Pessoas assistindo o funeral do Papa Francisco, que foi o 266º sumo pontífice (Mario Tama /Getty Images)
Repórter
Publicado em 26 de abril de 2025 às 11h52.
Última atualização em 26 de abril de 2025 às 13h08.
A origem do papado está ligada à formação inicial da Igreja Cristã e à figura do apóstolo Pedro, considerado pela tradição católica o primeiro Papa. Segundo Dayvid da Silva, teólogo e professor da Faculdade de Teologia da PUC-SP, a interpretação se baseia no Evangelho de Mateus (capítulo 16, versículo 16), no qual Jesus confere a Pedro a missão de liderar a Igreja. “Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja”, diz o trecho.
Silva também lembra que Pedro foi martirizado em Roma, local onde seus restos mortais estão guardados, e isso fundamenta o título de "Bispo de Roma" para todos os Papas que o sucedem.
“Independentemente de sua origem ou nacionalidade, ao ser eleito Papa, o cardeal automaticamente assume também o título de Bispo de Roma, simbolizando a sucessão direta de Pedro”, afirma o teólogo.
Paulo Raphael Oliveira Andrade, professor de filosofia e teologia da PUC-SP, reforça essa visão ao lembrar que, desde os primeiros séculos do cristianismo, há registros que ligam Pedro à liderança da Igreja em Roma.
Ele cita evidências patrísticas – como os escritos de São Clemente de Roma (94 d.C.), Santo Inácio de Antioquia (107 d.C.) e Santo Irineu de Lyon (180 d.C.) – que fazem referência a Pedro como a base da autoridade eclesiástica.
“Além disso, achados arqueológicos na necrópole sob a atual Basílica de São Pedro, no Vaticano, reforçam a tradição de que o apóstolo teria sido enterrado ali”, afirma Andrade.
No entanto, do ponto de vista histórico, a narrativa não é tão linear. Para o historiador André Leonardo Chevitarese, professor da UFRJ especializado em religião e cristianismo, a ideia de Pedro como primeiro Papa é um mito que se consolidou ao longo dos séculos.
Segundo ele, não há evidências históricas de que Pedro tenha estado em Roma. “Pedro, do ponto de vista histórico, nunca botou os pés em Roma. Do ponto de vista histórico, o papado no século I já começa com um mito”, afirma Chevitarese.
O historiador lembra que Pedro, assim como Jesus, viveu e morreu como judeu, sem ter fundado uma nova religião formalmente organizada. Para ele, os primeiros líderes cristãos em Roma, como Clemente I (na virada do século I para o II), foram de fato bispos locais, mas a ideia de papado – como autoridade suprema da Igreja – só começou a ser construída a partir do século V, com figuras como Leão I, Bonifácio I e Gelásio I.
Chevitarese alerta que, nos primeiros séculos, é preciso diferenciar os bispos de Roma dos papas como conhecemos hoje. “Essa luta pela primazia da Sé Romana e pela imposição de ideias para toda a cristandade só começa efetivamente no século V”.
Embora haja consenso dentro da tradição católica de que Pedro foi o primeiro Papa, os estudos históricos mostram que essa concepção foi sendo moldada ao longo do tempo, como parte da construção da identidade e autoridade da Igreja de Roma.
Do lado teológico, a sucessão a partir de Pedro é vista como elemento essencial da legitimidade da liderança papal.
Independentemente das interpretações, o apóstolo Pedro segue sendo uma figura central para o cristianismo, tanto como símbolo de fé e liderança quanto como pilar da construção da Igreja Católica.