ONU manifestou preocupação com as "acusações de fraude" (/Kena Betancur/ Reuters)
Da Redação
Publicado em 8 de dezembro de 2010 às 22h13.
Porto Príncipe - Milhares de manifestantes causaram distúrbios nesta quarta-feira na capital do Haiti, em protesto contra o resultado do primeiro turno da eleição presidencial. Testemunhas disseram que a sede da coalizão governista, acusada pelos manifestantes de fraudar a votação, foi incendiada.
Ao menos duas pessoas morreram na onda de violência, que parece ter anulado a esperança internacional de que as eleições, que tiveram apoio da Organização das Nações Unidas (ONU), poderiam criar uma nova liderança estável para o Haiti, país que tenta se recuperar de um forte terremoto em janeiro.
O caos se instalou em Porto Príncipe quando seguidores do candidato derrotado Michel Martelly, um músico popular no país, montaram barricadas com paus, pedras e pneus em chamas por toda a cidade.
A polícia usou gás lacrimogêneo para impedir que a multidão se aproximasse da sede do Conselho Eleitoral Provisório no bairro de Petionville, segundo testemunhas.
Os resultados preliminares do turbulento primeiro turno, realizado em 28 de novembro, indicaram a realização de um segundo turno, em janeiro, entre a ex-primeira-dama Mirlande Manigat e o governista Jude Celestin.
Martelly, que já havia acusado o presidente René Préval e seu candidato de tentarem manipular os resultados, ficou em terceiro lugar.
Observadores eleitorais e a mídia regional vinham informando que o segundo turno deveria ser disputado por Manigat e Martelly, sem a presença de Celestin. A embaixada dos EUA em Porto Príncipe disse que o resultado oficial é "inconsistente" com a contagem de votos acompanhada por "numerosos observadores internos e internacionais".
Em nota divulgada na quarta-feira, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, manifestou preocupação com as "acusações de fraude", e lembrou que ainda cabem revisões. Pela lei haitiana, os candidatos têm 72 horas para impugnar os resultados após sua proclamação.
Por causa dos distúrbios, escolas e empresas ficaram fechadas nesta quarta, e muitos moradores preferiam não sair de casa. O tráfego nas ruas praticamente se limitava aos veículos da força de paz ONU e da polícia.
A comunidade internacional esperava que a votação haitiana resultasse na eleição de um governo sólido, capaz de estabilizar o Haiti -- país mais pobre das Américas, com amplo histórico de turbulências políticas, que se recupera de um devastador terremoto em janeiro e sofre atualmente uma epidemia de cólera.
Confiança do Brasil
O Brasil disse acompanhar com atenção o desenrolar do processo eleitoral e que embora reconheça que as eleições tenham sido realizadas sob condições adversas, confia que "o povo haitiano saberá levar esse processo a bom termo".
"O governo brasileiro manifesta sua expectativa de que o processo eleitoral haitiano siga seu curso no estrito marco da lei, que prevê soluções institucionais para corrigir eventuais falhas no escrutínio", informou o Itamaraty em comunicado.
Uma rádio local disse que protestos foram registrados também na cidade de Les Cayes (sul), onde seguidores de Martelly queimaram prédios públicos.
Na capital, em meio às barricadas, os inflamados partidários de Martelly rasgavam e apedrejavam cartazes eleitorais de Celestin e de Manigat.
"Não é o dinheiro que dá o poder, são as pessoas que deveriam dar o poder", disse o manifestante Lafranche Schneider. Vários participantes da manifestação gritavam pedindo o enforcamento de Préval.
O Conselho Eleitoral Provisório disse que Manigat obteve 31,37 por cento dos votos, contra 22,48 por cento para Celestin, e 21,84 por cento para Martelly.
Mas esse resultado leva em conta uma amostra de apenas pouco mais de 1 milhão de votos apurados, de um eleitorado total de 4,7 milhões de haitianos.