América do Sul: a política da região “é claramente um crédito negativo” que pesará sobre os títulos corporativos e públicos (Edinson Arroyo/Bloomberg)
Bloomberg
Publicado em 25 de maio de 2021 às 13h30.
Última atualização em 25 de maio de 2021 às 13h55.
Por Eduardo Thomson, Ezra Fieser e Maria Elena Vizcaino
Durante anos, foi fácil para investidores dividir a América do Sul em dois campos. Em um deles ficavam os instáveis, países como Argentina, Equador e Venezuela, onde a turbulência frequente fragilizou economias e levou empresas ao colapso. No outro, estava o oásis da estabilidade, principalmente no Chile, Colômbia e Peru, onde o drama era mínimo e gestores de ativos podiam se sentir razoavelmente seguros.
Mas, de repente, esses paraísos andinos parecem um pouco instáveis, e a reação dos mercados não é positiva. Mesmo antes de a nota de crédito da Colômbia ter sido rebaixada para alto risco na semana passada, os títulos em moeda local do país mostravam o pior desempenho entre mercados emergentes, resultado de uma tentativa mal coordenada de aumentar impostos que provocou uma onda de protestos. A moeda do Peru despencou quando um marxista confesso assumiu a liderança nas pesquisas para a corrida presidencial. E a bolsa do Chile mostra o pior desempenho do mundo depois que o establishment político foi derrotado em uma votação para escolher os membros da assembleia para reescrever a Constituição.
A turbulência política pode ser vista como o primeiro disparo em um movimento antissistema na região depois que a pandemia abalou a América Latina e agravou a desigualdade como em nenhum outro lugar. Agora, após uma expansão constante da classe média no início deste século, cidadãos exigem mais ajuda social e reformulação das políticas pró-empresas que priorizam o crescimento econômico acima de tudo.
A mudança na política andina não foi tanto um realinhamento da direita contra a esquerda, mas, sim, uma rejeição de quem estava no poder em meio à crise econômica causada pela pandemia de coronavírus e o que foi percebido como uma resposta lenta. Se investidores costumavam saber o que esperar de autoridades do governo, mesmo que as políticas não fossem ideais, essa previsibilidade agora faz muita falta.
“O traço comum e claro tem sido o descontentamento constante e crescente contra o establishment político”, disse Patrick Esteruelas, chefe de pesquisa da Emso Asset Management, que administra 6 bilhões de dólares em títulos. “Houve uma punição clara contra o governante ou o partido associado à hierarquia política estabelecida em favor de políticos que podem se colocar como agentes de mudança.”
A política da região “é claramente um crédito negativo” que pesará sobre os títulos corporativos e públicos, disseram os analistas do Citigroup, Eric Ollom e Donato Guarino, em 20 de maio. O Deutsche Bank disse que as moedas andinas terão desempenho inferior ao de pares latino-americanos ao longo do próximo mês. O Morgan Stanley alertou que mais rebaixamentos estão a caminho e que as perdas para investidores de títulos podem aumentar depois que a S&P Global Ratings rebaixou a nota de crédito da Colômbia para junk neste mês.
No mercado de câmbio, geralmente considerado o melhor indicador financeiro da saúde e estabilidade de uma economia, o peso argentino despencou 85% e o real perdeu um terço do valor frente ao dólar nos últimos cinco anos. Em contraste, o peso do Chile desvalorizou menos de 5%. Antes da pandemia, o sol do Peru foi negociado em uma faixa de 3,2 e 3,4 por dólar por quatro anos, uma oscilação inferior a 7%. A moeda colombiana, embora mais volátil, na maior parte do período acompanhou o preço do petróleo, principal produto de exportação do país.
No Peru, o apoio ao candidato de esquerda à Presidência, Pedro Castillo, vem principalmente das áreas rurais, historicamente ignoradas pelo governo de Lima. Do outro lado da disputa do segundo turno em junho está Keiko Fujimori, integrante da direita que se apresentou como candidata pró-empresas para aumentar a confiança dos investidores.
Claro que as coisas estão longe de ser perfeitas no México e no Brasil, as maiores economias da América Latina, cujos governos adotaram uma linha populista. Os mercados mexicanos se mostraram amplamente resilientes, enquanto o Brasil foi mais impactado pela pandemia de coronavírus.
Alguns gestores de ativos dizem que as ondas vendedoras em países andinos podem em breve criar uma oportunidade de compra para investidores dispostos a tolerar a volatilidade. Klaus Kaempfe, chefe de alocação de ativos da Credicorp Capital em Santiago, diz que Chile e Peru serão atraentes quando as perspectivas para as eleições ficarem mais claras, embora possa demorar mais para a Colômbia.