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Perto das eleições, fábricas na Argentina podem parar por falta de soja, diz analista

Paulina Lescano, engenheira agrônoma especialista em mercado argentino, estima que a indústria moageira pode parar em novembro, após quebra de safra derrubar estoque

Plantação de soja em Tangará da Serra. (Paulo Whitaker/Reuters)

Plantação de soja em Tangará da Serra. (Paulo Whitaker/Reuters)

Publicado em 22 de outubro de 2023 às 06h00.

Última atualização em 22 de outubro de 2023 às 10h25.

O setor agrícola na Argentina vive um ano difícil. Uma forte seca reduziu a produção de itens de exportação, como soja e trigo, o que ajuda a piorar a crise econômica do país, que enfrenta inflação anual perto de 140% ao ano e desvalorização do peso. Neste cenário, falta soja até para consumo interno, e o país precisou importar o produto do Brasil.

“A safra 2022/23 foi catastrófica. Em nível climático, nunca se registrou um evento assim. Se perdeu tanto no milho, no trigo e na soja, uns 50% da colheita. Neste contexto, tendo em conta que os moinhos de soja têm capacidade instalada de 65 mil toneladas, tiveram de importar a parte faltante de soja, para que a capacidade ociosa não seja ainda maior”, afirma Paulina Lescano, engenheira agrônoma especialista em mercado.

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No mercado internacional de soja, a Argentina é o terceiro nas exportações do grão e o primeiro nas exportações de óleo, representando mais de 30% do valor das vendas externas totais do país – por isso, uma quebra de safra é tão impactante quanto no Brasil. 

Nos seis primeiros meses do ano, a exportação de soja para o país vizinho somou US$ 9,6 bilhões, cujo aumento em relação ao semestre de 2022 foi 19,4%. No mesmo intervalo, a exportação global para a Argentina caiu 8,5% e agora a indústria moageira sente dificuldade em processar o produto derivado. “Se espera que, em novembro, muitas fábricas deixem de operar ante a falta de soja”, diz a analista.

Os preços de colheita da soja cultivada em Rosário, Santa Fé, estão acima da média dos últimos cinco anos, mas o preço caiu 20% nos últimos dois meses devido à fraca demanda e à expectativa de produção recorde no Brasil. 

Depois da decepção na temporada passada, o Brasil superou os argentinos e ocupou o posto de maior exportador mundial de farelo de soja. Segundo a Bolsa do Comércio de Rosário (BCR), as vendas externas devem ser de 21,1 milhões de toneladas no país, enquanto o Brasil deve exportar 21,5 milhões.

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Cenário político

Atualmente, os agricultores argentinos aguardam um anúncio do governo para restabelecer uma taxa de câmbio preferencial dólar-peso argentino (“soja-dólar”) para as exportações de soja na época da colheita. Esta medida poderia ser implementada para incentivar as vendas de produtos de soja assim que estiverem disponíveis.

Lescano aponta que o governo atual, do presidente Alberto Fernández, tem dado pouco auxílio. "O setor agro não tem recebido apoio. Pelo contrário: é o país com menos apoio e mais encargos. Em vez de receber subsídios, como em outros países, são cobrados direitos de exportação e vários outros impostos. Esses direitos de exportação fazem que haja um desconto de 33% ou 12%, comparado com países vizinhos.”

Fernández apoia como candidato o ministro da Economia, Sergio Massa, que não tem agradado aos produtores. “O agro se divide entre os dois candidatos de oposição, ainda que, do ponto de vista das propostas, a candidata do Juntos por el Cambio [Patricia Bullrich] é a que tem se aproximado dos que trabalham no agro”, avalia. 

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Além dos impostos, os exportadores enfrentam dificuldade para repatriar os dólares que ganham com as vendas de produtos no exterior. A taxa oficial de câmbio do governo rende bem menos pesos do que a paralela, e para reduzir esta brecha, foi criado o dólar soja, uma cotação especial pelo governo, que pode ser usada apenas por exportadores agrícolas.

“O dólar soja foi mudando suas fórmulas de cálculo, que reduzia a brecha entre o câmbio oficial e o paralelo. No começo, era fixo e reduzia essa diferença de 120% para 70%, por exemplo. Depois, se tornou um câmbio flutuante e é composto por 75% do valor oficial e 25% de outros tipos de câmbio CCL (com liquidação posterior) que se aproximam mais do câmbio paralelo. Dessa maneira, se consegue reduzir a brecha de 160% para 90/100%”, explica Lescano. 

As regras cambiais também dificultam a obtenção de dólares para comprar insumos importados. “Não há subsídios para importação de produtos básicos nem de necessidade urgente. Ao contrário: nos últimos anos, se somaram novos impostos às importações da maioria dos bens, incluindo insumos para o agro, o que torna a importação mais cara”, diz.

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