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Fundo do poço parece não ter fim para país que liderou o comércio global

Resorts na praia, restaurantes, lojas e bares agora estão vazios; crise tripla e coronavírus pioram ainda mais situação precária no Líbano

Libaneses em praia próxima à capital, Beirute (Kaveh Kazemi/Getty Images)

Libaneses em praia próxima à capital, Beirute (Kaveh Kazemi/Getty Images)

CA

Carla Aranha

Publicado em 26 de agosto de 2020 às 18h29.

Última atualização em 28 de agosto de 2020 às 16h44.

O fundo do poço parece não ter fim. Depois da explosão no porto de Beirute, que desalojou 300.000 pessoas e destruiu boa parte da cidade, o Líbano mergulha ainda mais na crise econômica que vem se acentuando desde o ano passado. A inflação já chegou a 112% -- itens essenciais como alimentos e bebidas registraram um aumento de preço de 336% no mês passado. Artigos como roupas e calçados não ficaram muito atrás, com aumentos médios de 470%.

Nas ruas de Beirute, o clima é de apreensão e tristeza. A capital, que já foi um oásis de príncipes e princesas no Oriente Médio, hoje pouco lembra a vida alegre e desprentensiosa que a tornou famosa. Procurada por seus resorts à beira-mar, ótimos restaurantes e uma noite animada, a cidade ainda conta os mortos da explosão do último dia 4. Os hospitais continuam cheios de feridos.

Hoje, o país pouco lembra a civilização inovadora do passado. Os primeiros habitantes do território libanês lideraram o comércio e as navegações por séculos a fio -- foram um dos primeiros a chegar à África e a fazer longas expedições pelo mundo. Uma longa guerra civil, travada entre 1975 e 1990, desacelerou o sonho de reviver a glória do passado.

Agora, o país precisa lidar com uma crise econômica, humanitária e de saúde. Nesta quarta-feira, 26, o primeiro-ministro interino, Hassan Diab, disse que o Líbano corre o risco de perder o controle da covid-19.

O número de casos quase triplicou nas últimas semanas, desde a explosão de 2.700 toneladas de nitrato de amônia no porto de Beirute. As infecções têm se espalhado principalmente nos hospitais que estão tratando pacientes que foram atingidos pela explosão.

Na terça-feira, 25, foram registrados 525 novos casos e 12 mortes. No dia 4 de agosto, quando houve o acidente que matou milhares de pessoas em Beirute, havia 5.271 infectados. No dia 25, já eram mais de 13.500. O número continua a subir. Na última sexta, dia 21, o governo decretou um lockdown, com toque de recolher entre as 18h e 6h.

Os comerciantes e donos de bares e restaurantes, no entanto, se recusam a fechar as portas no horário definido pelo governo por causa da crescente crise econômica.

Atualmente, 55% dos libaneses vivem abaixo da linha de pobreza. O governo, imerso em uma crise fiscal e econômica sem precedentes, diz não ter mais o volume de recursos necessário para honrar a folha de pagamento dos servidores públicos, inclusive dos profissionais de saúde que trabalham nos hospitais públicos. "O buraco parece ser sempre mais fundo", diz o fotógrafo Ali Skaf, de 40 anos. "Muitos jovens estão querendo sair do país em busca de uma vida melhor".

O descontrole dos gastos públicos e um esquema econômico em que os bancos privados faziam empréstimos ao banco central mergulharam o país em um abismo econômico. Com uma dívida pública que passa de 150% do PIB e a redução drástica dos petrodólares, a economia se desmanchou.

O Líbano era procurado por sauditas e milionários de outros países árabes como um destino de final de semana e férias. Os clubes, restaurantes e lojas de Beirute viviam lotados. O aumento da influência política de grupos radicais xiitas, como o Hezbollah, espantou os ricaços estrangeiros que investiam em imóveis e levavam dólares para o país.

As reformas estruturais também emperraram, o que fez com o Fundo Monetário Internacional (FMI) não liberasse um empréstimo de bilhões de dólares. Agora, o país também precisa lidar com o aumento de casos do coronavírus e um desastre humanitário que deixou milhares de mortos e feridos. "O libanês é um povo aguerrido, com um histórico de grandes superações, mas agora tememos pelo futuro", diz Skaf.

 

 

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