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Milei diz na abertura do Congresso que o Mercosul só serviu para enriquecer industriais brasileiros

Presidente argentino disse que sua motosserra é 'símbolo de uma mudança de época' e comemorou a demissão de 40 mil funcionários públicos

Milei: ataque o Mercosul, defesa de cortes estatais e celebração de demissão de 40 mil funcionários públicos (Luis ROBAYO/AFP Photo)

Milei: ataque o Mercosul, defesa de cortes estatais e celebração de demissão de 40 mil funcionários públicos (Luis ROBAYO/AFP Photo)

Agência o Globo
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Agência de notícias

Publicado em 2 de março de 2025 às 12h33.

Última atualização em 2 de março de 2025 às 12h34.

O presidente da Argentina, Javier Milei, afirmou neste sábado, durante seu discurso na abertura anual do Congresso, que o Mercado Comum do Sul (Mercosul) só serviu para "enriquecer os industriais brasileiros" às custas dos argentinos, reiterando que está disposto a abandonar o bloco, que reúne cinco países latino-americanos.

"O único resultado que o Mercosul conseguiu desde sua criação foi enriquecer os grandes industriais brasileiros, às custas de empobrecer os argentinos", declarou o mandatário ultraliberal em seu discurso no Congresso.

Milei reiterou seu desejo de negociar um acordo comercial com os Estados Unidos e lembrou que, para isso, está "disposto a flexibilizar ou até mesmo, se necessário, sair do Mercosul", união fundada em 1991 por Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, e à qual a Bolívia aderiu em 2023.

O presidente argentino já havia declarado em janeiro, na cidade suíça de Davos, que estava pronto para deixar o Mercosul caso fosse necessário para obter um acordo de livre comércio com os Estados Unidos. "Se essa fosse a condição extrema, sim", afirmou no contexto do Fórum Econômico Mundial.

Os países que compõem o Mercosul, cuja presidência semestral rotativa está atualmente nas mãos da Argentina, devem negociar em conjunto os acordos com outras nações ou blocos.

No dia 6 de dezembro do ano passado, em um acontecimento histórico, o Mercosul e a União Europeia finalmente chegaram a um acordo para liberalizar o comércio entre ambos (excluindo a Bolívia), embora ele ainda precise ser ratificado antes de entrar em vigor, em um processo que pode levar anos.

No entanto, o acordo é rejeitado por vários países europeus, liderados pela França, que exigem que os agricultores sul-americanos respeitem as mesmas normas ambientais e sanitárias da Europa para evitar uma concorrência desleal.

Motosserra

Aos congressistas, Javier Milei também afirmou que a "motosserra" com a qual faz referência ao seu plano de desmonte estatal "é um símbolo de uma mudança de época" que "continuará por anos".

"A motosserra, hoje, é um símbolo de uma mudança de época, o início de uma nova era dourada para a humanidade, mas desta vez, no lugar de ir na contramão do mundo, a Argentina está na vanguarda", declarou.

Ele considerou que "os olhos do mundo hoje estão voltados para a Argentina" e que "em alguns casos, inclusive, tomam nota" do que sua gestão tem feito "para aplicar em seus próprios países, como está fazendo Elon Musk à frente da pasta de desregulamentação dos Estados Unidos".

Em um discurso repleto de dados econômicos e ataques à oposição, afirmou ainda que "a motosserra não é apenas um programa de governo, é uma política de Estado que seguirá por anos e não parará até que encontre o fim do Estado no longo prazo".

Milei anunciou que a Argentina está perto de chegar a um novo acordo que incluiria um desembolso do Fundo Monetário Internacional (FMI), o que permitiria "eliminar ainda este ano" os controles cambiais.

Durante a primeira metade de seu discurso de 45 minutos, Milei revisou a herança recebida e classificou seu programa econômico como "o mais bem-sucedido até agora": "Reduzimos a inflação a uma velocidade sem precedentes", disse.

Ele celebrou a demissão de 40 mil funcionários públicos, a eliminação do Instituto de Cinema, do Ministério da Mulher, do Instituto contra a Discriminação e da agência de notícias estatal Télam, que chamou de "caixas de militância".

Disse, ainda, que suprimiu as obras públicas porque eram "uma das falcatruas da política" e convidou a "erradicar a mentira de que a obra pública gera empregos", afirmando que, na verdade, "gera impostos".

Também prometeu impulsionar uma modificação no sistema trabalhista, uma "reforma tributária estrutural" e uma "profunda reforma migratória".

O anúncio sobre a reforma trabalhista ocorre no mesmo dia em que o sindicato dos trabalhadores do setor público denunciou uma nova onda de quase 3 mil demissões e após a perda de 200 mil postos de trabalho em 2024.

 'Criptogate'

O chamado "criptogate", que abalou o cenário político argentino, começou em 14 de fevereiro, quando o presidente promoveu, segundo ele "de boa-fé", uma criptomoeda que colapsou em apenas duas horas, gerando perdas multimilionárias. O caso está sendo investigado pela Justiça argentina e norte-americana.

Nesta semana, em meio ao escândalo, Milei nomeou dois juízes da Suprema Corte por decreto, medida repudiada por quase toda a oposição. Na sexta-feira, voltou seus ataques contra o governador opositor da província de Buenos Aires, Axel Kicillof, sugerindo que ele renunciasse devido à crise de segurança em seu distrito.

Nesse sentido, Milei reiterou, neste sábado, sua proposta de reduzir a idade de imputabilidade e aumentar as penas.

Para a consultora política Shila Vilker, a estratégia do governo nos próximos meses será "endurecer seu discurso, adotando um tom ainda mais agressivo como mecanismo de defesa diante de um programa baseado unicamente na estabilidade econômica, algo que, segundo muitos economistas, mais cedo ou mais tarde será impactado pela necessidade de desvalorização da moeda".

"A grande questão é se as reservas e os créditos vindos do exterior conseguirão manter o preço do dólar e, assim, controlar a macroeconomia. Se isso acontecer, o sucesso nas eleições legislativas deste ano estará garantido", disse Vilker à AFP, referindo-se às eleições de meio de mandato em outubro.

Um dos poucos deputados opositores presentes, Facundo Manes (UCR, centro), que havia confrontado Milei durante o discurso sobre o "criptogate" e a nomeação de juízes, denunciou posteriormente ter recebido ameaças de Santiago Caputo, um dos assessores mais próximos do presidente.

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