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Ex-reitor da USP quer Índice de Sustentabilidade

Jacques Marcovitch, hoje professor da FEA, defende a criação de um índice para padrões de sustentabilidade dos países, a exemplo do IDH

"Proposta seria somar ao IDH, já consolidado, um Indicador de Sustentabilidade Ambiental (ISA), a ser acordado", afirmou  (Antonio Scorza/AFP)

"Proposta seria somar ao IDH, já consolidado, um Indicador de Sustentabilidade Ambiental (ISA), a ser acordado", afirmou (Antonio Scorza/AFP)

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Da Redação

Publicado em 19 de junho de 2012 às 10h11.

Rio de Janeiro - Cerca de 50% da energia elétrica no Brasil é consumida pelas indústrias, sendo que 30% dela se restringe a seis setores: cimento, aço, alumínio, ferro, petroquímica e papel e celulose. Apenas as empresas do setor de alumínio utilizam 8% de toda a energia do país.

A fim de rever processos e insumos, pesquisadores e representantes do governo brasileiro e do setor produtivo nacional – siderúrgico e de mineração – se reuniram no Rio de Janeiro para debater as principais ações das indústrias para a redução dos gases de efeito estufa (GEE) e avaliar a negociação multilateral em cena na RIO+20.

Um dos participantes no painel “Diálogo sobre a mudança do clima – cenários nacional e internacional”, organizado pelo sistema Fiesp/Firjan, foi o economista Jacques Marcovitch, professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP).

“Quando anunciamos objetivos de desenvolvimento sustentável, dizemos, em outras palavras, que sabemos onde queremos chegar. Mas, para atingir a convergência, temos que passar da retórica para as métricas. Um discurso ambiental mais estruturado em métricas do que na retórica evitaria desgastes entre os participantes da RIO+20”, afirmou Marcovitch, que foi reitor da USP, presidente de empresas de energia (Cesp, CPFL, Eletropaulo e Comgás) e secretário de Economia e Planejamento do Estado de São Paulo.

Marcovitch defende a criação de um índice para padrões de sustentabilidade dos países, a exemplo do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que mede indicadores como educação e saúde.

Coordenador do estudo “Economia das Mudanças Climáticas no Brasil” e autor dos livros “Para Mudar o Futuro: Mudanças Climáticas, Políticas Públicas e Estratégias Empresariais (2006) e A Gestão da Amazônia - Ações Empresariais, Políticas Públicas, Estudos e Propostas (2011), Marcovitch destaca o que o Brasil fez e ainda precisa fazer para estruturar uma economia verdadeiramente verde e o papel que a indústria deve desempenhar.


– O senhor defende a criação de um indicador para medir o desenvolvimento sustentável de um país. Como seria esse indicador?

Jacques Marcovitch – A proposta seria somar ao Indicador de Desenvolvimento Humano (IDH), já consolidado, um Indicador de Sustentabilidade Ambiental (ISA), a ser acordado. Dessa soma poderá resultar um Indicador de Desenvolvimento Sustentável (IDS).

Apesar de suas inter-relações, a distinção entre a mensuração do desenvolvimento humano e da sustentabilidade ambiental permite focar melhor as políticas públicas e as responsabilidades dos dirigentes responsáveis pela sua implantação.

– O que o senhor apontaria como êxito na política ambiental do Brasil?

Marcovitch – Destaco o que fizemos até agora na área de energia, primeiramente. Na área de alimentos, fomos capazes de construir uma infraestrutura que permite ao Brasil não somente oferecer segurança alimentar à sua população como também ser um exportador líquido.

Em saúde pública, o Brasil é visto como um grande gerador de conhecimento. A tecnologia utilizada no monitoramento da Amazônia é outro exemplo. Nessas áreas conseguimos avançar muito, o que não quer dizer que devemos parar por aí.

– De que maneira o Brasil pode transformar seu potencial ambiental em vantagem?

Marcovitch – Desatrelando o crescimento econômico com uso de recursos naturais da evolução das emissões de gases de efeito estufa e de dejetos, promovendo a inovação tecnológica como instrumento de crescimento com sustentabilidade ambiental e ampliando a sua cobertura florestal e preservando a biodiversidade.

