Buenos Aires, Argentina. 26 de outubro de 2019. Foto: Erica Canepa/Bloomberg (Erica Canepa/Bloomberg)
Fabiane Stefano
Publicado em 10 de dezembro de 2020 às 11h48.
A proibição de demitir trabalhadores na Argentina durante a pandemia parece causar mais problemas do que resolvê-los no mercado de trabalho do país, que já era considerado um dos piores do mundo. A inflação na terceira maior economia da América Latina está em torno de 40%, o banco central tem poucos dólares e falar sobre desvalorização da moeda é quase constante. O governo tenta reestruturar os US$ 44 bilhões que deve ao Fundo Monetário Internacional após o colapso de um programa de empréstimos no ano passado.
A maioria das economias emergentes enfrenta dificuldade para conseguir recursos de alívio na pandemia, incluindo medidas para proteger empregos implementadas por países mais ricos. É especialmente difícil para o presidente da Argentina, Alberto Fernández, que completa um ano de mandato nesta quinta-feira.
O governo tem executado programas de estímulo muito parecidos aos implantados em outros países, como subsídios para que empresas mantenham os funcionários. Mas o governo teve que imprimir dinheiro para financiá-los - cerca de 1,76 trilhão de pesos (US$ 21,5 bilhões) até agora - e isso aumenta a preocupação de inflação ainda mais alta no próximo ano.
A Argentina proíbe empresas de demitirem trabalhadores desde março, medida que nenhum outro país de peso manteve por tanto tempo, e recentemente estendeu a proibição até 2021. Também exige que as empresas paguem o dobro do valor normal da indenização se um trabalhador for demitido “sem justa causa”, de acordo com decreto governamental.
Alguns economistas dizem que essas políticas acabam por afetar os empregos que tentam proteger, e que o governo pode enfrentar pressão para revertê-las durante as negociações com o FMI. Sem poder demitir trabalhadores, as empresas recorreram a suspensões, que subiram em até 10 vezes em relação aos níveis pré-pandemia durante a proibição de demissões, efetivamente adiando futuros cortes de empregos.
O desemprego na Argentina, como na maioria dos países, aumentou neste ano. Mas a taxa oficial de 13% não inclui 2,5 milhões de trabalhadores - 20% da força de trabalho registrada - que deixaram completamente o mercado de trabalho formal.
Se essas pessoas fossem incluídas, a taxa de desemprego ficaria acima de 28%, segundo novo relatório da Universidade Católica Argentina. Há também um grande setor informal, como em muitos países latino-americanos, e esse tipo de emprego também entra em colapso, com queda de 35% no segundo trimestre deste ano, mostram dados do governo.
O ministro do Trabalho, Claudio Moroni, reconhece que a atual crise de desemprego do país pode ser a pior de todas, mas diz que a proibição de demissões não deve ser responsabilizada. “Atribuir os problemas da economia argentina ao design do mercado de trabalho é excessivo e bizarro”, disse Moroni em entrevista. “Minimizamos os efeitos da pandemia.”
Provavelmente não há mudança de política que possa fazer muito por Sergio Bono. Com 56 anos, ele era piloto da Latam Airlines até a operadora deixar a Argentina neste ano, citando o ambiente adverso aos negócios no país e sindicatos poderosos.
“Eu fazia o que amava, estava em uma boa empresa, fazia o máximo que um piloto podia fazer”, diz Bono, que voou pela última vez em um Airbus 320 em março. “Tinha um ótimo salário para a Argentina. Tudo isso desapareceu em três meses.”