O chefe do diálogo com as Farc, Humberto de la Calle (C): as partes começaram o diálogo em Cuba pelo tema crucial: o problema da terra (AFP)
Da Redação
Publicado em 20 de dezembro de 2012 às 15h49.
Bogotá - O governo da Colômbia e as Farc iniciaram neste ano um histórico e difícil diálogo de paz para tentar acabar com um conflito armado de quase 50 anos, sem um cessar-fogo bilateral e com prazo para conseguir um acordo: novembro de 2013.
No dia 26 de agosto, o presidente Juan Manuel Santos anunciou o início do processo após seis meses de conversas secretas em Cuba.
O passo seguinte foi constituir a mesa de negociações em 18 de outubro na Noruega para depois levá-la a Cuba, onde já foi realizada a primeira etapa do diálogo sob o sigilo dos negociadores do governo e uma grande exposição midiática da guerrilha colombiana.
O presidente Santos, que chegou ao poder em agosto de 2010 com o aviso de que faria todo o possível pela paz, preparou o terreno com uma Lei de Vítimas e de Restituição de Terras e um Marco Jurídico para a Paz, peças-chave para estabelecer os fundamentos de futuros acordos com grupos insurgentes.
Neste contexto foi iniciado o terceiro diálogo formal entre o Estado colombiano e as Farc na história do único conflito armado ativo na América, que acumula milhões de mortes e de deslocamentos forçados, assim como incontáveis hectares de terras usurpados de trabalhadores rurais, e várias dezenas de milhares de pessoas desaparecidas.
O diálogo é uma aposta arriscada que visa, segundo o próprio Santos, não cometer os erros do passado após as tentativas fracassadas lideradas pelos ex-presidentes Belisario Betancur (1982-1986) e Andrés Pastrana (1998-2002).
A novidade deste diálogo é que as conversas são realizadas no exterior, em Havana, com Noruega e Cuba como observadores e Venezuela e Chile como fiadores do processo.
Outra diferença é que não foi declarado um cessar-fogo bilateral. A guerrilha anunciou uma trégua natalina até o final de janeiro, mas o governo deixou claro que manterá a pressão militar contra a guerrilha.
De fato, no último dia 1º o Exército bombardeou um acampamento rebelde no departamento (estado) de Nariño, na fronteira com o Equador, na operação mais contundente desde que começou o processo.
Esses fatos, somados à forte exposição midiática da guerrilha em Cuba, que quase diariamente ofereceu declarações à imprensa após uma década oculta na selva, levou os colombianos a desconfiar do processo.
Segundo uma pesquisa do instituto Datexco do final de novembro, 64% dos colombianos estão convencidos de que não haverá acordo, e a popularidade de Santos caiu de 60% para 45% em apenas três meses.
Mas alguns analistas políticos acreditam que esta é a verdadeira oportunidade para a paz na Colômbia, porque a conjuntura é propicia: um maior enfraquecimento da guerrilha e o convencimento do governo de que pela via militar não o conflito não vai terminar.
"Nenhuma das partes tem possibilidades de ganhar só através das armas, e por isso estão fortemente incentivadas a negociar", disse à Agência Efe Silke Pfeiffer, diretora na Colômbia do centro de pesquisa de conflitos International Crisis Group.
O congressista Ivan Cepeda, copresidente da Comissão de Paz da Câmara dos Representantes, foi além ao declarar à Efe que esta é "a primeira vez" que a Colômbia está "perante uma possibilidade real" de conseguir um acordo de paz com as Farc.
Ao término, em dezembro, do primeiro ciclo das negociações em Havana, que serão retomadas em 8 de janeiro, os representantes do governo e das Farc anunciaram os primeiros avanços, ao concordar em mecanismos para que a sociedade civil participe do processo com contribuições concretas através da internet e com a convocação de um fórum organizado pela ONU.
"Avançamos dentro do previsto", disse o chefe dos negociadores do governo, o ex-vice-presidente Humberto de la Calle, pouco antes de o próprio Santos também fazer um "balanço positivo" e desse como prazo até novembro de 2013 para conseguir um acordo.
As Farc também chegaram no final deste ciclo com "muito otimismo e muita esperança", segundo o número dois da guerrilha e chefe negociador dos rebeldes, Luciano Marín Arango, conhecido como "Ivan Márquez".
As partes começaram o diálogo em Cuba pelo tema crucial: o problema da terra, cuja injusta divisão situa a Colômbia como um dos países com maior desigualdade da América Latina, berço do nascimento das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) em 1964.
"Sem resolver este problema, não haverá paz", advertiu à Efe o assessor do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), Absalón Machado, um especialista em desenvolvimento agrário para quem o conflito rural colombiano "está fundamentado na luta pela terra dos camponeses contra os fazendeiros".
Os outros temas de discussão são a entrega das armas por parte da guerrilha e as garantias para que possam participar da política após um eventual acordo, assim como garantir os direitos às vítimas.