Mundo

Por que um jogo do Arsenal foi cortado da TV chinesa neste domingo

O meio-campista Mesut Özil, de ascendência turca, fez uma publicação em seu Twitter criticando atitudes de Pequim. As TVs locais retaliaram contra o Arsenal

Ozil em jogo pelo Arsenal neste domingo 15: críticas ao governo chinês (John Sibley/Reuters)

Ozil em jogo pelo Arsenal neste domingo 15: críticas ao governo chinês (John Sibley/Reuters)

CR

Carolina Riveira

Publicado em 15 de dezembro de 2019 às 18h05.

Última atualização em 30 de julho de 2020 às 14h21.

São Paulo - A China vive neste fim de semana mais um episódio de guerra com ligas esportivas do Ocidente.

O canal de televisão chinês CCTV, que é estatal, cancelou abruptamente no início da tarde deste domingo 15 uma transmissão de uma partida do Campeonato Inglês entre Arsenal e Manchester City. O motivo: o jogador alemão Mesut Özil.

Özil, que tem ascendência turca, postou uma mensagem em seu perfil no Twitter na sexta-feira 13 criticando ações violentas do governo da China contra a minoria muçulmana dos uigur em território chinês.

O caso parece ter irritado o governo chinês em Pequim. O jogo do Arsenal contra o City deveria ser transmitido por volta da meia-noite na China (meio-dia no horário de Brasília), mas a CCTV colocou no lugar uma gravação de uma partida anterior do Tottenham com os Wolverhampton Wanderers.

Ao mesmo tempo, a partida do Arsenal também foi cortada em dois serviços de streaming na China, o PPTV Sports e o Migu Sports.

Os uigur habitam a região de Xinjiang, no noroeste da China, mas historicamente não se veem ligados à cultura chinesa. A região chegou a declarar independência na década de 1920, mas passou a ser controlada pela China em 1949. O território é hoje autônomo (tal qual outras regiões chinesas, como o Tibete), mas sofre forte migração de chineses. Os uigur afirmam sofrer discriminação dos chineses que migraram para a região, e organizações internacionais estimam que há milhares de uigurs em campos de concentração chineses.

"[exemplares do] Alcorão estão sendo queimados... Mesquitas estão sendo fechadas... Escolas muçulmanas sendo banidas... Professores religiosos sendo mortos um a um... Irmão sendo mandados à força para campos.", escreveu Özil em seu Twitter, em turco.

Também neste domingo 15, o jornal The Global Times, apoiador do governo chinês e do Partido Comunista que controla o país, confirmou o cancelamento da transmissão da partida do Arsenal em seu perfil no Twitter e disse que os "comentários falsos" de Özil sobre Xinjiang "desapontaram os fãs chineses e as autoridades do futebol".

O Arsenal se pronunciou sobre o caso e afirmou em comunicado em suas redes sociais que as mensagens de Özil representam a "visão pessoal" do jogador. "O Arsenal é sempre uma organização apolítica", escreveu o clube. O comunicado foi também divulgado no Weibo, rede social chinesa. Os comentários de Ozil foram criticados entre os seguidores chineses na rede social.

A China representa um gigantesco mercado para o Arsenal. O perfil do clube inglês no Weibo, inclusive, tem mais de 5 milhões de seguidores. O Arsenal planeja abrir até mesmo uma cadeia de restaurantes temáticos do clube no país. Os chineses também estão entre as maiores audiências do Campeonato Inglês (a chamada Premier League). O atual contrato da liga para transmissões na China, de três anos, custou 700 milhões de dólares.

Özil, que atua pelo Arsenal e pela seleção alemã, é um dos jogadores mais populares do mundo, com mais de 20 milhões de seguidores no Twitter e no Instagram.

Briga com a NBA

Ainda neste ano, o governo chinês e esportistas do Ocidente já haviam entrado em conflito, desta vez na NBA, liga de basquete americana.

Um dirigente do time Houston Rockets, o americano Daryl Morey, manifestou em seu Twitter apoio a protestos contro o governo em Hong Kong -- com uma imagem dizendo "Lute por liberdade. Esteja ao lado de Hong Kong". A ilha é um território chinês, e, embora conte com mais autonomia do que as demais regiões, os cidadãos do país estão há mais de nove meses em protestos contínuos pedindo eleições livres e contra o governo local, que é escolhido por Pequim.

A postagem de Morey foi rapidamente apagada, e o dirigente se desculpou pelo comentário. "Eu não queria ofender nenhum torcedor dos Rockets ou amigos meus na China com meu tweet. Estava apenas expondo um pensamento, baseado em uma interpretação, de um evento complicado", escreveu.

Mas o estrago ficou. Os jogos do Houston Rockets estão banidos de transmissões na China até agora. Segundo reportagem do jornal The Wall Street Journal, as lojas oficiais da NBA no país também não estão vendendo mercadorias de jogadores do Rockets -- com exceção da camisa do astro chinês aposentado Yao Ming, um dos maiores atletas da China e que jogou pelo clube americano entre 2002 e 2011. Sites das gigantes de comércio eletrônico Alibaba e JD.com também não vendem mais produtos do Rockets.

Embora só o Rockets tenha sofrido maiores consequências, relatos dão conta de que as empresas de mídia chinesa estão mostrando menos jogos da NBA como um todo. Em comunicado, um porta-voz da NBA afirmou que "continuamos a acreditar no poder único de nosso jogo para fazer pontes entre as culturas e unir as pessoas". Esporte e política, mais uma vez, mostram que estão interligados.

Acompanhe tudo sobre:ChinaFutebolFutebol inglêsTelevisão

Mais de Mundo

Ministro alemão adverte para riscos de não selar acordo entre UE e Mercosul

Israel ataca centro de Beirute em meio a expectativas de cessar-fogo no Líbano

Rússia expulsa diplomata britânico por atividades de espionagem

Presidente do México alerta Trump que imposição de tarifas não impedirá migração e drogas nos EUA