Camarões: um movimento popular reivindica a liberdade de se expressar no idioma que considerar seu (Joe Raedle/Getty Images)
EFE
Publicado em 27 de março de 2017 às 09h55.
Última atualização em 27 de março de 2017 às 09h56.
Yaoundé - Por motivos relacionados ao seu passado colonial, milhões de camaroneses preferem falar em inglês, mas seu governo, por meio do fechamento de escolas, cortes na internet, detenções e repressão em manifestações, pretende que todos os seus cidadãos se expressem em francês.
Quatro milhões das 22 milhões de pessoas que vivem no país preferem dizer "it's my right" ao invés de "c'est mon droit" ("é meu direito"), mas estão proibidas de fazê-lo em espaços públicos, o que motivou um movimento popular que reivindica a liberdade de se expressar no idioma que considerarem seu.
Nos últimos meses, a tensão entre o governo e seus cidadãos anglófonos cresceu exponencialmente e já foram registradas cinco mortes em diferentes manifestações.
As forças de segurança responderam aos protestos com repressão e violência, e detiveram centenas de pessoas. Líderes do movimento anglófono, como os ativistas Fontem Neba e Maitre Agboh, foram condenados à pena de morte, acusados de traição e terrorismo.
No final de novembro, o governo ordenou o fechamento de instituições públicas, como centros educacionais e tribunais, nas duas regiões onde se fala inglês: Buea (sudoeste) e Bamenda (nordeste).
Os poucos colégios que continuam abertos funcionam sob forte proteção policial, fazendo com que os alunos optem por se reunir entre eles em pequenos grupos de estudo e repassar as lições durante a noite.
Para aumentar a pressão, os cidadãos destas áreas receberam em janeiro esta mensagem telefônica do Ministério Telecomunicações: "Estimado assinante, saiba que quem divulgar informações falsas em redes sociais será condenado a dois anos de prisão". Desde então, o governo cortou o acesso à internet.
Sem internet e com o silêncio administrativo como resposta, são os camaroneses que vivem em outros países, como nos Estados Unidos, que continuam agora a luta através da rede.
Longe de recuar, os líderes sindicais da região declararam as segundas-feiras como "dia da cidade fantasma", nos quais são paralisadas todas as atividades de entidades públicas e comércios e os cidadãos não saem às ruas por conda das ameaças de represálias, como acontecia nos piquetes.
Esta resposta é o último recurso desta comunidade contra o governo de Camarões, que está sofrendo as consequências econômicas irreversíveis destas interrupções.
Camarões foi colônia inglesa e francesa até 1960. Quando se tornou independente de ambas as potências, instaurou um Estado Federal até realizar um referendo, em 1972, quando voltou a ser um Estado Unificado e as duas línguas se tornaram co-oficiais.
Desde então, a minoria anglófona - quase um quarto da população - se queixa de marginalização em relação à maioria francófona, além da convivência com 250 línguas locais.
A suposta discriminação afeta a desigual distribuição da riqueza e a distinção de considerar o inglês uma língua secundária. As autoridades falam francês, nos espaços públicos, e o presidente do país nunca pronunciou um discurso em inglês.
Perante esta repressão, os sindicatos pedem agora volta ao federalismo ou a independência destas regiões anglófonas.
Segundo a ativista Angela Forbin, "entre 1961 e 1972, quando Camarões era um país federal, não havia nenhum problema com a língua inglesa. As dificuldades apareceram quando nos foi imposto um só estado".
"O sistema francófono absorveu o anglófono. Queremos ter os mesmos direitos e as mesmas oportunidades" acrescentou Angela.
Apesar de cumprir com algumas exigências corporativas, a resposta por parte do governo é firme. "Não haverá federalismo ou secessão. Camarões é único e indivisível", disse à Agência Efe o ministro de Comunicação do país, Issa Tchiroma.