"Fila para a aposentadoria, fila para comprar comida, fila para a gasolina. Não dá mais", reclamou um venezuelano (Nicolò Filippo Rosso for The Washington/Getty Images)
Estadão Conteúdo
Publicado em 7 de março de 2019 às 19h12.
Última atualização em 7 de março de 2019 às 19h13.
Maracaibo, Venezuela — Marín Mendez descansava ao sol encostado em seu Malibu depois de empurrá-lo em uma larga fila de carros num posto de gasolina em Maracaibo, ironicamente a capital do petróleo na Venezuela. As horas que esperava para encher o tanque lhe custavam muito mais que o tanque cheio — estimado no país em apenas US$ 0,1.
"Não aguento mais", reclamou, depois de passar 40 minutos imóvel na fila. "Fila para a aposentadoria, fila para comprar comida, fila para a gasolina. Não dá mais."
Em Maracaibo, onde a escassez já leva três anos, os apagões constantes também dificultam o fornecimento, porque as bombas nos postos deixam de funcionar. Apenas dois dos 150 postos da cidade tem geradores para fornecer gasolina durante os apagões.
Méndez já avalia a possibilidade de guardar o combustível em casa, apesar dos riscos envolvidos. Depende do carro para complementar a renda da aposentadoria, de apenas US$ 6 mensais. "Meus netos não sabem o que é comer carne ou frango", disse.
A escassez de gasolina não é novidade no oeste da Venezuela, depois que o governo passou a restringir o fornecimento de combustível em uma tentativa de coibir o contrabando de combustível para a vizinha Colômbia. Com as sanções impostas pelo governo americano em janeiro ao regime de Nicolás Maduro, no entanto, a escassez de combustível deve atingir toda a Venezuela.
No ano passado, a estatal do petróleo PDVSA entregava 160 mil barris por dia de gasolina para uso doméstico. Com as sanções, analistas projetam que esse fornecimento caia para 60 mil barris diário, suficientes para atender apenas 38% da demanda. Antes das sanções, no entanto, a produção de gasolina na Venezuela já vinha caindo.
Um agravante da situação é o veto americano, também incluído nas sanções de janeiro, à venda de diluentes de petróleo, usado no processamento de gasolina. Parte da demanda foi fornecida pela Rússia, mas será insuficiente para processar todo o combustível consumido na Venezuela, segundo a consultoria Caracas Capital.
Em San Cristóbal, no Estado de Táchira, os efeitos foram mais imediatos. Ali, Gerardo Márquez, um mecânico de 55 anos chegou à fila quilométrica do posto de gasolina na tarde de segunda-feira. Na terça-feira, o prometido caminhão com combustível não chegou, mas ele seguia impassível na fila. Na quarta-feira, contou com a ajuda de parentes, que lhe traziam água, comida e guardavam o carro para que ele pudesse ir ao banheiro. "Estamos com medo de sermos roubados", contou.
Em Caracas, a capital, os moradores já se preparam para a escassez de gasolina. Já há relatos de gente estocando gasolina em casa.
"A maioria dos venezuelanos não tem ideia do que vem pela frente", disse o taxista Jhaims Bastidas. "A escassez vai piorar."