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Paulo Guedes diz que Mercosul não será uma prioridade. Isso é ruim?

Falas do futuro chefe da área econômica de Bolsonaro sobre o bloco sul-americano fizeram soar o alarme na América do Sul. Entenda

Paulo Guedes (foto de arquivo): segundo consultor econômico de Bolsonaro, o Brasil “ficou prisioneiro de alianças ideológicas” e que isso é ruim para a economia (Sergio Moraes/Reuters)

Paulo Guedes (foto de arquivo): segundo consultor econômico de Bolsonaro, o Brasil “ficou prisioneiro de alianças ideológicas” e que isso é ruim para a economia (Sergio Moraes/Reuters)

Gabriela Ruic

Gabriela Ruic

Publicado em 30 de outubro de 2018 às 17h19.

Última atualização em 28 de junho de 2019 às 16h21.

São Paulo – Enquanto o mundo repercutia a notícia da vitória de Jair Bolsonaro (PSL), eleito presidente do Brasil no último domingo, 28 de outubro, outro personagem importante da corrida presidencial, o economista Paulo Guedes, ganhava os holofotes da imprensa, especialmente na América do Sul.

“O Mercosul não será uma prioridade no próximo governo”, disse ele ao ser questionado por uma jornalista da Argentina durante encontro com a imprensa logo após a consolidação da eleição. “É isso que você queria ouvir. Você está vendo que aqui tem um estilo que combina com o presidente, que fala a verdade. Não estamos preocupados em agradar”, disse ele à correspondente e em tom exasperado.

As declarações repercutiram como um alarme entre veículos de imprensa dos países-membros do bloco, que é composto pelo Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, e foram encaradas como um possível sinal enfraquecimento do Mercosul. Na Argentina, o jornal La Nacion destacou em sua manchete as falas, enquanto o jornal uruguaio El Pais disse que a posição “pode trazer efeitos dramáticos para a relação do Brasil com a região”.

Segundo Guedes, o Brasil “ficou prisioneiro de alianças ideológicas” e que isso é ruim para a economia. Ainda de acordo com o economista “não vamos quebrar nenhum relacionamento. Se eu só vou comercializar com Venezuela, Bolívia e Argentina? Não. Nós vamos comercializar com o mundo, serão mais países. Vamos fazer comércio. ”

Especialistas consultados por EXAME, contudo, minimizaram os desconfortos gerados pelas falas do economista e futuro chefe da área econômica da gestão Bolsonaro. “Se o Mercosul operar como é hoje, não precisa mesmo ser uma prioridade”, disse o embaixador José Alfredo Graça Lima, conselheiro do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI). Na visão do diplomata, o bloco precisa ser reformado, sob pena de se tornar “irrelevante”.

“As declarações são infelizes, pois geram dúvidas e provocam desconfianças”, acrescentou Graça Lima. “Não acredito que o Mercosul irá acabar, mas pode deixar de ser prioridade. Do ponto de vista político, contudo, o bloco é um patrimônio importante que deve ser preservado e fortalecido”, concluiu.

Para Cristiane Mancini, professora de política econômica das Faculdades Rio Branco, as declarações de Guedes não surpreendem, uma vez que ela considera natural a revisão de blocos comerciais, especialmente em momentos de crise. Sobre a possibilidade de o Brasil prospectar outros parceiros além do Mercosul, vê isso como positivo. “Nossos principais parceiros não estão só na América do Sul e estabelecer negócios com eles é vantajoso”, lembrou a professora.

Ainda de acordo com ela, da perspectiva da Argentina, que vive uma grave crise econômica, a brecha aberta pode ser benéfica. “Os argentinos já mencionaram que é hora de reavaliar a dependência do Brasil. Quando se está em crise, isso é prejudicial”, disse. Na economia mundial, diz a especialista, é saudável um ambiente no qual os países consigam ter relações comerciais diversificadas.

Apesar do tom abrandado dos especialistas entrevistados por EXAME, o ex-ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, criticou o movimento sinalizado por Guedes. “O que Brasil quer fazer é um ‘Brexit’, só que aí é o maior (país) que está saindo”, disse o ex-chanceler, comparando a proposta com o ‘Brexit’, a saída do Reino Unido da União Europeia. “Vai esfarelar o Mercosul, será um grande desserviço à paz na região”, notou.

Repercussão

De acordo com o jornal argentino Clarín, as falas de Guedes somadas ao anúncio de que a primeira visita oficial de Jair Bolsonaro como presidente será ao Chile causaram perplexidade em Buenos Aires. Publicamente, no entanto, o tom do chanceler argentino Jorge Faurie foi amenizador.

“Neste momento e mesmo antes da eleição no Brasil, ficou claro que temos pela frente uma tarefa de flexibilização sobre como são os processos de negociação com diferentes países do mundo”, notou o ministro. Sobre a visita oficial, Faurie também relativizou, dizendo que “não importa para onde ele vai, mas o grau de diálogo e interação que os governos vão ter.”

Já no Uruguai, o presidente Tabaré Vásquez tampouco fez comentários profundos sobre o assunto, embora já tenha se manifestado anteriormente pela flexibilização nas regras para que os países possam negociar de forma mais independente. Notando que é oportuno “esperar e ver que atitude terá o novo governo em relação ao Mercosul”, o político uruguaio disse, ainda, que não arrisca “fazer previsões sobre esse assunto, porque é muito importante para todos os países que integram o Mercosul.”

 

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