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Militares de Mianmar tomam o poder e prendem líder eleita Aung San Suu Kyi

Mianmar saiu há apenas 10 anos de um regime militar que dirigiu o país por quase meio século

A líder de Mianmar, Aung San Suu Kyia: Mianmar saiu há apenas dez anos de um regime militar que governou o país durante quase meio século (AFP/AFP)

A líder de Mianmar, Aung San Suu Kyia: Mianmar saiu há apenas dez anos de um regime militar que governou o país durante quase meio século (AFP/AFP)

AM

André Martins

Publicado em 1 de fevereiro de 2021 às 06h54.

Última atualização em 1 de fevereiro de 2021 às 11h38.

As Forças Armadas de Mianmar tomaram o poder no país na madrugada desta segunda-feira, 1º de fevereiro, e detiveram a líder de fato do governo, Aung San Suu Kyi, vencedora do prêmio Nobel da Paz em 1991. A informação foi confirmada por seu partido, a Liga Nacional para a Democracia (LND), que classificou a ação como um golpe de Estado.

Após sua detenção, Aung San Suu Kyi pediu em uma mensagem à população que "não aceite o golpe de Estado", em uma carta publicada por seu partido.

Os militares afirmaram que o golpe, sem atos de violência, é "necessário para preservar a estabilidade". O Exército anunciou estado de emergência com duração de um ano e disse que o ex-general Myint Swe será o presidente em exercício no período.

Em comunicado, os militares prometeram organizar eleições "livres e justas", mas só ao final do estado de emergência no país. "Colocaremos em funcionamento uma autêntica democracia pluripartidária", afirmaram em comunicado no Facebook.

Os militares acusam a Comissão Eleitoral de Mianmar de não ter corrigido o que chamam de "enormes irregularidades" nas eleições legislativas de novembro, vencidas por ampla maioria pelo LND de Aung San Suu Kyi. Seu partido estava no poder desde 2015. "Como a situação deve ser resolvida de acordo com a lei, declara-se o estado de emergência", disse o Exército em comunicado.

O golpe de Estado aconteceu pouco antes da primeira sessão do Parlamento formado nas eleições de novembro, que estava programada para esta segunda-feira.

Além da líder do governo, o presidente da República, Win Myint, e outros líderes da LND foram detidos em Naypyidaw, a capital do país, segundo fontes do partido informaram à AFP. O ministro-chefe do estado de Karen e outros ministros regionais também foram detidos.

Os militares bloquearam as estradas ao redor da capital com tropas armadas, caminhões e veículos blindados de transporte, enquanto os helicópteros militares sobrevoavam a cidade. Os militares também atuaram rapidamente para reprimir a dissidência, com restrições às comunicações por Internet e por telefones celulares em todo país.

Em Yangun, a antiga capital e que continua sendo o centro econômico do país, as tropas assumiram o controle da prefeitura pouco antes do anúncio. Os bancos fecharam as portas temporariamente, devido à conexão ruim da Internet, informou a Associação de Bancos.

Vários caminhões com simpatizantes do Exército exibindo bandeiras de Mianmar e cantando hinos nacionalistas foram observados em Yangun. Alguns membros da LND afirmaram que as forças de segurança ordenaram que os cidadãos permanecessem em casa.

"Milhões de casos" de fraude

O golpe de Estado provocou uma avalanche de condenações internacionais. Estados Unidos, Reino Unido e União Europeia criticaram de maneira imediata o golpe, enquanto a China se limitou a pedir às partes envolvidas que "solucionem suas diferenças".

"O governo dos Estados Unidos se opõe a qualquer tentativa de alterar o resultado das recentes eleições (...) vamos adotar ações contra os responsáveis", advertiu a porta-voz da Casa Branca, Jen Psaki, em um comunicado.

O secretário-geral da ONU, António Guterres, "condenou firmemente" a detenção de Aung San Suu Kyi. "Estes atos representam um duro golpe para as reformas democráticas em Mianmar", completou.

Mianmar saiu há apenas dez anos de um regime militar que governou o país durante quase meio século. Os dois últimos golpes de Estado desde a independência do país em 1948 aconteceram em 1962 e 1988.

Os militares denunciavam mais de 10 milhões de casos de fraudes nas eleições legislativas de novembro e exigiam que a Comissão Eleitoral comandada pelo governo publicasse a lista dos eleitores para uma verificação, o que não aconteceu.

Os temores aumentaram quando o comandante do Exército, o general Min Aung Hlaing, o homem mais poderoso de Mianmar, declarou que a Constituição poderia ser "revogada" sob certas circunstâncias.

"Relação complicada"

O partido de Aung San Suu Kyi, prêmio Nobel da Paz de 1991, foi muito criticado por sua gestão da crise dos muçulmanos rohingyas, mas a líder é ainda venerada por boa parte da população, o que levou à vitória em novembro.

Quase 750.000 membros da minoria rohingya fugiram dos abusos do Exército e das milícias budistas em 2017 e se refugiaram em acampamentos em Bangladesh, uma tragédia que levou Mianmar a ser acusada de "genocídio" na Corte Internacional de Justiça (CIJ), o principal órgão judicial da ONU. A gestão da crise fez uma série de organismos internacionais retirarem prêmios concedidos a Suu Kyi.

A votação de novembro foi a segunda eleição geral desde 2011, quando a junta militar foi dissolvida. Em 2015, a LND venceu por ampla maioria, mas se viu obrigada a compartilhar o poder com o Exército, que controla três ministérios cruciais (Interior, Defesa e Fronteiras).

Exilada durante muito tempo no Reino Unido, Aung San Suu Kyi, de 75 anos, retornou a Mianmar em 1988 e se tornou a principal figura da oposição ante a ditadura militar. Ela passou 15 anos em prisão domiciliar antes de ser libertada pelo Exército em 2010.

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