Tuto Quiroga, candidato à Presidência da Bolívia (Martin Bernetti/AFP)
Estagiária de jornalismo
Publicado em 19 de outubro de 2025 às 08h01.
Jorge "Tuto" Quiroga, adversário do ex-presidente Evo Morales, poderá retornar à presidência da Bolívia. Desta vez, não por acaso, mas por meio das urnas.
Aos 65 anos, o político neoliberal lidera as pesquisas para o segundo turno das eleições bolivianas deste domingo, 19, contra o candidato de centro-direita Rodrigo Paz, segundo a AFP.
Formado nos Estados Unidos, onde estudou engenharia industrial na Universidade de Texas A&M e obteve mestrado em administração de empresas, ele se define como um defensor fervoroso da democracia.
Quiroga tinha 41 anos quando, em 2001, assumiu a Presidência. Ele era vice-presidente de Hugo Banzer, um militar reformado e eleito democraticamente, que teve que renunciar devido a um câncer terminal. Seu período no poder foi breve, apenas 12 meses.
Foram necessários 24 anos e duas candidaturas fracassadas, em 2005 e 2014, para que Quiroga voltasse a ter chances reais de retomar a Presidência.
Rodrigo Paz, que disputará o segundo turno contra Quiroga, também aposta no corte de gastos públicos como solução para a crise. Ambos defendem a redução de tarifas, a auditoria de empresas públicas para diminuir o investimento estatal e o fomento à exportação mediante créditos.
No primeiro turno, foi o candidato mais votado, com 32%. Quiroga conseguiu 26% dos votos.
A principal bandeira de campanha de Quiroga é uma transformação econômica para enfrentar a crise no país, que enfrenta inflação de dois dígitos.
O candidato propõe uma "terapia de choque" com a injeção de US$ 12 bilhões, que seriam obtidos com empréstimos internacionais.
"Não chovem dólares, tem que trazê-los. Para restabelecer a confiança cambial não basta dizer que houve mudança de governo, tem que haver dólares nos caixas eletrônicos", afirmou Quiroga em debate presidencial.
Ele garante que, caso seja eleito, tem assegurado um plano para obter recursos do FMI e outros organismos logo no dia seguinte à posse. "Sei como fazê-lo. Já fiz no passado. Minha vantagem é a experiência", declarou, em referência à sua gestão entre 2001 e 2002.
Sua proposta inclui eliminar o duplo imposto sobre investimento estrangeiro, liberar totalmente a importação de combustível e abrir a exploração de lítio para empresas estrangeiras, a fim de impulsionar a produção de baterias na Bolívia.
Em entrevista à CNN, Quiroga disse que o país precisa não apenas de uma "motosserra", em alusão à gestão do presidente argentino Javier Milei, mas de "facão, tesoura e tudo o que encontrar" para realizar um corte dramático nos gastos estatais.
O ex-presidente boliviano Evo Morales, impedido de disputar as eleições por exceder número de mandatos (Pablo Rivera/AFP)
Quiroga conta com o apoio da população urbana das classes altas e médias, principalmente dos setores industrial e agrário, segundo o El País.
No primeiro turno, ele recebeu grande parte dos votos na região mais rica da Bolívia, o leste.
Queiroga ocupou vários cargos no FMI, Banco Mundial e Corporação Andina de Fomento. Por isso, os apoiadores de Quiroga veem nele a capacidade de negociar e de obter condições favoráveis para o país.
No entanto, entre setores indígenas, Quiroga gera temores de que os povos originários ficarão em segundo plano.
"A extrema-direita para mim é o Tuto, porque mais do que tudo discrimina os collas", como são chamados os indígenas aimarás, disse o engraxate Daniel López, de 43 anos, em entrevista à AFP.
As eleições bolivianas ocorrem em um contexto de crise do partido Movimento ao Socialismo (MAS), que comandou o país por décadas, e debates sobre a identidade nacional.
O último censo mostrou que 38,7% dos bolivianos se declaram pertencentes a alguma nação originária, uma queda em relação aos 41% de 2012 e aos 62% de 2001.
Alguns setores conservadores, como o de Santa Cruz, pressionam os candidatos opositores para eliminar a figura do Estado Plurinacional e "voltar à República", segundo o El País. A demanda ganhou força após o censo de 2012, quando se argumentou que a queda da população indígena "fragmentava" a identidade nacional.
Nas eleições de primeiro turno, Evo Morales, impedido de concorrer, fez campanha pelo voto nulo. Pouco mais de 1,2 milhão de pessoas anularam seus votos, equivalentes a 19% do total, segundo o El País.
"Este voto nulo é um castigo à direita velha e à nova direita", afirmou Morales em comício em no Chapare, seu reduto político.
Quiroga tem sido o mais fervoroso opositor de Evo Morales, desde que o líder indígena era deputado até se tornar presidente (2006-2019).
Durante seu período na presidência, Quiroga conseguiu a expulsão de Evo Morales da Câmara de Deputados, episódio que impulsionou o crescimento político do líder e do MAS.
O candidato critica frequentemente o ex-mandatário em suas redes sociais e já chegou a afirmar que Morales é "depravado, fraudulento e covarde". Afirma ainda que prenderá Morales, em cumprimento a uma ordem de prisão por um suposto caso de tráfico de pessoas, segundo a AFP.
Sua oposição se estende à política internacional. Quiroga exibe como "medalhas de condecoração" a proibição de entrar em Cuba, em 2018, e na Venezuela, em 2024, ambos países cujos dirigentes são aliados de Morales.
Com AFP.