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Novo baque no Líbano: ministro renuncia para não ver "barco afundar"

Governo não tem mais dinheiro para importar o óleo diesel que abastace o sistema de geração de energia; país vive crise econômica sem precedentes

As festas na piscina parecem agora um sonho distante para boa parte da população libanesa, que enfrenta uma crise econômica sem precedentes (Joseph Eid/AFP)

As festas na piscina parecem agora um sonho distante para boa parte da população libanesa, que enfrenta uma crise econômica sem precedentes (Joseph Eid/AFP)

CA

Carla Aranha

Publicado em 3 de agosto de 2020 às 15h52.

Última atualização em 4 de agosto de 2020 às 15h06.

Em um gesto que pegou de surpresa a população libanesa, o ministro de relações exteriores do Líbano, Nassif Hitti, renunciou nesta segunda-feira, dia 3. O principal motivo alegado foi a falta de reformas estruturantes para tirar o país da crise – a taxa de desemprego passa de 30% e metade da população vive hoje abaixo da linha de pobreza. “O Líbano corre o sério risco de se tornar um Estado falido”, disse Hitti em um pronunciamento à imprensa.

Na carta que escreveu com as razões para sua demissão, ele afirmou que “o barco pode afundar com todos a bordo”. É a primeira vez que um figura importante do governo faz uma declaração como essa.

O chanceler era um representante fundamental do governo libanês. “O ministro de relações exteriores tem o papel de defender a aliança entre o Hezbollah, grupo paramilitar xiita que passou a ter um braço político de grande influência, no governo libanês”, diz Elias Gazhal, professor de relações internacionais da Universidade de Lancaster, no Reino Unido.

O ministro chamou atenção, em sua carta, para a importância de uma maior proximidade do Líbano com os países árabes. “O Hezbollah é apoiado pelo Irã, que é visto com ressalvas por vários países árabes, principalmente do Golfo”, afirma Gazhal.

A crise do Líbano vem se acentuando desde o ano passado, quando a dívida pública chegou a 150% do PIB. Com o descontrole orçamentário, as reservas em dólar do país começaram a minguar. A equiparação artificial da lira libanesa com o dólar, mantida desde 1997, implodiu – em poucos meses, a desvalorização da lira chegou a 80%.

O Líbano já foi um oásis para europeus em busca de festas elegantes – e animadas – à beira de piscinas e hotéis glamorosos nas praias do Mediterrâneo. Os príncipes e princesas do Golfo Pérsico compravam imóveis com vista para o mar em Beirute para passar as férias e feriados.

O agravamento da crise econômica e a escalada de poder de grupos radicais, que as monarquias do Golfo veem como antagônicos às suas aspirações na região, afastou as cabeças coroadas. O mercado imobiliário sentiu o baque.

Os apartamentos luxuosos procurados pelos estrangeiros que levavam dólares para o país encalharam. Os libaneses expatriados também começaram a controlar as remessas de dólar para o país, temerosos do aumento da inflação, que começou a corroer o poder de compra, e da derrocada econômica.

Nos últimos meses, os preços triplicaram, principalmente dos alimentos. Hoje, a inflação mensal já passa de 30%. A expectativa é que o PIB do Líbano caia cerca de 12% este ano. Um eventual empréstimo do Fundo Monetário Internacional (FMI) está vinculado à realização de reformas estruturantes, que ainda não aconteceram.

Sem recursos para honrar os contratos com companhias fornecedoras de óleo diesel, que alimenta o sistema de eletríicidade do país, muitas ruas estão às escuras, assim como as residências dos moradores que não podem arcar com o custo de um gerador. As festas glamorosas, as Ferrari e noitadas nas boates, famosas em todo o Oriente Médio e na Europa, parecem cada vez mais algo do passado.

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