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Morte de jovem negro por policiais gera onda de protestos nos EUA

Tyre Nichols, de 29 anos, morreu após ser espancado durante uma abordagem policial em Memphis, Tennessee

Protestos: concentrações foram registradas na noite de sexta, algumas com dezenas, outras com centenas de pessoas, em Memphis, Nova York e Washington. (AFP/AFP)

Protestos: concentrações foram registradas na noite de sexta, algumas com dezenas, outras com centenas de pessoas, em Memphis, Nova York e Washington. (AFP/AFP)

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AFP

Publicado em 28 de janeiro de 2023 às 18h39.

O vídeo em que cinco policiais negros aparecem espancando um jovem afro-americano, que acabou morrendo devido aos ferimentos causados na agressão, provocou horror e incompreensão nos Estados Unidos após sua exibição na noite de sexta-feira (27). 

Desde que Tyre Nichols, de 29 anos, morreu, no começo do mês, sua família não para de fazer apelos à calma. E antes da divulgação do vídeo, exibido ao vivo e sem cortes pelas principais emissoras de televisão, o presidente Joe Biden ligou a mãe e o padrasto do jovem, e pediu à população que se manifeste pacificamente.

Concentrações foram registradas na noite de sexta, algumas com dezenas, outras com centenas de pessoas, em Memphis, Nova York e Washington. Outras estão previstas para este sábado (28).

Robert Jones, de 26 anos, atendente de uma loja em Memphis, assistiu a trechos do vídeo. "Ouvi dizer que é um ano novo, mas as coisas não mudam", disse, referindo-se à violência policial.

"É horrível ver cinco caras grandes batendo neste homem", afirmou Nancy Schulte, de 69 anos, recepcionista de um hotel da cidade.

O vídeo exibido pela polícia mostra um espancamento após uma blitz de rotina em 7 de janeiro, em Memphis, estado do Tennessee.

Reprodução de imagem do vídeo divulgado pela administração da cidade americana de Memphis, Tennessee, em 27 de janeiro de 2023, do espancamento letal praticado por policiais contra Tyre Nichols, homem negro de 29 anos. (Reprodução/AFP)

Os policiais agridem o jovem com socos, chutes e golpes de cassetetes, gás de pimenta e uma pistola Taser. Em nenhum momento Nichols parece tentar agredir os policiais. Ele tenta fugir e é pego.

"Mamãe! Mamãe! Mamãe!", grita Nichols em um dos vídeos.

Aparentemente, o espancamento ocorreu a cerca de 100 metros da casa da mãe da vítima. E a ambulância demorou uns 20 minutos para chegar.

O jovem morreu três dias depois em um hospital de Memphis.

"Cultura" policial

Os cinco policiais foram demitidos, acusados de homicídio, e presos. Quatro deles foram postos em liberdade sob fiança.

Na sexta, embora tenha expressado seu horror, a família se disse "satisfeita" com as acusações apresentadas contra os policiais e elogiou a atuação "rápida" contra eles.

Apesar das palavras da família de Nichols, "se o veredicto for errado, os protestos serão maiores", prevê Demarcus Carter, um afro-americano de 36 anos, morador de Memphis, após assistir ao vídeo.

"Poderia ter sido eu", acrescentou.

As imagens exibidas no vídeo despertam muitas interrogações. No clipe aparece o início da interação entre Nichols e os policiais.

Esta nova morte antes de uma detenção reacendeu as discussões sobre a violência policial nos Estados Unidos, onde está viva a lembrança da morte de George Floyd, assassinado em 2020 por um policial branco, um caso que deu origem a fortes protestos antirracistas.

Ben Crump, um dos advogados da família Nichols, culpou a "cultura policial institucionalizada".

"Não importa se o policial é negro, hispânico ou branco (...) Existem normas não escritas, segundo as quais, se uma pessoa pertence a um grupo étnico determinado, pode ser tratada com excesso de força", declarou neste sábado (28) à rede MSNBC.

"Esta é a cultura que matou Tyre Nichols", acrescentou.

