Jornalistas em frente ao tribunal, em Munique: a principal ré, Beate Zschäpe, de 38 anos, acusada de ter participado de dez assassinatos (Guenter Schiffmann/AFP)
Da Redação
Publicado em 6 de maio de 2013 às 13h07.
Munique - Um dos maiores julgamentos de neonazistas do pós-guerra na Alemanha teve início nesta segunda-feira, em Munique (sul), para julgar nove casos de assassinatos racistas após uma investigação marcada por escândalos e acusações de negligência que embaraçaram autoridades alemãs.
O caso, revelado no final de 2011, colocou em evidência o perigo subestimado das redes de extrema-direita alemãs.
A principal ré, Beate Zschäpe, de 38 anos, acusada de ter participado de dez assassinatos, compareceu ante o tribunal nesta manhã de calça social preta e camisa branca.
De aspecto elegante, esta mulher da ex-RDA, única sobrevivente de um trio neonazista, apareceu publicamente pela primeira vez desde que se entregou à polícia no dia 8 de novembro de 2011, depois de uma perseguição de quatro dias por toda a Alemanha.
Braços cruzados e bastante magra, argolas de prata nas orelhas, ela permaneceu de pé por vários minutos, de costas para as câmeras, cercada de policiais na sala do tribunal.
Beate Zschäpe, que viveu na clandestinidade por 13 anos, pode permanecer presa por longos anos. Ela responderá por participação em nove assassinatos xenófobos e pela morte de um policial em 2007.
Ela também é suspeita de estar envolvida em dois atentados contra comunidades estrangeiras e 15 assaltos a banco, segundo a ata de acusação.
Os dois outros membros do grupo, Uwe Böhnhardt, 34 anos, e Uwe Mundlos, 38 anos, os supostos assassinos, se suicidaram em 4 de novembro de 2011, quando estavam prestes a ser descobertos pela polícia depois de roubarem um banco.
Quatro outras pessoas, suspeitas de fornecerem ajuda logística ao grupo de assassinos, também se sentaram ao lado de Zschäpe no banco dos réus.
Diante deles, mais de 70 entidades civis, principalmente parentes das vítimas, que esperam ouvir porque seu pai, irmão ou filho foram mortos entre 2000 e 2006, e por que a polícia cometeu tantos erros durante a investigação.
"Por sua dimensão histórica, social e política, o julgamento é um dos mais importantes do pós-guerra na Alemanha", considerou o advogado de uma das famílias das vítimas.
"Justiça!", assim exclamou o jornal Abendzeitung com uma foto das dez vítimas do trio neonazista, Clandestinidade Nacional-socialista (NSU).
Em frente ao tribunal, uma coroa mortuária preta foi depositada em memória de uma das vítimas e cartazes com os retratos dos demais ocuparam a calçada.
Os advogados representando as famílias das vítimas esperam que este julgamento esclareça as circunstâncias dos assassinatos principalmente contra pequenos comerciantes, a maioria de origem turca, em toda a Alemanha.
Durante a investigação, as famílias das vítimas foram falsamente acusadas e a pista de crimes xenofóbicos não foi levada a sério pelas autoridades.
O serviço de inteligência interna, que apesar de manter "informantes" pagos no movimento de extrema-direita, também foram acusados de negligência ou até mesmo racismo.
Documentos importantes foram, por exemplo, destruídos antes que a investigação fosse concluída.
Uma comissão parlamentar de inquérito foi aberta para lançar luz sobre essas falhas.
No final de abril, a Alemanha oficialmente pediu desculpas à ONU pelos erros cometidos durante a investigação.
Antes do julgamento, a chanceler Angela Merkel, que no ano passado expressou a "vergonha" de seu país por esses crimes, garantiu ao jornal turco Hürriyet que a verdade sobre as mortes será revelada.
O Tribunal deverá responder a esta questão que envergonha a Alemanha desde a revelação do caso: como esses três neonazistas, na mira dos serviços de inteligência desde a década de 90, viveram tanto tempo sem nunca serem investigados?
Os filhos de Enver Simsek, morto em 2000 em frente a sua banca de flores, denunciaram por meio de seu advogado certa indiferença do mundo político frente aos crimes cometidos pela extrema-direita, ativa sobretudo na ex-RDA desde a Reunificação.
"É devido ao fato de que atinge um segmento frágil da população, os imigrantes?", questionaram na véspera do julgamento.
"Chegou a hora do Estado, finalmente, responder a esse perigo e não deixar a responsabilidade" apenas à justiça, de acordo com Semiya e Kerim Simsek.
Um dos advogados de Beate Zschäpe já indicou que ela não pretende comentar as acusações.
O julgamento, programado para ser concluído em janeiro de 2014, poderá se estender por mais tempo.