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Protestos, divisão e… Melania

Sérgio Teixeira Jr., de Cleveland O tema oficial do primeiro dia da convenção do Partido Republicano era segurança, mas o discurso mais aguardado não tinha a ver com a atual onda de violência racial nos Estados Unidos ou o terrorismo islâmico. Melania Trump, mulher de Donald Trump e eventual futura primeira-dama dos Estados Unidos, se […]

TRUMP E MELANIA: discurso feito sob medida para tentar reduzir a rejeição com as mulheres  / Mark Kauzlarich/ Reuters

TRUMP E MELANIA: discurso feito sob medida para tentar reduzir a rejeição com as mulheres / Mark Kauzlarich/ Reuters

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Da Redação

Publicado em 19 de julho de 2016 às 07h00.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 17h53.

Sérgio Teixeira Jr., de Cleveland

O tema oficial do primeiro dia da convenção do Partido Republicano era segurança, mas o discurso mais aguardado não tinha a ver com a atual onda de violência racial nos Estados Unidos ou o terrorismo islâmico. Melania Trump, mulher de Donald Trump e eventual futura primeira-dama dos Estados Unidos, se dirigiu aos participantes da convenção para tentar humanizar o marido. Trump costuma ocupar as manchetes com suas declarações ultrajantes e ofensivas – inclusive contra mulheres –, e a fala de Melania seria uma boa oportunidade para dar uma nova dimensão ao personagem. O resultado foi misto.

Uma das maiores surpresas veio antes de sua fala. Ela foi chamada ao palco pelo próprio Trump, que rompeu com a tradição do candidato vencedor de só aparecer no último dia da convenção. Ao som de “We Are The Champions”, a silhueta de Trump apareceu contra um enorme fundo branco. Mas ele foi sucinto: “Ah, vamos ganhar, vamos ganhar tanto”, disse ele, e passou a palavra para Melania. Quem esperava saber um pouco da vida a dois do casal ficou decepcionado. Com um sotaque carregado e lendo dos teleprompters, a mulher de Donald Trump enfatizou as qualidades gerenciais do marido. “Ele não desiste nunca”, “ele faz acontecer”, disse ela repetidas vezes, entre outras frases feitas.

A performance foi considerada boa pelos analistas da TV americana, levando em conta que nas poucas vezes em que se postou diante do microfone Melania nunca tinha falado mais que 90 segundos. O discurso, que vinha sendo preparado havia cinco semanas com a ajuda de profissionais, também parece ter feito pouco para aplacar a rejeição de Trump entre o eleitorado feminino, especialmente depois dos comentários ofensivos que ele lançou nos últimos meses contra jornalistas e adversárias. Mas é claro que os estrategistas vão se debruçar sobre as pesquisas de opinião feitas depois do pronunciamento.

Melania Trump, 46, também falou um pouco sobre sua vida. Nascida Melanija Knavs em Sevnica, atual Eslovênia e na época a comunista Iugoslávia, ela disse que se naturalizou americana há dez anos, o que provocou aplausos da plateia. Depois de uma carreira de sucesso como modelo na Europa, Melania mudou-se para os Estados Unidos, onde conheceu Trump, 24 anos mais velho, numa festa da Semana de Moda de Nova York de 1988. Os dois estão casados desde 2005 e têm juntos um filho, Barron, de 10 anos. Melania já disse no passado que preferia manter distância da campanha para cuidar do filho. A oportunidade de mostrar o Donald Trump pai em rede nacional para todo o país passou em branco — pelo menos na segunda-feira. Três de seus outros filhos (de outros dois casamentos) devem subir ao palco nos próximos dias.

Mais para o final de sua fala, a mulher de Donald Trump fez um apelo pela união do partido: “A temporada das primárias e da dureza ficou para trás”. A julgar pelo clima na Quicken Loans Arena, não vai ser tão simples. O dia começou com uma troca de acusações entre o chefe da campanha de Trump, Paul Manafort, e John Kasich, um dos derrotados nas primárias. Kasich, integrante da ala tradicional do Partido Republicano, disse que não colocaria os pés na convenção do seu partido, que acontece no Estado (Ohio) do qual é o governador. “Ele está envergonhando seu partido”, disse Manafort sobre Kasich, chamando o governador de “petulante” por se recusar a apoiar a candidatura Trump.

Tumulto

Horas mais tarde, depois da abertura formal da convenção, um grupo de opositores de Trump tentou forçar uma votação em plenário das regras que regem o evento. Ostensivamente, eles queriam rever as disposições de olho no futuro, para impedir que eleitores não-registrados no partido possam participar das primárias em alguns Estados. Segundo os analistas, a tentativa de alterar as regras das convenções futuras seria uma indicação de que, na opinião de parte dos republicanos, a eleição de 2016 já está perdida. Mas a manobra também serviu para causar confusão logo no início da convenção que deveria servir primariamente para coroar a vitória de Trump e unir o partido para a disputa contra Hillary Clinton. Mesmo que os descontentes tivessem poucas chances de sucesso, um mero atraso na programação teria consequências importantes em um evento cronometrado cuidadosamente para obter a maior cobertura televisiva possível.

Uma movimentação rápida da cúpula do partido abafou o princípio de rebelião, e teve início a programação do horário nobre. Os oradores incluíram atores de segunda linha e estrelas de reality shows, parentes e sobreviventes do atentado contra a representação diplomática americana em Benghazi, na Líbia, e alguns republicanos de menor destaque, além do ex-prefeito de Nova York Rudolph Giuliani. O fio que unia a fala de todos era a segurança – ou a falta dela, a julgar pelo quadro sombrio pintado nos discursos.

“Nosso país está num mau momento agora. Tudo o que nos é caro está sendo atacado todos os dias. Precisamos parar”, disse o ator Scott Baio, que foi convidado por Trump para falar apenas na quinta-feira da semana passada.

Pat Smith, mãe de um consulto de TI morto em Benghazi, fez o discurso mais carregado da noite, política e emocionalmente. Numa indicação de que o atentado será uma das armas de Trump contra Hillary, secretária de Estado na época do ataque que deixou quatro americanos mortos. “Culpo Hillary Clinton pessoalmente pela morte do meu filho”, disse Smith. “Hillary é mãe e avó de dois netos. Eu sou mãe e avó de dois netos. Como ela pode fazer isso comigo? Trump é tudo o que Hillary não é.”

A onda de violência racial também foi abordada nos discursos. David Clarke Jr., xerife da cidade de Milwaukee, no Meio Oeste americano, abriu sua fala dizendo que “Blue Lives Matter”, uma referência ao movimento Black Lives Matter. Azul é a cor dos uniformes dos policiais nos Estados Unidos, e Clarke estava criticando os organizadores das manifestações espalhadas pelo país que protestam contra a morte de jovens negros desarmados pelas mãos da polícia. “Muitas das ações do movimento Black Lives Matter são anarquia”, afirmou Clarke. “Nenhum grupo pode reivindicar o privilégio de estar acima da lei.” O recrudescimento da guerra de palavras e slogans entre as vítimas da violência policial e as autoridades foi apenas uma amostra de um dos temas inevitáveis da campanha eleitoral. De um lado, Trump levantando a bandeira da lei e da ordem; de outro, Hillary Clinton exigindo cobrança de responsabilidade quando há excessos por parte da polícia.

Para terça estão previstos os discursos do governador de Wisconsin, Scott Walker, outro derrotado nas primárias, do presidente do UFC, Dana White, e de Tiffany e Donald Jr., filhos de Trump. Mas o show de Trump, e a crescente cisma do Partido Republicano, ainda prometem muitas emoções até a quinta-feira.

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