– Há uma tendência de se dizer que o Brasil ocupa uma posição confortável por ter uma matriz energética limpa, baseada em fontes renováveis. Também tem se destacado a eventual redução no desmatamento. Como o senhor vê todo esse otimismo?

Marcovitch – Para podermos oferecer propostas é preciso enxergar o que ainda falta fazer. A tendência de se conformar com o que foi feito beira a passividade. Lógico que precisamos ver os êxitos, mas o êxito não pode ser apresentado como um sinal de que continuaremos acertando.


O fato de o desmatamento declinar no Brasil nos dá uma segurança. Mas esse declínio quer dizer apenas que estamos menos pior do que no passado e não é uma garantia de que a curva vai se manter. Não devemos esquecer que já degradamos 18% da Amazônia, o que é muito. O volume que degradamos por ano ainda é absolutamente elevado.

Tivemos, de 2001 para cá, uma robotização do monitoramento, na luta contra o terrorismo. Não era uma ação ambiental. Mas por que não utilizamos essa evolução tecnológica na área de óptica, de nanotecnologia e de monitoramento de alta definição a distância para lutar contra o desmatamento ilegal? Isso sem falar nas tecnologias que reduzem a emissão de gases do efeito estufa, que geram emprego e que ao mesmo tempo diminuem a degradação do planeta.

– Como é possível estruturar concretamente a chamada economia verde, conciliando suas três dimensões: econômica, ambiental e social?

Marcovitch – A economia verde é aquela que vai responder ao desafio trazido pela ciência – que alertou que o acúmulo de gases de efeito estufa pode ter uma influência sobre as mudanças do clima – e, portanto, temos uma métrica clara de concentração de gases. Resolver essa questão significa levar em conta as dimensões social e econômica, é preciso ter uma equação que leve em conta esses dois pilares.

– E qual é o papel da indústria nesse processo, levando em conta que ela é também responsável pela emissão de gases e é a maior consumidora de energia?

Marcovitch – Sempre haverá 10% da indústria que é pioneira e inovadora. A questão é como convencer os outros 90% a fazer o mesmo. Os que fazem deveriam ser valorizados – por meio de um leque de incentivos oferecidos pelas legislações municipal, estadual e federal – e os que não fazem devem ser induzidos a fazer.


– Quais setores da indústria o senhor citaria como exemplos dos que mais têm se adaptado ao cenário de sustentabilidade ambiental?

Marcovitch – Setores globalizados como o de cimento tiveram um crescimento anual de 6% de 1992 a 2009. Isso mostra que se trata de um setor dinâmico que deveria ser uma fonte de importantes inovações. Durante esse período, houve duas tendências: o crescimento da demanda em função da expansão de moradias e uma pressão crescente dos consumidores, da sociedade civil e de alguns acionistas para que fossem adotadas tecnologias mais limpas.

Algumas iniciativas ambientais do setor podem ser encontradas no uso mais racional da água, na redução de emissão de quilo de CO2 por tonelada produzida, no monitoramento de outros gases de efeito estufa, na adoção do coprocessamento, na recuperação de áreas degradadas, na profissionalização da gestão ambiental. Apesar desses esforços, a tonelada de cimento produzida no Brasil em 2011 ainda emitiu 567 quilos de CO2. Isso evidencia o quanto ainda está por se fazer nessa área.

 – No momento em que o Brasil sedia a Conferência da ONU sobre Desenvolvimento Sustentável (RIO+20) o governo anuncia a redução do IPI para estimular a compra de carros novos. Como conciliar a sustentabilidade com o incentivo à produção e ao consumo dos automóveis, grandes poluidores?

Marcovitch – No caso do setor automotivo, a etiquetagem obrigatória deve informar o consumidor da eficiência energética e da emissão de poluentes de cada veículo. Além disso, é preciso haver uma simetria entre os incentivos para a produção e comercialização de carros de baixa emissão de poluentes e os desincentivos para os carros de alta emissão. Somente dessa forma o setor produtivo e o consumidor receberão a sinalização pertinente para o alinhamento urgente às prioridades ambientais. Nesse sentido, a redução do IPI deve priorizar os carros de elevada eficiência energética e de baixa emissão de poluentes.

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