O procurador-gera dos EUA, Merrick Garland, aprovou pessoalmente a batida do FBI na residência do ex-presidente, Donald Trump, na Flórida (Brendan SMIALOWSKI/AFP)
AFP
Publicado em 21 de agosto de 2022 às 12h07.
Os republicanos negaram a Merrick Garland, procurador-geral dos Estados Unidos, um assento vitalício na Suprema Corte de Justiça. Agora, Garland enfrenta uma decisão crucial: o possível julgamento de um ex-presidente do partido.
O procurador de 69 anos aprovou pessoalmente a surpreendente revista do FBI em 8 de agosto na residência de Donald Trump e terá que decidir se serão atribuídos delitos ao ex-presidente.
Julgar um ex-presidente não tem precedentes. Richard Nixon foi perdoado por seu sucessor, Gerald Ford, antes que lhe fossem atribuídas acusações pelo escândalo Watergate.
E enquanto Nixon ficou desgastado e renunciou quando caiu em desgraça, Trump, de 76 anos, mantém um controle ferrenho do Partido Republicano e flerta abertamente com a ideia de voltar a se lançar candidato às eleições presidenciais de 2024.
"A ideia de julgar um ex-presidente por qualquer coisa é bastante extraordinária", disse Steven Schwinn, professor de direito na Universidade de Illinois Chicago. "Mas os atos de Trump foram bastante extraordinários".
A revista em Mar-a-Lago parece se concentrar em torno de uma má gestão de documentos secretos, mas Trump também está sob a lupa por tentar reverter os resultados das eleições de 2020, e pela invasão ao Capitólio em 6 de janeiro de 2021 por seus apoiadores, que terminou com cinco mortos.
Trump não foi indiciado até agora por nenhum destes casos, mas o comitê parlamentar que investiga o ataque ao Capitólio deixou um caminho aberto para Garland durante uma série de audiências públicas, nas quais apresentou suas conclusões.
A resposta à pergunta de se o procurador seguirá por este caminho está na boca de todos em Washington.
A operação na residência de Trump na Flórida deu início a uma tempestade política que poderia se transformar em um furacão se o procurador-geral decidir indiciá-lo em um país amargamente dividido entre democratas e republicanos.
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Garland tem experiência política suficiente para antecipar as consequências de processar Trump, disse Schwinn, e tem "considerações complicadas a pôr na balança".
"De um lado, Garland tem que pensar qual é seu trabalho e este consiste em aplicar a lei", disse.
Mas, "por outro lado, é sem dúvida consciente de que qualquer ação judicial contra o presidente Trump encorajará sua base de seguidores e já provocou ameaças de violência contra funcionários federais e outros".
Trump e seus aliados republicanos têm acusado Garland, nomeado para o cargo pelo presidente democrata Joe Biden, de utilizar o Departamento de Justiça para fins políticos.
"Nada parecido teria acontecido com um presidente dos Estados Unidos", disse Trump após a batida em Mar-a-Lago, que considera uma "caça às bruxas" de democratas vingativos.
A operação do FBI levou a aliada de Trump, Marjorie Taylor Greene, a propor uma resolução na Casa dos Representantes para inabilitar Garland por uma "tentativa descarada de perseguir um adversário político".
A resolução não tem nenhuma possibilidade de ser aprovada na Câmara, controlada pelos democratas.
À esquerda do partido, alguns democratas têm acusado Garland de se demorar demais para agir contra o ex-presidente que, consideram, deveria estar atrás das grades por incentivar uma insurreição.
Graduado na escola de direito de Harvard, Garland não é alheio a casos de grande repercussão.
Como procurador federal, chefiou a investigação sobre um atentado a bomba cometido e 1995 por extremistas de ultradireita em Oklahoma City, que deixou 168 mortos. Também levou à justiça Ted Kaczynski, o "Unabomber".
Garland foi, em seguida, o principal juiz do Tribunal de Acusações do Distrito de Columbia e em 2016 foi nomeado para a Suprema Corte pelo então presidente Barack Obama.
Mas a maioria republicana no Senado rejeitou sua nomeação e foi o presidente seguinte - Trump - quem acabou nomeando o juiz que ocupou o posto vacante.
Respeitoso do protocolo, Garland tem tentado seguir a política do Departamento de Justiça de não comentar as investigações em curso.
Mas foi forçado a abandonar sua reticência usual diante do furor provocado pela operação do FBI e falou rapidamente com os jornalistas na semana passada, devido ao "interesse substancial público neste assunto".
Ele disse que a decisão de revistar a residência de Trump não foi tomada "superficialmente" e destacou que "o Estado de Direito significa aplicar a lei de maneira uniforme, sem medo, nem favoritismo".