Ruanda: Para os mais de 12 milhões de ruandeses, este período anual de recordação é muito sombrio (Wikimedia Commons/Wikimedia Commons)
AFP
Publicado em 7 de abril de 2019 às 09h30.
Neste 7 de abril, Ruanda recorda o 25º aniversário do genocídio que ainda é um trauma ainda vivo, apesar de todos os avanços obtidos em um quarto de século por este pequeno país da região africana dos Grandes Lagos. Entre abril e julho de 1994, o regime extremista hutu matou ao menos 800.000 pessoas, segundo a ONU, principalmente entre a minoria tutsi e também entre os hutus moderados.
O assassinato em 6 de abril de 1994 do então presidente ruandês, o hutu Juvénal Habyarimana, foi o elemento deflagrador do genocídio. No dia seguinte, as Forças Armadas Ruandesas (FAR) e os milicianos hutus Interahamwe, fanatizados após anos de propaganda contra os tutsis, deram início aos massacres.
Os assassinatos se estenderam a todo país. Incitadas pelas autoridades e pela "mídia do ódio", todas as camadas da população se entregaram à causa. Homens, mulheres e crianças foram exterminados a golpes de machado, inclusive dentro das igrejas onde buscaram refúgio.
O massacre teve fim quando a rebelião tutsi da Frente Patriótica Ruandesa (FPR) conquistou Kigali, em 4 de julho, desencadeando o êxodo de milhares de hutus atemorizados para o vizinho Zaire (atual República Democrática do Congo).
Vinte e cinco anos após o último genocídio do século XX, as terras ruandesas continuam a revelar corpos. Jornalistas da AFP viram há alguns dias como depositaram no memorial de Nyamata (sul) os ossos de pelo menos 30 pessoas recém-encontrados em uma vala comum.
Para os mais de 12 milhões de ruandeses, este período anual de recordação é muito sombrio. "Quanto mais nos aproximamos da data, mais penso nisso. Voltam os sons, as imagens. Não consigo dormir", conta Damien Munyakayanza, um sobrevivente do massacre.
Grupos de discussões e vigílias estão previstos. Os sobreviventes recuperam e voltam a enterrar os ossos das vítimas. Memoriais também são arrumados, e tudo é tingido de violeta, a cor do luto.
O tema dos atos em memória é "Recordação, unidade e renovação" e, este ano, a ênfase é colocada na juventude, que não viveu o genocídio, mas ainda sofre as consequências.
Em questão de uma geração, Ruanda conseguiu muito, ao se tornar um polo de estabilidade política, transformando um país em ruínas em uma economia robusta com uma certa coesão social.
"Durante os últimos 25 anos, a grande preocupação, ou desafio, de Ruanda foi a reconstrução da unidade nacional", afirmou o secretário-geral da Comissão Nacional para o Combate ao Genocídio, Jean-Damascène Bizimana, em entrevista à AFP.
"Tentamos fazer todos os ruandeses entenderem que compartilhamos o mesmo país, os mesmos direitos", acrescenta. "A construção de um estado de direito foi um desafio fundamental e capital", disse ainda.
Na busca pela reconciliação, a Justiça desempenhou um papel fundamental. Dezenas dos responsáveis pelo genocídio foram condenados pelo Tribunal Penal Internacional para Ruanda (TPIR). E cerca de dois milhões de ruandeses foram julgados por tribunais populares, os "gacaca".
O "gacaca" foi baseado no princípio da confissão. Mas, em alguns casos, a ausência de remorso e o não pagamento das devidas indenizações por propriedades saqueadas, ou destruídas, têm sido um obstáculo para a reconciliação. Os ruandeses não escondem que seu país ainda tem um bom caminho a percorrer até que recupere totalmente sua tranquilidade.
Para os críticos do governo, o consenso social nada mais é, porém, do que uma fachada, que esconde o controle total do regime sobre a população. "Assegurada por uma estrutura política e administrativa onipresente, a 'reeducação' autoritária e a 'reconciliação' de um povo dividido e traumatizado pela guerra e pelo genocídio agora prevalecem em todos os domínios de atividade", diz o pesquisador francês André Guichaoua.