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Por que a mudança climática é combustível para terrorismo global

Desastres naturais e escassez de recursos fortalecerão os esforços de recrutamento de grupos armados radicais, alerta estudo alemão

 (zabelin/Thinkstock)

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Vanessa Barbosa

Vanessa Barbosa

Publicado em 24 de abril de 2017 às 15h10.

Última atualização em 26 de abril de 2017 às 18h21.

São Paulo - À extensa lista de ameaças trazidas pelas mudanças climáticas, como secas históricas, fome, desertificação, enchentes diluvianas e furacões devastadores, adicione mais uma: o risco de fortalecimento do terrorismo global.

Na medida em que eventos climáticos extremos afetam a segurança alimentar e a disponibilidade de água e de terra, criando todo tipo de revolta social e econômica, as pessoas se tornam mais vulneráveis não só aos impactos negativos do clima mas também ao recrutamento por grupos terroristas que oferecem meios de subsistência e incentivos econômicos alternativos.

O alerta vem de um novo relatório elaborado pelo grupo de pesquisa Adelphi a pedido do governo alemão, e mostra como os impactos das mudanças climáticas contribuem com o surgimento e crescimento de grupos terroristas, como o Boko Haram e o Estado Islâmico.

Segundo o estudo "Insurreição, Terrorismo e Crime Organizado em um Mundo em Aquecimento", os impactos crescentes das mudanças climáticas multiplicam riscos e pressões já existentes, como a escassez de recursos, o crescimento populacional e a urbanização.

A junção desses fatores leva à fragilidade e conflitos violentos sobre os quais esses grupos podem prosperar. "Quanto mais escassos os recursos se tornam, maior poder é dado àqueles que os controlam, especialmente em regiões onde as pessoas dependem particularmente dos recursos naturais para sua subsistência", diz Lukas Rüttinger, autor do relatório, em  comunicado à imprensa.

Ao redor do Lago Chade, por exemplo, um gigantesco lago africano que já perdeu mais de 90% de sua área, a escassez de recursos aumenta a concorrência local por terra e água. Essa competição, por sua vez, alimenta tensões sociais e até conflitos violentos. Ao mesmo tempo, a escassez de recursos afeta a sobrevivência de muitas pessoas, agrava a pobreza e o desemprego e leva ao deslocamento populacional. É neste ambiente frágil que grupos radicais como o Boko Haram ganham poder.

O Estado Islâmico, por sua vez, controlou barragens para dificultar o acesso à água em áreas com escassez do recurso ocupadas por seus inimigos, além de ter redirecionado fluxos hídricos para expandir seu controle territorial. "As áreas já vulneráveis podem cair em um ciclo vicioso, que torna mais fácil a operação do terrorismo, o que, por sua vez, leva ao surgimento desses grupos, com consequências para todos", destaca Rüttinger.

De acordo com o estudo, as mudanças climáticas desafiarão cada vez mais a capacidade dos Estados de proporcionar estabilidade. A relação entre fragilidade nacional e catástrofes se reforça mutuamente, especialmente quando os desastres climáticos sobrecarregam os governos e minam sua legitimidade, levando grupos armados não estatais a tirarem vantagem dos pontos fracos e lacunas deixados pelo Estado, para ganhar apoio da população local.

Ao mesmo tempo, diz a pesquisa, as catástrofes e crises também podem ser usadas para aumentar a resiliência, a legitimidade e até mesmo construir a paz.

Nesse contexto, a rejeição do presidente americano, Donald Trump, à ciência climática acaba por se tornar mais um meio de fortalecer os esforços de recrutamento de grupos terroristas. Em vários momentos passados, o Departamento de Defesa classificou a mudança climática como um “multiplicador de ameaças” e risco para "segurança nacional dos Estados Unidos.”

Não à toa o relatório alemão sugere que as ação de combate às mudanças climáticas e as estratégias de luta contra o terrorismo devem ser conduzidas "de forma holística e não isoladamente", como acontece frequentemente, gerando risco de agravar cada um dos fatores.

 

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