Evo Morales: presidente boliviano foi reeleito com polêmica nas votações (Ueslei Marcelino/Reuters)
AFP
Publicado em 3 de novembro de 2019 às 16h21.
São Paulo – O presidente boliviano, Evo Morales, reeleito há duas semanas em uma votação polêmica, afirmou neste domingo que seus rivais "buscam mortos" ao pedirem apoio aos militares na disputa política.
Os opositores "estão buscando mortos que venham da polícia e das Forças Armadas", disse Morales, um dia depois de um influente líder opositor regional convocar os militares a intervir na crise gerada pela apuração polêmica das eleições de 20 de outubro.
"Quem pedir a intervenção militar estará pedindo sangue, morte", declarou o ministro do Interior, Carlos Romero.
Em um comício neste sábado à noite, Luis Fernando Camacho, chefe de uma poderosa entidade civil na rica região de Santa Cruz, lançou um ultimato a Morales para que renuncie em 48 horas, e convocou os militares a se colocarem "do lado do povo".
"(Morales) tem 48 horas para renunciar, porque nesta segunda-feira às sete horas da noite (20h00 no horário de Brasília), vamos tomar medidas e garantiremos sua saída", disse Camacho a uma multidão em Santa Cruz, reduto da oposição.
Camacho, líder do Comitê Cívico de Santa Cruz, leu uma carta dirigida aos chefes das Forças Armadas, a quem pediu para "estarem ao lado do povo" nesta crise desencadeada pela polêmica reeleição de Morales, no poder desde 2006.
O ministro Romero afirmou que a convocação de Camacho "coincide com informações da inteligência que assinalam que uma ação violenta estaria sendo preparada para amanhã à noite na praça Murillo", onde fica a sede do governo, em La Paz.
"Defender a democracia"
A oposição boliviana exige a anulação da votação e a convocação de novas eleições gerais (presidenciais e legislativas).
Camacho é o primeiro político boliviano a chamar a intervenção militar nesta crise, mas suas declarações podem ser consideradas como "sedição", um crime punível pelo Código Penal Boliviano, explicou à AFP um especialista em direito que pediu para não ser identificado.
A intervenção militar é uma questão altamente sensível na Bolívia, que antes de 1982 sofreu uma série de revoltas e ditaduras militares. Até agora, as Forças Armadas ficaram de fora da polêmica pós-eleitoral.
Morales denuncia há uma semana que a oposição tenta derrubá-lo através de um "golpe de Estado", motivo pelo qual ele convocou seus apoiadores a "defender a democracia e os resultados eleitorais" de 20 de outubro.
Camacho não disse quais medidas adotará, mas presume-se que possa ocupar escritórios regionais de entidades e empresas públicas.
O comício de Santa Cruz contou com a presença de líderes de comitês e organizações cívicas de outras regiões da Bolívia.
Rechaço a auditoria
Desde o início dos protestos, no dia seguinte à votação, foram registrados dois mortos e cerca de 140 feridos.
A oposição afirma que o presidente de esquerda foi reeleito de forma "fraudulenta". O sistema de contagem rápida ficou paralisado por 20 horas e, quando retomado, produziu uma mudança drástica e inexplicável da tendência, segundo observadores da OEA.
Os opositores afirmam que Morales está determinado a permanecer no poder a todo custo e recordam que o chefe de Estado ignorou um referendo realizado em 2016 no qual os bolivianos rejeitaram a reeleição por tempo indeterminado. Uma polêmica decisão em 2017 de um tribunal constitucional permitiu que ele se recandidatasse.
A incerteza sobre uma auditoria eleitoral da OEA aumentou após a renúncia surpresa do chefe da missão da organização, o mexicano Arturo Espinosa, depois de admitir que havia publicado artigos críticos sobre Morales.
A oposição boliviana rejeita a auditoria da OEA, incluindo o ex-presidente Carlos Mesa (2003-2005) e candidato à presidência, por considerar "uma manobra de distração para manter Morales no poder" .
O movimento de Mesa realizará uma assembléia neste domingo para definir os passos a serem seguidos em sua busca pela renúncia de Morales.