Documento faz referência ao trabalho da brasileira Irmã Dulce, canonizada em 2019. (Filippo MONTEFORTE/AFP)
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Publicado em 9 de outubro de 2025 às 13h32.
Última atualização em 9 de outubro de 2025 às 15h22.
O Vaticano divulgou nesta quinta-feira, 9, a exortação apostólica Dilexi te (“Eu te amei”, em latim), primeiro documento de grande relevância assinado pelo papa Leão XIV.
No texto de 121 artigos, o pontífice coloca o compromisso com os pobres no centro da missão católica.
Para além da importância em si do documento, o texto também sinaliza as prioridades que devem guiar os próximos anos do mandato de papa Leão XIV.
Robert Prevost, de 70 anos, foi eleito pelos cardeais há cinco meses, e é o primeiro papa americano da história.
Confira abaixo, os destaques do novo documento assinado pelo sacerdote.
Na exortação, Leão XIV afirma que a atenção aos necessitados não é uma questão opcional para a Igreja. Segundo o papa, os pobres representam "a própria carne de Cristo" e não podem ser reduzidos a uma categoria sociológica ou problema social.
"Eles são uma 'questão familiar'. Pertencem 'aos nossos'", escreve o pontífice no documento que convida os católicos a reconhecer Cristo "no rosto dos necessitados e dos sofredores".
No documento, o papa assume uma postura crítica ao contestar teorias que justificam a desigualdade ou apostam nas "forças invisíveis do mercado" para resolver problemas sociais.
"A dignidade de cada pessoa humana deve ser respeitada já agora, não só amanhã", orienta o pontífice. O texto ainda critica explicitamente o conceito de meritocracia e defende ações concretas de caridade e esmolas.
"Os pobres não existem por acaso ou por um cego e amargo destino. Muito menos a pobreza é uma escolha, para a maioria deles. No entanto, ainda há quem ouse afirmá-lo, demonstrando cegueira e crueldade"
Em outro trecho ele diz: "Não podemos dizer que a maioria dos pobres está nessa situação porque não obteve ‘méritos’, de acordo com a falsa visão da meritocracia, segundo a qual parece que só têm mérito aqueles que tiveram sucesso na vida".
Ao longo das páginas, Leão XIV se aprofunda na desigualdade social e econômica, além de tratar da situação de imigrantes, trabalhadores, movimentos populares, mulheres e idosos.
Há também uma referência ao trabalho da brasileira Irmã Dulce, canonizada em 2019. No texto, Leão XIV destaca como ela "enfrentou a precariedade com criatividade, os obstáculos com ternura, a carência com fé inabalável".
"Começou acolhendo doentes num galinheiro, e dali fundou uma das maiores obras sociais do país", diz um trecho. "Atendia milhares de pessoas por dia, sem jamais perder a doçura. Fez-se pobre com os pobres por amor ao sumamente pobre".
Além da religiosa brasileira, o documento traz referências a São Francisco de Assis, Santo Agostinho e ao cardeal dom Claudio Hummes, arcebispo de São Paulo morto em 2022.
Na exortação, Leão XIV não deixa dúvidas sobre continuar o legado de Francisco, morto em 21 de abril deste ano.
Assim, ele afirma que o texto foi iniciado por seu antecessor e concluído por ele. "Ao receber como herança este projeto, sinto-me feliz ao assumi-lo como meu", declarou.
O título Dilexi te dialoga com a última encíclica de Francisco, Dilexit nos (“Ele nos amou”), publicada em outubro de 2024. Na época, o documento tratou do Sagrado Coração de Jesus e alertou contra a superficialidade e o consumismo excessivo.
Os últimos dias marcaram posicionamentos importantes de Leão XIV. No domingo, 5, o papa pediu acolhimento e solidariedade aos imigrantes durante homilia. Na semana anterior, já havia criticado o tratamento "desumano" a migrantes nos Estados Unidos, em indireta ao presidente Donald Trump.
Na terça, 7, Leão XIV endossou declarações do cardeal Pietro Parolin, secretário de Estado do Vaticano, sobre o conflito entre Hamas e Israel. Parolin havia criticado a comunidade internacional por estar "impotente" diante da "carnificina em curso" na Faixa de Gaza.
Após contestação de Israel, o papa replicou dizendo que Parolin "expressou muito bem a opinião da Santa Sé".