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Putin e sua arriscada aposta na Ucrânia

Aposta não só ameaça começar um conflito armado com o país vizinho, mas também retroceder o mundo aos piores tempos da Guerra Fria

Homens armados montam guarda na cidade portuária de Feodosiya, na região da Crimeia, na Ucrânia (Thomas Peter/Reuters)

Homens armados montam guarda na cidade portuária de Feodosiya, na região da Crimeia, na Ucrânia (Thomas Peter/Reuters)

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Da Redação

Publicado em 2 de março de 2014 às 10h52.

Moscou - Ao reservar-se o direito de intervir militarmente na Ucrânia, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, fez uma aposta extremamente arriscada, que não só ameaça começar um conflito armado com o país vizinho, mas também retroceder o mundo aos piores tempos da Guerra Fria.

O argumento empregado pelo chefe do Kremlin para obter o voto unânime do Senado russo que autoriza o emprego das Forças Armadas em território ucraniano foi a necessidade de defender os interesses e a segurança dos russos que se encontram na Ucrânia.

Há quase seis anos, em agosto de 2008, a Rússia travou na Geórgia sua primeira guerra contra outra antiga república soviética, que denominou como "operação para impor a paz", e que terminou com uma rápida vitória russa e o reconhecimento por Moscou das independências das regiões separatistas da Abecásia e da Ossétia do Sul.

Nessa ocasião, a Rússia também argumentou a defesa dos russos para lançar um ataque com blindados e aviação na Ossétia do Sul, que terminou com as tropas russas nas portas de Tbilisi.

Na ocasião, Moscou contava um motivo de muito peso: o então presidente da Geórgia, Mikhail Saakashvili, tinha lançado uma operação militar na Ossétia do Sul para "restabelecer a ordem constitucional".

Com muito mais cautela, as novas autoridades da Ucrânia não empreenderam ações de força na república autônoma da Crimeia, onde tem sua base a Frota Russa do Mar Negro, cujos soldados tomaram o controle de várias instalações estratégicas da península.

Estas ações contam com o apoio de muitos russos étnicos da Crimeia (60% de sua população), que não reconhecem o novo governo de Kiev, já que temem a "ucranização" desse território, que consideram, e não sem razão, historicamente russo.

A Crimeia foi entregue à Ucrânia em 1954 pelo então líder soviético de nacionalidade ucraniana, Nikita Khrushchov, como uma demonstração da unidade dos povos russo e ucraniano.

Esse "presente" não fez mais que envenenar as relações entre Moscou e Kiev, em particular após o desaparecimento da União Soviética em 1991.


No meio da crise da Ucrânia, a Rússia anunciou sua disposição de facilitar a concessão de cidadania aos ucranianos que assim desejam, medida que aplicou em relação à população da Abecásia e da Ossétia do Sul às vésperas da guerra com a Geórgia.

O novo governo ucraniano, cuja legitimidade Moscou não reconhece, apelou à comunidade internacional, em particular aos Estados Unidos e ao Reino Unido, para que garanta a segurança da Ucrânia conforme o estipulado no Memorando de Budapeste.

Nesse documento, EUA e Reino Unido, assim como a própria Rússia, se comprometeram em dezembro de 1994 a garantir a segurança, a soberania e a integridade territorial da Ucrânia e a não usar a força contra ela, como contrapartida à decisão de Kiev de desfazer-se de suas armas nucleares herdadas da URSS.

O presidente dos EUA, Barack Obama, advertiu ontem à noite a Putin, em uma conversa telefônica de uma hora e meia, que uma violação contínua da soberania e integridade territorial da Ucrânia "teria um impacto negativo na posição da Rússia dentro da comunidade internacional".

Segundo a Casa Branca, Obama pediu para a Rússia "aliviar as tensões retirando suas forças das bases (russas) na Crimeia e abstendo-se de qualquer interferência em outras partes da Ucrânia".

Washington insistiu que a entrada de tropas russas em território ucraniano "viola a lei internacional" e é "inconsistente" com o Memorando de Budapeste.

Há poucos dias, antes da entrada em ação das tropas russas na Crimeia, o diretor da rádio "Eco" de Moscou, Aleksandr Venediktov, advertia que Putin se encontrava em uma encruzilhada histórica: ajudar o separatismo pró-russo na Crimeia ou deixar passar a oportunidade e conservar seu papel no G8.

No primeiro dos casos - alertou -, a Rússia assumiria riscos inimagináveis, como os da URSS quando invadiu o Afeganistão, embargos e isolamento internacional, e no segundo, Putin seria condenado por seu compatriotas por não ter recuperado a Crimeia em uma situação tão favorável.

Atualmente, e considerando os últimos acontecimentos, o Kremlin parece inclinar-se claramente pela primeira opção.

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