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Família divulga carta de refém americana morta na Síria

Sequestrada desde 2013 na Síria, Kayla Mueller foi declarada morta pelos EUA. No ano passado, ela enviou uma carta para a família. Veja o que ela tinha a dizer


	Kayla Mueller: americana de 26 anos era refém do EI desde 2013, quando foi sequestrada em Aleppo, Síria
 (Reuters)

Kayla Mueller: americana de 26 anos era refém do EI desde 2013, quando foi sequestrada em Aleppo, Síria (Reuters)

Gabriela Ruic

Gabriela Ruic

Publicado em 10 de fevereiro de 2015 às 15h57.

São Paulo – O presidente americano Barack Obama confirmou nesta terça-feira a morte de Kayla Mueller, a trabalhadora humanitária americana mantida como refém pelos extremistas do Estado Islâmico (EI) na Síria.

Na última sexta-feira, militantes do grupo alegaram que ela teria sido morta em um ataque das forças de coalizão lideradas pelos Estados Unidos, mas executado pela Jordânia, na cidade de Raqqa, conhecida informalmente como a capital do EI. Na ocasião, contudo, não ofereceram provas do que havia acontecido.

Durante o último final de semana, informou a rede de notícias CNN, a família de Kayla recebeu uma mensagem de um dos membros do EI, na qual eram contados os pormenores do episódio fatal. Após ter a sua veracidade confirmada, o governo dos EUA reconheceu a morte da jovem de 26 anos.

“Estamos de coração partido de informar que Kayla Jean Mueller perdeu sua vida”, declarou a família em comunicado divulgado pela CNN. “Ela era uma humanitária apaixonada, devotada e dedicou toda a sua breve vida a ajudar aqueles que precisam de liberdade, justiça e paz”. 

Carta

Após divulgar o comunicado lamentando a morte de Kayla, a família da americana tornou pública uma carta escrita por ela no ano passado e que foi enviada por algum dos reféns libertados na época, mas cujo nome não foi revelado.

Veja abaixo a carta enviada pela jovem para a família, traduzida do inglês para o português.

Pessoal, se vocês receberam esta carta, isto significa que eu ainda estou detida, mas que meus colegas de cela (a partir do dia 2 de novembro de 2014) foram libertados. Eu pedi para que eles entrassem em contato com vocês e que enviassem esta carta.

É difícil saber o que dizer. Por favor, quero que saibam que eu estou em um lugar seguro, completamente ilesa, saudável (engordei um pouco, inclusive) e que tenho sido tratada com o maior carinho e respeito.

Eu quis escrever uma carta bem pensada (não sabia se meus colegas de cela seriam libertados nos próximos dias ou meses, o que restringiu um pouco do meu tempo), mas consegui apenas escrever um parágrafo por vez, pois só de pensar em vocês, sou tomada por lágrimas.

Se disserem que eu sofri durante essa experiência, foi apenas por saber o sofrimento que causei. Jamais pedirei o seu perdão, pois sei que eu não mereço ser perdoada.

Sempre me lembro de a mamãe dizer que, no fim das contas, a única coisa que temos é Deus. Eu vivi uma experiência na qual tive que me render ao nosso criador, pois, literalmente, não havia ninguém mais. Com Deus e as orações de vocês, me senti ternamente abraçada.

Fui mostrada à escuridão e a luz, e aprendi que, mesmo na prisão, uma pessoa pode ser livre. Sou grata. Percebi que há algo bom em todas as situações, só é preciso enxergar. Rezo todos, todos os dias para que tenham se aproximado e se rendido a Deus e que tenham formado um vínculo de amor e apoio. Sinto a falta de vocês como se tivéssemos vivido uma década de separação forçada.

Tive muitas horas para pensar, para pensar em todas as coisas que farei com o Lex, pensar em nosso primeiro acampamento e o primeiro reencontro no aeroporto. Tive muitas horas para pensar como apenas com a sua ausência é que hoje, aos 25 anos, finalmente entendi o lugar de nossa família em minha vida. O presente que é cada um de vocês e a pessoa que eu poderia ser, ou não, se não tivessem feito parte da minha vida. Minha família, meu apoio.

Eu NÃO QUERO que as negociações para a minha libertação se tornem um dever e, se houver outras opções, peço que aproveitem, mesmo que isso signifique uma demora maior em todo o processo. Isso jamais deveria ter se tornado o seu fardo.

Eu pedi para que estas mulheres ajudassem vocês. Por favor, procurem por elas, caso não tenham feito isto ainda, [nome apagado do documento original] pode entrar em contato com [nome apagado do documento origina], que tem alguma experiência com estas pessoas.

Nenhum de nós jamais imaginou que isto levaria tanto tempo, mas também estou lutando como posso – e ainda tenho muita força para lutar. Eu não irei sucumbir e não vou desistir, não importa o que aconteça.

Eu escrevi uma música há alguns meses e que diz “a parte de mim que mais me machuca é também aquela que me ajuda a sair da cama, sem a esperança de vocês, eu não teria nada”. Ou seja, a dor que vocês estão sentindo é a fonte da minha própria dor. Ao mesmo tempo, a esperança de nosso reencontro é também o que me faz forte.

Por favor, sejam pacientes e deixem a sua dor com Deus. Sei que desejariam que eu fosse forte e é exatamente isto que estou fazendo. Não sintam medo por mim, continuem a rezar, como eu também vou continuar, e, se Deus quiser, estaremos juntos novamente em breve.

Todo o meu tudo,

Kayla 

Sequestro

De acordo com o jornal americano The New York Times, Kayla estava trabalhando em um campo de refugiados na Turquia nos idos de 2013. No dia 3 de agosto, viajou para Aleppo, na Síria, com um homem descrito como o seu namorado.

Ele teria sido contratado pela ONG Médicos Sem Fronteiras para reparar o serviço de internet um hospital localizado naquela cidade. Voluntários contaram ter se surpreendido ao vê-la chegar com aquele homem, pois, na época, a maioria das entidades já havia restringido o acesso de estrangeiros ao país por conta dos riscos de sequestro. 

Dormiram no local e, no dia 4 de agosto, partiram. Foram sequestrados logo em seguida. O homem, continuou o NYT, foi libertado meses depois, enquanto que Kayla permaneceu refém. 

Abaixo, confira uma cópia da carta de Kayla e sua transcrição.

Carta de Kayla Mueller

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