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Mbaku, da Brookings: Ruanda cresce, mas a que preço?

Os ruandeses são governados há 23 anos pelo mesmo presidente, Paul Kagame, que deve ser reeleito pela terceira vez nesta sexta-feira

Mbaku, da Africa Growth Initiative: Kagame ainda é muito popular em Ruanda (foto/Divulgação)

Mbaku, da Africa Growth Initiative: Kagame ainda é muito popular em Ruanda (foto/Divulgação)

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Carolina Riveira

Publicado em 4 de agosto de 2017 às 16h26.

Última atualização em 9 de agosto de 2017 às 16h26.

Ruanda vem tentando reescrever sua história – marcada pelo genocídio em que a etnia hutu matou mais de meio milhão de rivais tutsi em 1994 –, e já é uma das economias que mais cresce na África. Mas, ao mesmo tempo em que se consolida como uma ilha de estabilidade e prosperidade em meio a uma vizinhança conturbada, o país enfrenta um paradoxo democrático. Os ruandeses são governados há 23 anos pelo mesmo presidente, Paul Kagame, que deve ser reeleito pela terceira vez nesta sexta-feira.

Um dos 15 chefes de Estado africanos há mais tempo no poder, Kagame foi o responsável por liderar o grupo que acabou com um genocídio, e venceu todas as eleições desde então. Sob seu comando, o país vem substituindo doações humanitárias por investimentos estrangeiros, e quer deixar de lado a economia agrícola para tornar-se um modelo tecnológico para o resto da África.

Localizada no leste do Continente, ao lado de países como o Sudão do Sul – imerso em uma guerra civil desde 2013 –, Ruanda tem 12 milhões de habitantes e um PIB de 8,3 bilhões de dólares, que cresce a uma média de 8% ao ano. A taxa de extrema pobreza ainda está acima dos 40%, mas caiu 10 pontos percentuais na última década.

Assim, não é apenas o autoritarismo que explica as sucessivas reeleições de Kagame: o pesquisador camaronês John Mbaku, da Africa Growth Initiative, grupo de estudos da Brookings Institution, aponta que, diante da estabilidade e do crescimento trazidos por Kagame, a oposição não consegue empolgar a população e deve continuar como coadjuvante nos próximos anos. “Quando existe uma situação em que a pobreza é extrema, as preocupações são outras”, diz. Em entrevista a EXAME, Mbaku explicou a situação política em Ruanda e o porquê de Kagame se manter tanto tempo no poder.

O presidente Paul Kagame já está há 23 anos no poder em Ruanda, mas continua se reelegendo. Por que ele tem tanto apoio popular?

Entender a popularidade de Kagame passa por entender como ele chegou ao poder. Ele tornou-se líder depois do genocídio de 1994, quando os hutus mataram mais de 500.000 tutsis. Kagame liderou a Frente Patriótica Ruandesa (RPF), e foi sob sua liderança que eles pararam o genocídio, enquanto os Estados Unidos, a ONU e a comunidade internacional não estavam fazendo muita coisa. Então, Kagame fez o que a comunidade internacional não conseguiu. E foi aí que ele ganhou popularidade na Ruanda. Depois, a Frente Patriótica tornou-se um partido, e ele tornou-se presidente. Apesar das críticas internacionais, ele ganha eleições porque, localmente, é muito popular. As pessoas em Ruanda gostam muito dele, porque ele colocou um fim na tragédia.

Ruanda vem tendo um crescimento médio de 8% ao ano, um dos maiores da África. Os índices de qualidade de vida também melhoraram. O que exatamente Kagame vem fazendo para atingir esses resultados?

A economia melhorou significantemente. Há muitos novos hotéis, a infraestrutura melhorou, e Kagame também vem conseguindo atrair muitos investimentos estrangeiros. E um ponto muito importante são os investimentos do governo em educação: Ruanda tem universidades, instituições de educação, cresceu o acesso à educação básica. Kagame trouxe estabilidade política para o país, depois de um período de muita guerra. A comunidade internacional pode até criticar Ruanda, mas ainda é o país mais pacífico do leste da África, especialmente quando olhamos para vizinhos como Uganda e Sudão do Sul tendo muitos problemas. 

Por outro lado, ter um presidente que está no poder há tanto tempo não é saudável para nenhuma democracia — e uma reforma constitucional em 2015 autorizou Kagame a continuar disputando eleições até 2034. Em relatório no mês passado, a Anistia Internacional disse estar preocupada com as eleições no país devido aos “anos de repressão” do governo. Como é a relação de Kagame com a oposição no país?

Ruanda tem se tornado um país mais e mais autoritário. O governo tem sido muito duro; Kagame não deixa que a oposição se desenvolva. O Partido Verde, principal partido de oposição, tem problemas com a perseguição do governo. Mas não é só com perseguição que Kagame barra a oposição: em Ruanda, a mídia é do governo, e a oposição não tem acesso à TV ou à rádio estatal. Para que a oposição crescesse, o país precisaria de uma forte imprensa privada, mas não existe dinheiro para isso.

Nas últimas eleições, em 2010, Kagame foi reeleito com 93% dos votos, e a história deve se repetir nesta sexta-feira. Qual a situação da oposição neste pleito? No futuro, existe uma perspectiva de a oposição ganhar força entre o eleitorado?

Dificilmente. No momento, há dois candidatos contra Kagame, mas as pessoas são muito céticas em relação à oposição; ninguém aparece nos comícios deles. Porque, quando comparam os adversários a Kagame, concluem que eles não têm experiência, enquanto Kagame foi o responsável por trazer a paz. Qualquer coisa que os opositores prometerem, Kagame pode fazer melhor. Porque, primeiro, ele já fez e já é conhecido por isso. E, segundo, porque ele tem a máquina pública à sua disposição.

E como a população vê essas vertentes autoritárias de Kagame?

A oposição faz campanha pregando democracia, direitos fundamentais. E, embora o governo tenha se tornado autoritário, o cidadão “comum” não está muito interessado nisso. Não que essas coisas não sejam importantes – elas são, muito. Mas quando existe uma situação em que a pobreza é extrema, as preocupações são outras. As pessoas ainda se preocupam com acesso à alimentação, não com o direito de falar.

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