Nicolás Maduro, presidente da Venezuela (AFP/AFP)
Repórter de macroeconomia
Publicado em 8 de dezembro de 2023 às 17h54.
Última atualização em 8 de dezembro de 2023 às 18h24.
O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, fez mais um evento nesta sexta, 8, para avançar com o plano de anexar parte da Guiana. Frente a uma plateia de apoiadores e de militares, assinou decretos para oficializar anúncios feitos na terça-feira, 5.
Entre as medidas previstas nos decretos, estão a criação de um estado, chamado Guiana Essequiba, a oficialização de um novo mapa da Venezuela, que inclui a área em disputa, a abertura de uma divisão da petroleira PDVSA para atuar na região e conceder licenças de mineração e a criação de um Zona de Defesa Integral da nova região.
Um decreto também prevê a criação de uma alta comissão para defesa e recuperação da Guiana Essequiba. Maduro convocou a comissão para "debater a estratégia para que, até 2030 ou mais, para cumprir o mandato do povo que votou sim", uma referência à anexação. Madurou nomeou Delci Rodriguez como autoridade máxima dessa comissão.
Os dois países disputam há mais de um século o território do Essequibo, uma região de 160.000 km², rica em petróleo e minerais, que atualmente é administrada pela Guiana.
O tema voltou a ganhar força depois que a companhia ExxoMobil descobriu grandes reservas de petróleo na região. As tensões, no entanto, aumentaram depois que a Guiana concedeu as licitações a empresas estrangeiras para explorar estas jazidas.
Caracas argumenta que o rio Essequibo é a fronteira natural, como em 1777 quando a Venezuela era colônia da Espanha, e apela ao acordo de Genebra, assinado em 1966 antes da independência da Guiana do Reino Unido, que estabelecia as bases para uma solução negociada e anulava um laudo de 1899, que fixou os limites atuais. A Guiana defende esse laudo e pede que seja ratificado pela Corte Internacional de Justiça.
No domingo, 3, o governo de Nicolás Maduro fez um plebiscito no qual diz que 96% dos eleitores da Venezuela que compareceram às urnas votou a favor da anexação.
Nos dias seguintes, Maduro celebrou o resultado em vários eventos e pronunciamentos. Em um deles, exibiu o que chamou de "novo mapa da Venezuela", já com parte da Guiana anexada. Ele também nomeou um general para governar o novo território e determinou que a estatal PDVSA começasse a tomar medidas para atuar na exploração de petróleo na região. Determinou, ainda, que os moradores de Essequibo, a área em disputa, recebam documentos de identidade da Venezuela.
Além da criação de uma 'zona de defesa" por Maduro, o Brasil reforçou a presença de militares na fronteira com a Venezuela e a Guiana, e também enviará 20 veículos blindados para a área.
Recentemente, o Exército brasileiro aumentou para 130 o efetivo para patrulhamento na fronteira com a Venezuela. O Pelotão Especial de Fronteira de Pacaraima, em Roraima, que normalmente opera com 70 homens, ganhou o reforço de mais 60 militares na semana passada.
Até a tarde desta sexta-feira, 8, não. Maduro não disse se pretende fazer uma invasão militar.
Sim. Enquanto as forças venezuelanas estão entre as mais bem equipadas da América do Sul, as guianenses têm um pequeno efetivo. A Venezuela é o sexto país que mais investe na área militar no mundo, enquanto a Guiana está apenas na 152ª posição, segundo o The World Factbook, da CIA, a agência de inteligência americana.
As Forças Armadas Nacionais Bolivarianas (Fanb) têm um efetivo aproximado de 125 mil a 150 mil militares na ativa, e 8 mil reservistas, segundo dados da Agência de Inteligência Americana (CIA). Porém, além do Exército, da Marinha e Força Aérea, as Fanb também contam com mais três braços especiais, incluindo a Milícia Nacional Bolivariana e a Guarda Nacional (GNB).
Incorporada como um "componente especial" às Fanb em 2020, a Milícia Bolivariana consiste em cerca de 225 mil civis armados que recebem treinamento periódico em troca de pagamento.
A questão é que a Guiana pode receber ajuda externa em caso de invasão, especialmente dos Estados Unidos. Empresas americanas exploram petróleo na região. A Casa Branca já sinalizou que ajudaria a Guiana a se defender, e anunciou exercícios militares na região, como forma de sinalizar que está presente.
Para invadir por terra, forças da Venezuela teriam de necessariamente passar pelo território brasileiro, o que embora seja possível, não parece provável no contexto atual, disseram especialistas ao "O Globo".
A fronteira entre Venezuela e Guiana é predominantemente formada por selva, o que impede o deslocamento de colunas de viaturas blindadas e dificulta o deslocamento de tropas a pé, assim como o envio dos suprimentos necessários à manutenção das tropas em combate. Por outro lado, na fronteira com Roraima, a vegetação de campos gerais é adequada ao movimento das tropas. Uma manobra como essa evidentemente não seria permitida pelo Brasil.
É difícil estimar. Por um lado, Maduro tem comportamento considerado imprevisível e poderia começar um conflito, embora possa ter grandes perdas com uma guerra.
A Venezuela vive uma forte crise econômica há cerca de dez anos, e teria dificuldade para custear uma guerra de longo prazo sem ajuda externa. Nenhuma grande potência sinalizou apoio público à ideia de anexação.
Além disso, com a chance de que os EUA ajudem a Guiana a se defender, a Venezuela teria de enfrentar tecnologias militares de ponta.
Ao mesmo tempo, a invasão de um país vizinho esgarçaria ainda mais as relações da Venezuela com os países vizinhos e com o mundo. O país poderia ser alvo de mais sanções econômicas, o que traria dificuldades adicionais para vender o petróleo que produz e as riquezas que poderia obter ao invadir a Guiana.
Com Agência O Globo e AFP.