Papa Francisco quando era cardeal (AFP)
Da Redação
Publicado em 14 de março de 2013 às 00h18.
Buenos Aires - Jorge Mario Bergoglio, eleito nesta quarta-feira primeiro papa latino-americano e jesuíta, manteve, como chefe da Igreja Católica argentina, duros enfrentamentos com os governos dos Kirchner e prestou depoimento como testemunha por denúncias de grupos de direitos humanos sobre seu papel na ditadura.
O primeiro papa argentino foi líder da Companhia de Jesus no país e ocupou a presidência da Conferência Episcopal entre 2001 e 2011, durante dois mandatos consecutivos, até que abandonou o cargo porque os estatutos lhe impediam de continuar.
Como máxima autoridade da Igreja Católica no país e, embora considerado um homem moderado e dialogante, manteve famosos confrontos com o falecido ex-presidente Néstor Kirchner (2003-2007) e com sua esposa e sucessora, Cristina Kirchner, por temas como o casamento gay e o aborto.
Kirchner, falecido em outubro de 2010, chegou a qualificá-lo como o 'verdadeiro representante da oposição', embora suas diferenças não tenham impedido que, após a morte do ex-mandatário, Bergoglio reagisse com rapidez e rezasse uma missa na catedral.
'O povo tem que esquecer todo tipo de posição antagônica diante da morte de um homem ungido pelo povo para conduzi-lo e todo o país deve rezar por ele', disse então.
Durante o mandato de Cristina Kirchner, tentou manter uma relação distante, mas chegou a promover uma 'guerra de Deus' contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Em 2008, Bergoglio pediu a Cristina um 'gesto de grandeza' com as patronais agrárias, denunciou a 'homogeneização' do pensamento e a 'crispação social' durante uma grave crise entre o governo e os produtores rurais.
Em 2010, tentou por todos os meios evitar a aprovação da lei que reconhece o casamento entre pessoas do mesmo sexo, mobilizou os sacerdotes em defesa da 'unidade familiar' e convocou vigílias na frente do Parlamento.
'Não sejamos ingênuos: não se trata de uma simples luta política; é a pretensão destrutiva do plano de Deus', escreveu Bergoglio às vésperas da aprovação do projeto no Congresso.
Embora tenha perdido esta batalha, pouco depois conseguiu frear a divulgação de uma guia médica que repassava os casos de aborto admitidos pela lei argentina: estupro e perigo para a vida ou a saúde da mãe.
O impulso que os Kirchner deram aos julgamentos pelos crimes de lesa-humanidade cometidos durante a ditadura militar (1976-1983) atingiu a Igreja Católica e Bergoglio depôs como testemunha em dois processos ligados ao período.
A organização Avós da Praça de Maio lembrou hoje em comunicado que Bergoglio depôs no caso de Elena de la Cuadra, desaparecida quando estava grávida, e cuja família o procurou em busca de ajuda.
As Avós reproduziram um fragmento da declaração do então cardeal na qual admitia que teve conhecimento da apropriação de crianças durante a ditadura apenas pouco antes dos anos 1990.
Também declarou no processo pelo sequestro de dois jesuítas que, segundo a acusação, foram detidos porque perderam a proteção de sua ordem religiosa, como assinala o livro 'El silencio' do jornalista Horacio Verbitsky, presidente do Centro de Estudos Legais e Sociais (Cels).
Seguidores de Bergoglio asseguram, pelo contrário, que o novo papa mantém uma clara aposta no trabalho pastoral em áreas desfavorecidas e ajudou a muitos durante o regime ditatorial. EFE