Guarda no antigo campo de Stutthof, Bruno Dey é acusado de envolvimento em assassinatos cometidos entre agosto de 1944 e abril de 1945, período em que atuou no local, que ficava perto da então cidade alemã de Danzig (hoje Gdansk) (Daniel Bockwoldt/Pool/Reuters)
AFP
Publicado em 17 de outubro de 2019 às 09h44.
Um guarda do campo de concentração polonês de Stutthof compareceu nesta quinta-feira no tribunal da cidade alemã de Hamburgo (norte) por cumplicidade em milhares de assassinatos, em um dos últimos julgamentos de um SS nazista.
As audiências do julgamento começaram nesta quinta e durarão pelo menos até meados de dezembro, sendo limitadas a duas por semana e no máximo a duas horas cada devido ao estado precário de saúde de Bruno Dey, de 93 anos.
"A idade não deve impedir que o julgamento seja realizado. Ele foi uma das engrenagens da maior tragédia da história", declarou um representante do Centro Simon Wiesenthal, especializado na caça de nazistas, Ephraim Zorhoff.
Dey é acusado de cumplicidade em assassinatos quando foi guarda "entre agosto de 1944 e abril de 1945" do campo de Stutthof, no norte da Polônia, a 40 km de Gdansk. Foi o primeiro campo nazista construído fora da Alemanha.
Neste campo 65.000 pessoas morreram, em sua maioria judeus dos países bálticos e da Polônia. O campo tornou-se parte do sistema de extermínio dos judeus em junho de 1944.
Dey, que tinha 17 anos na época, foi cúmplice no assassinato de 5.230 prisioneiros (5.000 "criando e mantendo condições que colocavam vidas em risco", 200 por gás e 30 com um tiro na nuca) .
O trabalho do réu era "impedir a fuga, revolta ou libertação dos prisioneiros" judeus do campo, condenados a serem mortos por bala ou pelo gás Zyklon B, segundo a acusação.
Dey era uma "engrenagem do maquinário assassino, com conhecimento de causa", acusa a Promotoria. O objetivo do julgamento é determinar se "ele apoiou conscientemente os cruéis assassinatos de prisioneiros, e de judeus em particular".
Os sobreviventes relataram que os assassinatos neste campo eram cometidos na frente dos funcionários.
O réu reconheceu durante a investigação que estava ciente do que acontecia no campo com as câmaras de gás e cremações de cadáveres, mas disse que não poderia fugir, porque corria o risco de ser morto também.
"O que eles fizeram conosco foi desumano", disse em entrevista à Deutsche Welle, uma sobrevivente do campo, Dora Roth, cuja mãe morreu de fome em Stutthof. A mulher faz parte das 28 acusações civis no processo.
"Ele é quem sabe, ele pode falar sobre isso e deve fazê-lo" na audiência, explicou Roth. "É a única maneira de evitar outro holocausto", acrescentou.
Nos últimos anos, a Alemanha julgou e condenou vários ex-SS por cumplicidade em assassinatos, ilustrando a crescente, mas tardia, severidade de sua justiça.
De fato, as Promotorias e tribunais alemães estenderam aos guardas dos campos a acusação de cumplicidade em assassinatos, anteriormente reservada a pessoas que ocupavam posições importantes na hierarquia nazista ou que estavam diretamente envolvidas nos assassinatos.
Até agora, nenhum desses condenados foi preso, em razão de seus problemas de saúde.
O caso mais emblemático foi o julgamento de John Demjanjuk no tribunal regional de Munique. Este ex-guarda do campo de extermínio de Sobibor foi condenado em 2011 a uma sentença de cinco anos de prisão. Ele morreu em 2012 antes de seu julgamento em recurso.
No início de abril, o processo de outro ex-guarda do mesmo campo nazista de Stutthof foi abandonado devido à degradação do estado de saúde do réu, de 95 anos.
Outros 23 casos desse tipo estão em andamento.