Mundo

Os ciganos e o enigma histórico de suas origens

Que os ciganos têm origem na Índia é algo geralmente aceito, mas o status que ocupavam quando emigraram e o motivo de o fazerem é um enigma

Festa cigana: falta de certezas provocou uma proliferação de teorias (Getty Images)

Festa cigana: falta de certezas provocou uma proliferação de teorias (Getty Images)

DR

Da Redação

Publicado em 11 de junho de 2014 às 13h54.

Nova Deli - Que os ciganos têm origem na Índia é algo geralmente aceito, mas o status que ocupavam quando emigraram e o motivo de o fazerem é um enigma que permanece sem resposta em seu país de origem.

A falta de certezas provocou uma proliferação de teorias; a última é de caráter teocrático e vincula o povo cigano com o popular deus hindu Krishna, cuja encarnação humana tem como principal característica o amor à música, à dança e à festa.

Isso é o que coloca o filantropo Umang Utheesing, que pertence a uma das mais antigas famílias de Gujarat e garante ter localizado o berço das "tribos ciganas" nesse estado do oeste indiano, onde a mitologia situa as andanças do homem-deus.

"Eram nômades e criadores de gado, como Krishna, e seguiam a mesma tradição que a divindade, que após pastar o gado se dedicava a cantar, dançar e se divertir", afirmou o especialista, que seguiu o rastro da diáspora cigana pelo mundo.

Utheesing ressaltou que Krishna costuma aparecer na iconografia hindu com aspecto festivo e dois cajados usados para pastoreio e também para praticar Raas, uma dança identificada ainda na Índia com o homem-deus e guarda forte semelhança com o flamenco.

O filantropo, que preside uma fundação de cultura gujarati, opina que a emigração cigana aconteceu em uma época imemorial pelo noroeste do país e com propósito basicamente comercial, para vender produtos locais como pedras preciosas, seda e especiarias.

A tese de Utheesing contradiz a crença comum de que os ciganos são originários do estado vizinho de Rajhastan, cujas danças também se assemelham ao flamenco, e que descendem dos chamados intocáveis, que ocupam a posição mais baixa no sistema de castas.

De acordo com essa crença, a condição de párias foi precisamente o que os teria feito abandonar a Índia.

Autor do livro "Roma, o Povo Cigano", o antropólogo Shyam Singh, concorda com Utheesing na rejeição à ideia de que os ciganos descendem dos intocáveis, e levanta o argumento de que "quando começaram a partir não existia o sistema de castas como o entendemos agora".


O autor sustenta que os ciganos pertenciam, em sua origem, a diferentes classes sociais, vinculadas com a profissão que exerciam, mas ao contrário de Utheesing assegura que emigraram de maneira progressiva, por razões variadas e em diferentes períodos.

Singh lembra que o autor Hamza del Isphahan deixou testemunho escrito da presença já no século X na corte persa de um grupo de 20 mil indianos que se dedicavam às artes cênicas e ao entretenimento, e os considera "ciganos de primeira hora".

Ele defende a versão de que grupos de combatentes hindus ficaram isolados e posteriormente foram conduzidos ao exílio após combater as invasões muçulmanas que se intensificaram na Índia a partir do século XIV.

O antropólogo defende que os ciganos e as tribos Bangaras, do norte e do oeste da Índia estão aparentados por traços como o folclore, a endogamia e o nomadismo, mas reconhece a nebulosa histórica sobre os ciganos em seu país de origem.

Também não está claro porquê a Espanha - onde a primeira referência escrita dos ciganos remonta ao século XV, em um édito do Reino do Aragão - foi o país estrangeiro em que melhor conservaram sua arte, dança e música, que adquiriram ali uma nova dimensão.

A flamencóloga Rosalía Pérez atribui isso à influência de outros povos orientais que se encontraram na península ibérica, judeus e árabes, cuja contribuição à cultura hispânica é mais reconhecida, embora aponte que não necessariamente maior que a dos ciganos.

Professora de espanhol na Universidade de Nova Délhi, Pérez ressalta nesse sentido a notável quantidade de palavras que têm origem na gíria ou língua cigana e se incorporaram ao castelhano.

O especialista acredita que o termo "cigano" vem de "egipciano", por terem chegado à Espanha pelo Egito. Mas admite, no entanto, que assim como sua saída da Índia é um mistério, é também a origem da palavra que define a arte flamenca.

"Os flamencólogos não entram em acordo", explicou Pérez, dizendo que há quem pense que a palavra "flamenco" se deve à arte cigana ter se aproximado da natureza em Flandres porque foi aonde começaram a ser popularizada pelas tropas do Império espanhol.

Mas também há quem acredite que o termo reproduz o nome da ave, pela elegância, segundo Pérez.

Acompanhe tudo sobre:ÁsiaCiganosgestao-de-negociosHistóriaÍndia

Mais de Mundo

Yamandú Orsi, da coalizão de esquerda, vence eleições no Uruguai, segundo projeções

Mercosul precisa de "injeção de dinamismo", diz opositor Orsi após votar no Uruguai

Governista Álvaro Delgado diz querer unidade nacional no Uruguai: "Presidente de todos"

Equipe de Trump já quer começar a trabalhar em 'acordo' sobre a Ucrânia