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Procuradora sacode as bases do chavismo e desafia Maduro

Ortega já afirmou que a Constituinte de Maduro agravará a crise no país e agora, em entrevista ao Wall Street Journal, condenou "a repressão" aos protestos

Luisa Ortega: "Mais da metade dos feridos foram alvo da ação das forças de segurança" (Marco Bello/Reuters)

Luisa Ortega: "Mais da metade dos feridos foram alvo da ação das forças de segurança" (Marco Bello/Reuters)

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AFP

Publicado em 25 de maio de 2017 às 22h38.

Não é a líder da oposição, e também não é uma autoridade qualquer: é Luisa Ortega, a poderosa procuradora-geral e chavista confessa que desafia o governo de Nicolás Maduro na Venezuela.

Com voz firme, a advogada de 59 anos acusou esta semana a Guarda Nacional de ser a responsável por cerca de 500 feridos (mais da metade do total) e pela morte de um jovem durante os protestos contra Maduro, que já deixaram 57 falecidos nos últimos 54 dias.

"Mais da metade dos feridos foram alvo da ação das forças de segurança", declarou Ortega.

A procuradora-geral apontou ainda um oficial da Guarda Nacional pela morte de um estudante de 20 anos durante um protesto em Caracas.

"Foi atingido por um objeto como este", disse Ortega ao mostrar uma bomba de gás lacrimogêneo, em claro desafio ao governo, que havia atribuído a morte a uma ação de outros manifestantes.

Ortega se tornou a heroína da oposição e no Twitter, Freddy Guevara, vice-presidente do Parlamento, qualificou sua declaração de "histórica".

"Traidora"

Mas a reação do governo não tardou. Um dos mais poderosos dirigentes do chavismo, Diosdado Cabello, chamou a procuradora-geral de "traidora", durante seu programa de TV, e o deputado governista Pedro Carreño declarou que "da pena" ver Luisa Ortega.

Em algumas semanas, Ortega deu vários golpes no governo, como qualificar de "ruptura da ordem constitucional" a decisão, no final de março, do Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) de assumir as atribuições do Parlamento, único poder controlado pela oposição.

Após forte pressão internacional, o TSJ recuou de sua decisão, mas a medida foi o estopim para a atual onda de protestos.

A distância entre Ortega e o chavismo se ampliou ainda mais quando a procuradora rejeitou o apelo de Maduro por uma Assembleia Constituinte, considerada pela oposição como uma manobra para perpetuar o atual governo.

Em carta vazada à imprensa, Ortega afirmou que a Constituinte "em lugar de propiciar um clima de paz" - como afirma Maduro - agravará a crise.

Ortega foi ainda mais longe ao condenar em entrevista ao Wall Street Journal "a repressão" aos protestos. Também censurou o julgamento de civis por cortes marciais.

Chavista confessa

Maduro não pode destituir Ortega, no cargo desde 2007. A Assembleia Nacional - então controlada pelo chavismo - a reelegeu em 2014 para um mandato que será concluído em 2021.

"Peço desculpas à revolução por ter designado Luisa Ortega Díaz como procuradora-geral (...). Fui um dos que defendeu isto e convenci os companheiros", disse nesta quinta-feira Diosdado Cabello, que presidia o Parlamento quando ocorreu a nomeação.

Ortega esteve ligada a Hugo Chávez desde sua campanha presidencial de 1998, quando trabalhava em um escritório de advocacia do estado de Aragua (norte).

Em 2002, quando Chávez enfrentou um golpe de Estado, entrou para o Ministério Público para apoiar o presidente.

Ortega é casada com o deputado chavista Germán Ferrer, que integrou as Juventudes do Partido Comunista e participou da guerrilha urbana contra Rómulo Betancourt, primeiro presidente da etapa democrática no período 1959-64.

Após ser acusada pela oposição, durante anos, de defender o chavismo, Ortega terminou sua lua de mel com Maduro no final de 2016, ao se manter como uma chavista "digna e democrática diante das pretensões totalitárias" do atual governo, segundo o cientista político Nicmer Evans.

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