O chanceler do Brasil, Mauro Vieira (à esq.), com o secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, em encontro em Washington (Itamaraty/Divulgação)
Repórter de macroeconomia
Publicado em 16 de outubro de 2025 às 16h48.
Última atualização em 16 de outubro de 2025 às 17h36.
O secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, e o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, tiveram a primeira reunião oficial para debater as tarifas americanas na tarde desta quinta-feira, 16, na Casa Branca. A conversa durou cerca de uma hora, e seu conteúdo ainda não foi divulgado.
Vieira já retornou para a Embaixada do Brasil em Washington e deverá falar com os jornalistas, para dar mais detalhes sobre a reunião, às 18h (hora de Brasília).
Segundo informações da embaixada brasileira em Washington, citadas pelo jornal O Globo, seriam realizadas duas reuniões. A primeira seria uma conversa privada entre Vieira e Rubio. A segunda parte, uma reunião ampliada, com participações dos embaixadores Mauricio Carvalho Lyrio, Secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores e Sherpa do Brasil no Brics, de Philip Fox-Drummond Gough, Secretário de Assuntos Econômicos e Financeiros, entre outros nomes.
Os dois chefes da diplomacia buscam solucionar a crise entre os dois países, iniciada após Trump ampliar as taxas de importação sobre o Brasil, que chegaram a 50%, e impor sanções a autoridades brasileiras, como o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Analistas apontam que esta primeira conversa deve servir para que os dois países coloquem na mesa o que estão dispostos a negociar e, então, planejar os passos seguintes, como os próximos encontros.
"Em uma reunião como essa, todo mundo começa discutindo temas operacionais. Falam quando é que vão encontrar de novo e depois começam a falar sobre os eventuais interesses de um lado e de outro. Normalmente todo mundo é muito cuidadoso", diz Walber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior do Brasil.
"Não dá para achar que vai ter alguma decisão", afirma.
Os americanos estão em posição de superioridade, pois impuseram ao Brasil uma tarifa de 50% em agosto, alegando uma série de motivos. Assim, cabe ao governo brasileiro buscar oferecer contrapartidas para a retirada da taxa ou, ao menos, reduzi-las.
Ao impor a taxa, Trump exigiu que o Brasil retirasse os processos na Justiça contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, mas o líder americano não citou mais ele nas últimas semanas.
O clima mudou após um encontro entre Lula e Trump na ONU, em setembro. Desde então, os dois presidentes falaram diversas vezes que houve "química" entre eles, o que teria aberto as conversas entre os dois governos, que ficaram travadas por meses.
Mauro Vieira, ministro das Relações Exteriores do Brasil (Lula Marques/Agência Brasil)
A lista de críticas americanas ao Brasil é longa, mas alguns pontos se destacam, entre eles, abrir o acesso ao etanol americano ao mercado brasileiro, ampliar o acesso dos EUA a minerais críticos e reduzir as regulações sobre empresas americanas de tecnologia.
"Existe uma demanda antiga dos Estados Unidos em relação ao etanol. É um produto importante para eles. Mas há também questões de regulamentações, voltadas ao universo das big techs, como inteligência artificial, data centers, além da questão de terras raras", diz José Pimenta, diretor de Comércio Internacional da consultoria BMJ.
O Brasil cobra uma taxa de 18% sobre o etanol americano. Antes do tarifaço, os americanos taxavam o produto brasileiro em 2,5%.
Nas últimas semanas, ganhou força a questão dos minerais críticos, como lítio, nióbio, cobre e terras raras. São elementos químicos usados na produção de itens de alta tecnologia, como chips e baterias, dos quais a China domina o refinamento.
Assim, o Brasil poderia oferecer algum tipo de parceria com os americanos para a exploração desses minerais. Na quarta-feira, 15, o ministro de Minas e Energia do Brasil, Alexandre Silveira, disse que foi convidado pelo governo americano para discutir o tema.
Christopher Garman, diretor para as Américas da consultoria Eurasia, pondera que o Brasil poderia avançar em algum acordo bilateral com os Estados Unidos no tema, mas que seria difícil fazer concessões de peso.
"O Brasil não vai dar acesso preferencial às empresas americanas, nem mudar as regras de licenciamento. Você não pode dar acesso preferencial a um investidor", afirma.
Garman aponta que o Brasil tem poucas tarifas a reduzir para produtos americanos, pois as taxas já são relativamente baixas.
"Você pode ter algo de promessas de investimentos de empresas brasileiras nos Estados Unidos e reempacotar coisas que já estavam no pipeline", afirma.
Ele também vê baixa possibilidade de o Brasil se comprometer a comprar mais produtos americanos, como outros países fizeram ao fecharem acordos com Trump, mas que seria possível fazer um pacote com várias pequenas concessões, de modo a dar ao presidente americano o discurso de vitória.
"Talvez você anuncie um acordo bilateral que não muda muito o jogo, mas os Estados Unidos poderão dizer que terão acesso, cooperação e poderão atender algumas demandas históricas de tarifas", diz Garman.
Nestas negociações, há ainda a incerteza de quanto tempo mais serão necessárias conversas até que se chegue a um acordo entre os dois países, e o risco de Trump mudar de opinião subitamente.
"Em um cenário em que ficam meses negociando e o Brasil não cede o suficiente para Trump ter uma vitória, ele pode endurecer a retórica, aumentar a tarifa e tomar mais medidas. Vimos isso em várias negociações com outros parceiros, como Japão e Coreia do Sul", diz Garman. A maior crise já vivida na relação entre o Brasil e os Estados Unidos ainda não tem data certa para acabar.