renunciar à dívida que o Estado tem", disse Yasué.
O problema territorial dos nasas entrou na agenda do Executivo do presidente Juan Manuel Santos, que antes da formalização da mesa com as Farc adotou uma lei de vítimas e restituição de terras.
O presidente espera restituir até 2014, quanto termina seu mandato, cerca de 2,5 milhões de hectares tomados de camponeses ou abandonados por retirantes.
A lei, em vigor desde janeiro, abriu as portas a um processo de queixas que foi procurado por mais de 26 mil pessoas, que buscam recuperar quase 2 milhões de hectares.
O ministro da Agricultura, Juan Camilo Restrepo, calculou que 35% dessas reivindicações correspondem à terra usurpada pelas Farc.
É mais um ingrediente para a mesa de negociações de Havana, cenário no qual Gil exige representação, como outros setores do país.
"Assistimos com expectativa essa troca, mas também temos muito a dizer e a contribuir", disse o porta-voz da ACVC, para quem seu grupo é vítima, testemunha e, também, protagonista.