Talibã: a organização do grupo consiste em um líder, três delegados logo abaixo na hierarquia, um conselho de 26 membros e comissões que atuam em diversas áreas, como militar e econômica (HOSHANG HASHIMI/AFP/Getty Images)
André Martins
Publicado em 17 de agosto de 2021 às 18h17.
Última atualização em 17 de agosto de 2021 às 18h24.
O Talibã, que tomou o poder no Afeganistão no último final de semana, tem um líder e uma estrutura organizada. O grupo extremista que controlou o Afeganistão entre 1996 e 2001, quando seguiu uma versão radical do islamismo nos costumes, vetando o consumo de álcool e a livre circulação de mulheres, manteve uma estrutura mesmo após a queda do seu governo.
Com os principais integrantes sempre em movimento, sem uma localização fixa, o grupo se refugiou em uma região que faz fronteira com o Paquistão após o fim do primeiro governo do Talibã no Afeganistão em 2001.
A organização do grupo consiste em um líder, três delegados logo abaixo na hierarquia, um conselho de 26 membros e comissões que atuam em diversas áreas, como militar e econômica. O Talibã tem um escritório em Doha desde 2013, onde realizou negociações de paz com os Estados Unidos.
Na língua pashtun, Talibã significa estudante. Em 1994, ex-guerrilheros pashtuns — o maior grupo étnico do Afeganistão —, que participaram da expulsão de forças soviéticas com o apoio dos EUA e do Paquistão, formaram um grupo que prometia restaurar a paz e segurança no país, baseado na instauração Lei Islâmica.
Quando tomaram o poder na década de 1990, fizeram com que o Afeganistão se transformasse em uma espécie de emirado islâmico, onde as regras seriam baseadas na leitura que o Talibã fazia do Alcorão, o livro sagrado dos muçulmanos. De acordo com esta leitura, as mulheres seriam impedidas de sair de casa sem a companhia de um homem, o uso da burca seria obrigatório além de serem proibidas de estudar e trabalhar.
Mullah Mohammed Omar foi fundador e o primeiro líder do grupo extremista. Ele esteve envolvido na guerra com os soviéticos. Durante o governo do Talibã no Afeganistão, Omar era considerado o chefe de estado. Mullah permaneceu como líder do grupo mesmo após a queda de seu governo. Em 2013, ele morreu por problemas de saúde. O grupo escondeu sua morte por dois anos.
O líder do Talibã desde 2016 é o Mawlawi Hibatullah Akhundzada. Ele é considerado a principal autoridade política, religiosa e militar do grupo. Ele participou da resistência islâmica a invasão soviética e viveu quase toda a sua vida no Afeganistão. Sua reputação é de ser mais um líder religioso do que militar. Akhundzada assumiu após o ex-líder geral morrer em um ataque de drone dos Estados Unidos.
Acredita-se que Akhundzada é uma figura importante nos tribunais do Talibã, com decisões que apoiam punições islâmicas, como execuções de assassinos, adúlteros e amputação de pessoas condenadas por roubo.
Um dos delegados do grupo é Mullah Abdul Ghani Baradar. Considerado o chefe político e o rosto do Talibã — por fazer aparições publicas —, ele foi um dos fundadores do grupo nos anos de 1990. Baradar participou de quase todas as guerras no Afeganistão. Ele era o vice-ministro da defesa quando o governo do Talibã foi derrubada. O atual chefe político já foi preso em 2010 após um ataque conjunto dos EUA e do Paquistão. Ele foi liberado anos depois durante negociações de paz entre os militantes e o governo do Afeganistão.
Outro delegado é considerado o chefe militar do grupo. Mullah Muhammad Yaqoob, é filho de Mullah Mohammed Omar, fundador e principal líder do Talibã. Por ser filho de um dos fundadores, ele rapidamente acendeu para uma posição de comando. Yaqoob lidera 5 mil unidades militares do grupo no Afeganistão que realiza treinamentos e suprimento de armamento e explosivos. Ele é considerado uma peça chave na retomada do poder no Afeganistão.
Outra figura importante para os combates é o líder da Rede Haqqani, Sirajuddin Haqqani. Ele comanda o grupo guerrilheiro que luta contra o exército americano, afegão e forças da Otan. A rede é conhecida por realizar os ataques mais sangrentos no Afeganistão e foi um dos grupos militantes que atuaram ao longo da fronteira entre o Afeganistão e o Paquistão. O grupo também tem um chefe do judiciário, que atua principalmente em negociações realizadas no escritório em Doha.
O maior conselho do Talibã é chamado de Rahbari Shura. 26 líderes com poderes decisórios atuam sobre diferentes questões que envolvem o interesse do grupo. Além do conselho, comissões para diferentes áreas atuam como ministérios do Talibã.
Nesta terça-feira, 17, o talibã anunciou que quer relações pacíficas com outros países e que respeitará os direitos das mulheres nos moldes da lei islâmica ao realizar sua primeira entrevista coletiva oficial desde a tomada inesperada de Cabul.
Os anúncios do Talibã, escassos de detalhes, esperam convencer as potenciais estrangeiras que o grupo adotará uma postura mais suave do que durante seu governo 20 anos atrás. "Ninguém ferirá vocês, ninguém baterá em suas portas", disse o porta-voz do movimento Zabihullah Mujahid, adicionando que existe uma "diferença enorme" entre o Talibã de agora e o de 20 anos atrás.
Entre 1996 a 2001, quando também governou guiado pela lei islâmica, ou shariah, o Talibã proibiu as mulheres de trabalhar e aplicava punições, incluindo o apedrejamento público. As meninas não podiam frequentar escolas, e as mulheres tinham que usar burcas que as cobriam por inteiro para sair.
As mulheres terão permissão para trabalhar e estudar, e "serão muito ativas na sociedade, mas dentro dos moldes do Islã", acrescentou.
Apesar do pronunciamento moderado, o grupo já tomou medidas extremas, como a ordem para a paralisação da vacinação contra covid-19 no país.