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Ex-bancários se tornam cuidadores de idosos no Japão

No Japão, muitas empresas estão incentivando trabalhadores a ajudar idosos, em parte pelo senso de dever cívico, em parte pelos negócios


	Idoso: no Japão, estima-se que 8 milhões de pessoas têm demência ou mostram sinais de estar desenvolvendo a doença
 (Marcos Santos/USP Imagens/Fotos Publicas)

Idoso: no Japão, estima-se que 8 milhões de pessoas têm demência ou mostram sinais de estar desenvolvendo a doença (Marcos Santos/USP Imagens/Fotos Publicas)

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Da Redação

Publicado em 26 de dezembro de 2014 às 17h39.

Tóquio - Eles entravam no banco e pediam seu dinheiro. Yuriko Asahara, atrás do balcão, verificava onde eles o colocavam: no bolso lateral de uma sacola de mão ou talvez no fundo de uma bolsa.

Asahara não estava espionando. Ela sabia que uma ou duas horas depois teria que lembrá-los novamente. Muitos dos seus clientes sofriam de demência senil e ao longo de duas décadas a gerente de banco se tornou uma especialista autodidata na doença.

Mundialmente, um total estimado de 44,4 milhões de pessoas sofre de demência e a projeção é de que o número triplicará para 135,5 milhões em 2050 com o envelhecimento da população, estima a Alzheimer’s Disease International, a associação internacional sobre a doença.

O problema é mais agudo no Japão, onde estima-se que 8 milhões de pessoas têm demência ou mostram sinais de estar desenvolvendo a doença. Até 2060, 40 por cento dos japoneses terão mais de 65 anos, fatia maior que a atual, de 24 por cento, segundo o Instituto Nacional de Pesquisa Populacional e de Seguridade Social do país.

“No início eu não entendia por que elas perdiam coisas tantas vezes em um mesmo dia e me frustrava”, disse Asahara, ex-gerente de uma agência da Japan Post Holdings Co., maior detentor de depósitos bancários do país. “Aos poucos eu aprendi a olhá-los nos olhos e a tentar sentir o que poderia estar ocorrendo em suas mentes”.

O governo japonês, confrontado por uma dívida recorde, está aumentando as tarifas e reduzindo o acesso aos lares de idosos financiados pelo Estado. Com cerca de 520.000 idosos nas listas de espera por um lugar, muitos passam os dias vagando por shopping centers e indo aos seus bancos para verificar suas poupanças.

Mais empatia

As empresas estão incentivando trabalhadores como Asahara, 64, que se aposentou neste ano, a ajudar idosos esquecidos a se guiarem em suas lojas.

O impulso vem, em parte, de um senso de dever cívico. E também da percepção de que ajudar os mais velhos é bom para os negócios. O mercado de bens e serviços adquiridos por idosos atingiu 100 trilhões de ienes (US$ 830 bilhões) em 2012, segundo o NLI Research Institute, em Tóquio.

As corporações que miram negócios para os mais velhos fazem parte de um fenômeno nacional que ocorre em um Japão que está envelhecendo. Cerca de 5,4 milhões de pessoas, de gestores imobiliários a funcionários de bancos e de lojas e até crianças, fizeram um curso financiado pelo governo para aprenderem sobre a demência e sobre como se comportar melhor com pessoas que mostram sinais da doença.

Muitas autoridades de países desenvolvidos prometeram combater a demência, enfatizando o cuidado com base na comunidade. Em dezembro do ano passado, o Grupo dos Oito países estabeleceu uma meta de encontrar uma cura para a demência ou uma forma de modificar o curso da doença até 2025.

“Existe uma compreensão de que não deveríamos confinar as pessoas”, disse Marc Wortmann, diretor-executivo da Alzheimer’s Disease International. Em vez disso, as comunidades deveriam “tentar integrá-las e mantê-las na sociedade”.

Banco de Asahara

Mais de uma dezena de clientes precisavam de uma assistência a mais na agência bancária de Asahara, segundo a ex-gerente. Ela e cinco colegas aprenderam a ser pacientes e a escutar.

Eles passavam horas ajudando esses clientes a encontrar senhas perdidas, zerar PINs para caixas automáticos e entender suas contas de serviços públicos. Muitos clientes idosos ficam obcecados com o dinheiro, disse Asahara.

A agência que Asahara gerenciava está localizada no coração de Nagabusa, que fica fora do centro da cidade de Tóquio e representa muitas das cidades do subúrbio do país que estão envelhecendo. A área é ocupada por fileiras de apartamentos parecidos onde moram mais de 3.000 famílias. Construídos nos anos 1960 e 1970, eles receberam famílias jovens quando Tóquio organizou as Olimpíadas em 1964 e a economia do Japão teve uma rápida expansão.

Cinquenta anos depois, os moradores envelheceram e seus filhos se mudaram. Os idosos acima de 65 anos respondiam por 29 por cento da população da área em 2011, acima da média nacional, segundo dados do governo.

Asahara, que assumiu o emprego de sua mãe, viu o bairro mudar ao longo dos anos. “Pouca coisa me fazia imaginar que seria assim quando eu comecei”, disse ela. “Mas esta é a realidade de um país que está envelhecendo”.

Agora que Asahara se aposentou, seu filho Takushi Asahara, 36, que ingressou no Japan Post há alguns anos, assumiu o posto dela. Há oito meses no cargo, ele disse que a extensão do envelhecimento da comunidade excedeu o que ele havia imaginado.

Takushi disse que fica impressionado de ver como os funcionários que trabalham na agência tratam os clientes idosos.

“No começo eu pensava que a agência deveria focar em expandir o negócio em vez de gastar tanto tempo lidando com os idosos e seus problemas”, disse ele. “Eu aprendi que eu estava errado. Nós precisamos cuidar bem deles para a nossa sobrevivência”.

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