Protestos contra morte de George Floyd continuam em Nova York

Protestos contra morte de George Floyd em 2 de junho de 2020. (Spencer Platt/Getty Images)

Medidas após morte de George Floyd não contiveram violência policial

Após a morte de Nichols, muitos se perguntam qual foi o avanço real alcançado desde 2020, ano em que George Floyd, um homem negro morto em Minneapolis sufocado por um policial branco, que se ajoelhou sobre seu pescoço, deu origem ao movimento "Black Lives Matter" (Vidas Negras Importam), que se espalhou pelos Estados Unidos e por outros países.

Depois da morte de Floyd, promessas de reforma policial se espalharam por todo o país.

No entanto, dois anos depois, a quantidade de pessoas mortas durante investigações policiais alcançou, em 2022, um pico em dez anos: um total de 1.186 mortes, segundo o site Mapping Police Violence.

Vinte e seis por cento delas eram negras, embora os afro-americanos representem 13% da população americana.

Este número é em parte explicado pela enorme quantidade de armas de fogo nas mãos de civis nos Estados Unidos, um país onde há mais armas que pessoas. Isto aumenta consideravelmente a sensação de vulnerabilidade dos policiais durante suas intervenções, levando-os a sacar suas armas mais rapidamente.

No ano passado, 66 policiais morreram baleados enquanto estavam em serviço, segundo um fundo criado para honrá-los.

Mas o advogado Ben Crump, que representou a família de Floyd e agora representa a de Nichols, vê uma dinâmica mais profunda.

"Temos que falar sobre esta cultura policial institucionalizada que tem essa lei não escrita de que se pode fazer uso excessivo da força contra pessoas negras e latinas", disse durante coletiva de imprensa na sexta-feira.

"Teremos que ter esta conversa mais de uma vez até que acabe" o problema, destacou.

Manifestação contra a morte de um jovem negro pelas mãos da polícia em Memphis, em 27 de janeiro de 2023. (AFP)

"Desnecessário e agressivo"

Os protestos iniciados em 2020 levaram, entre outras coisas, a esforços para deter a considerável imunidade legal concedida a policiais nos Estados Unidos e para criar um registro de agentes que fizeram uso excessivo da força.

Um projeto de lei federal, inicialmente apoiado tanto pelos democratas quanto pelos republicanos, fracassou no Congresso em um momento em que os homicídios aumentaram consideravelmente, levando os republicanos a recuarem e retomarem seu tradicional chamado à "lei e à ordem".

Na falta de um avanço em nível federal, houve reformas principalmente em nível local, de forma modesta e desigual, de acordo com os estados, produzindo um mosaico de diferentes abordagens.

Nos Estados Unidos há quase 18.000 entidades policiais autônomas (polícia estadual, municipal, xerifes de condados, patrulhas rodoviárias, entre outras), cada uma com suas próprias regras. Houve revisões para proibir estrangulamentos como o que matou George Floyd, um uso mais frequente de câmeras corporais e o aumento das penas por violência policial injustificada.

A polícia de Memphis esteve entre as que aprovaram reformas. Os policiais foram proibidos de entrar à força em residências sem aviso prévio, foram incentivados a intervir para evitar atos de violência por parte de colegas, enquanto receberam capacitação adicional para reduzir os confrontos perigosos.

Apesar disso, os agentes que detiveram Nichols por uma simples infração estavam "irritados" e "a escalada já estava em um nível muito alto", disse Cerelyn Davis, primeira chefe negra do Departamento de Polícia de Memphis.

Para os ativistas, o problema central está nos amplos poderes de detenção que a polícia americana tem, inclusive para infrações menores.

"Devemos parar de depender da polícia para responder aos problemas relacionados à pobreza", disse Kathy Sinback, diretora para o Tennessee da União Americana pelas Liberdades Civis, pois "leva a ações mais frequentes, desnecessárias e agressivas por parte das forças de ordem com relação aos membros da comunidade".

Uma demonstração disso é que os efetivos policiais mataram quase 600 pessoas durante blitzes desde 2017, segundo a organização Human Rights Watch (HRW).

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