Agnes Chow, a "Mulan de Hong Kong", Ivan Lam e Joshua Wong: condenados por fazerem assembleia (Tyrone Siu/Reuters)
Carolina Riveira
Publicado em 2 de dezembro de 2020 às 09h03.
Última atualização em 2 de dezembro de 2020 às 09h12.
A Justiça de Hong Kong condenou na madrugada desta quarta-feira três ativistas à prisão por "reunião ilegal", devido à organização de uma assembleia em meio aos protestos massivos na ilha no ano passado.
Não é a primeira vez que nomes como Joshua Wong e Agnes Chow enfrentam a prisão em Hong Kong. Mas é a primeira em que os ativistas de fato sofrem condenações, um reflexo do aumento das restrições do governo da ilha sob comando chinês.
Joshua Wong, que se tornou uma das maiores vozes de oposição em Hong Kong, foi condenado a 13 meses de prisão pela participação ilegal na assembleia. Agnes Chow, de 23 anos, foi condenada a dez meses de prisão e Ivan Lam, 26 anos, a sete meses. Os três foram presos imediatamente.
Os protestos em Hong Kong foram desencadeados por uma nova lei de segurança nacional que permitiria que pessoas presas na ilha fossem enviadas para julgamento na China continental, além de, no limite, poder ser usada contra manifestantes e opositores por crimes como "subversão" ou apoio a forças estrangeiras. Após meses de manifestações desde 2019 — que enfraqueceram com o distanciamento obrigado pela pandemia –, a China terminou passando a lei de segurança no último mês de junho.
Os ativistas já haviam sido presos recentemente no passado. Wong, de 24 anos, foi preso em setembro por ter usado máscara para esconder o rosto nos protestos. Chow também já havia sido presa em agosto deste ano. “Eu fui presa quatro vezes, mas, sendo sincera, essa foi a vez em que eu fiquei mais assustada. E foi a mais difícil”, disse na ocasião.
Chow, que faz 24 anos amanhã, tem sido chamada de "a verdadeira Mulan" por seu ativismo político em Hong Kong -- na comparação com a atriz que protagonizou o filme da Disney e que criticou os protestos da ilha, o que levou a um pedido de boicote ao filme. Chow ganhou notoriedade mundial e, por falar japonês, é reconhecida sobretudo no Japão.
Quando ainda eram adolescentes na escola, os ativistas presos hoje já haviam participado em 2014 do “movimento dos guarda-chuvas”, protestos de 79 dias que pediam voto direto para escolher o líder em Hong Kong, atualmente escolhido por Pequim. Muitos consideram aquele o começo do movimento de protesto em Hong Kong, e do endurecimento das regras por Pequim. A atual líder da ilha é Carrie Lam, historicamente aliada da China e que vem ajudando o governo chinês a reprimir protestos na ilha.
O ministro das relações exteriores do Reino Unido, Dominic Raab, se pronunciou sobre a condenação desta terça-feira. "Eu insisto que as autoridades de Hong Kong e Pequim terminem essa campanha de sufocar a oposição", disse. Hong Kong era colônia do Reino Unido até 1997 e parte dos cidadãos da ilha ainda têm cidadania britânica -- a própria Agnes Chow, nascida em 1996, renunciou à cidadania britânica para concorrer em eleições em Hong Kong.
Desde que deixou de ser colônia britânica, Hong Kong tem mais autonomia do que o restante do território governado pelo Partido Comunista Chinês, em um modelo que ficou conhecido como “um país, dois sistemas”. Mas o regime vem sendo endurecido, sobretudo no mandato do atual presidente chinês, Xi Jinping.
A ilha se consolidou nas últimas décadas como uma cidade vibrante, com grande fluxo financeiro e presença internacional. A relativa liberdade democrática fez a cidade se tornar um dos polos financeiros globais faz parte do próprio sucesso da economia da China, a segunda maior do mundo. Para muitos analistas, esses episódios marcam o fim do modelo de “um país, dois sistemas”.
Desde a lei de segurança nacional neste ano, o governo proibiu opositores de se candidatarem em eleições legislativas e passou a processar seguidamente manifestantes dos protestos do ano passado.
Outro caso que ficou conhecido foi o de um grupo de 12 ativistas, "os 12 de Hong Kong", detidos acusados de tentar viajar ilegalmente para Taiwan (outro território chinês) de barco em agosto. Eles estão em um centro de detenção na própria China desde então, e suas famílias acusam o governo de não os dar acesso a advogados, visitas e tratamento médico.