Energia: subsídios são um dos motivadores para apoio da população alemã (Sehenswerk/Thinkstock)
Anderson Figo
Publicado em 12 de janeiro de 2017 às 06h00.
Última atualização em 12 de janeiro de 2017 às 09h06.
Berlim - A transformação energética sem precedentes pela qual a Alemanha está passando, conhecida como “Energiewende”, tem um personagem principal: a própria população do país. É dela que vem a maior pressão para que o governo consiga atingir seu arrojado objetivo de reduzir em até 95% o nível de emissão de CO2 na atmosfera até 2050.
Parte desse engajamento se deve aos subsídios oferecidos pelo governo: através da Lei das Energias Renováveis, conhecida como EEG (Erneuerbare-Energien-Gesetz, em alemão), foi criada um esquema de remuneração para quem instalar painéis solares fotovoltaicos ou pequenas plantas de CHP (Combined Heat and Power) —cogeração que consiste em combinar a geração de energia elétrica com o aproveitamento da energia térmica— com potencial de até 100 kWp e puder vender a carga excedente para a rede.
Ou seja, se a pessoa instalar um sistema em casa, poderá não somente produzir sua própria energia como também vender o excedente, alimentando o sistema com a carga extra. O resultado: no fim do ano passado, havia 1,5 milhão de plantas de painéis fotovoltaicos instaladas na Alemanha —cerca de 65% desse total estava nas mãos da população.
Para especialistas ouvidos por EXAME.com, outro fator que influencia fortemente no engajamento da população alemã é o medo de um desastre como o ocorrido em Fukushima, no Japão, em 2011.
A usina nuclear japonesa foi atingida por um tsunami após um terremoto de magnitude 9,0, o que provocou o derretimento de três reatores, liberando uma quantidade significativa de material radioativo na atmosfera. Foi o maior desastre nuclear global desde Chernobyl, em 1986.
“Muitos alemães reconhecem os altos riscos de um acidente nuclear [acontecer na Alemanha] e de ocorrer mudanças drásticas no clima global, e gostariam de contribuir para reduzi-los”, disse o professor Wolfgang Irrek, responsável pelo campo de estudos de Gerenciamento de Energia e Serviços Elétricos da Universidade Ruhr West de Ciências Aplicadas, na Alemanha.
Segundo o professor Uwe Leprich, chefe do Departamento de Proteção do Clima e Energia na Agência Alemã do Meio Ambiente, há um “comprometimento genuíno [da população] ao meio ambiente e à proteção climática. É um reconhecimento de que a Energiewende é uma das chaves para combater o aquecimento global e a redução das emissões de CO2.”
A percepção de que, aos poucos, a Alemanha vai reduzindo sua dependência da importação de energia, especialmente de países com instabilidade política, é outra motivação para a população alemã participar da “Energiewende”, na opinião de Leprich. “Sem contar que a transformação energética da Alemanha também gera empregos e estimula a exportação de inovações alemãs”, completou o professor.
Em 2013, 848 mil pessoas trabalhavam no setor de eficiência energética da Alemanha, contra 807 mil em 2012 e 737 mil em 2011, segundo dados da DENEFF (Deutsche Unternehmensinitiative Energieeffizienz). De acordo com a Clean Energy Wire, em 2014, 355,4 mil pessoas trabalhavam na área de energias renováveis no país.
“O apoio à Energiewende por uma parcela considerável da população não teria sido possível se líderes políticos de grandes partidos alemães não tivessem defendido a causa da transição energética”, disse Irrek, da Universidade Ruhr West.
Ele também é crítico ao aumento no custo da energia para os pequenos consumidores, e à isenção de sobretaxa para grandes empresas. Isso porque, para compensar os subsídios dados pelo governo, a EEG também estabelece uma tarifa obrigatória que é cobrada de todos os consumidores de eletricidade da Alemanha.
O dinheiro é usado para o desenvolvimento das plantas geradoras de energias renováveis. Porém, as chamadas EII (Energy Intensive Industry), indústrias que fazem uso intensivo de energia, como grandes manufaturas ou empresas de mineração e siderurgia, são isentas da tarifa.
“Órgãos de defesa do consumidor gostariam que a indústria fosse responsável pela maior parte dos custos [da transição energética no país] e apoiasse as famílias de mais baixa renda”, completou o professor.