Etanol: tarifa básica dos EUA sobre o etanol é de apenas 2,5%, enquanto o Brasil impõe uma taxa de exportação de 18% sobre o produto americano (Freepik)
Publicado em 25 de novembro de 2025 às 10h34.
Última atualização em 25 de novembro de 2025 às 10h45.
O governo brasileiro está próximo de permitir que fabricantes de etanol dos Estados Unidos participem do RenovaBio, a política nacional de biocombustíveis que estimula a adoção de etanol e biodiesel no país.
"O questionamento para importação de produtos americanos e biocombustíveis está praticamente resolvido", disse o vice-presidente Geraldo Alckmin, em discurso por vídeo no Encontro Empresarial BR-US 2025, organizado pela Amcham (Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos), em São Paulo, nesta terça-feira, 25.
Em seguida, Tatiana Prazeres, secretária de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), deu mais detalhes das negociações.
"Isso [a fala de Alckmin] tem a ver com a possibilidade de empresas americanas se beneficiarem do Renova Bio, que é um pleito antigo dos Estados Unidos. Então houve ajustes nas regras do Brasil de maneira a facilitar que empresas americanas tenham acesso a esse programa", disse Prazeres, durante conversa com jornalistas.
A venda de etanol dos EUA ao Brasil é um dos principais debates na relação comercial entre os dois países.
Em fevereiro deste ano, ao justificar suas tarifas sobre outros países, o etanol brasileiro entrou no radar de Donald Trump, que o apontou como um exemplo de "injustiça" tarifária.
“A tarifa dos EUA sobre o etanol é de apenas 2,5%, enquanto o Brasil impõe uma taxa de exportação de 18% sobre o produto americano”, dizia o documento.
O RenovaBio é a principal política nacional voltada à redução das emissões no setor de transportes. Criado em 2017, o programa estabelece metas anuais de descarbonização para distribuidoras de combustíveis.
Para cumprir essas metas, as usinas precisam adquirir CBIOs — créditos de descarbonização — emitidos por produtores de biocombustíveis certificados. Quanto mais eficiente for o processo produtivo de uma usina, maior é o número de créditos que ela pode gerar e vender.
Se o governo permitir a entrada de produtores americanos, usinas de etanol de milho dos Estados Unidos passariam a disputar esse mercado com os produtores brasileiros, que hoje são os principais emissores de CBIOs. A mudança ampliaria a oferta de créditos no país e poderia influenciar preços e a dinâmica de cumprimento das metas.
Ao mesmo tempo, abre um debate sobre competitividade, já que parte do setor sucroenergético brasileiro teme perder espaço em um mercado que é uma das principais fontes de receita adicional para quem produz etanol no país.
Segundo Bruno Wanderley, da Datagro consultoria, a própria lei do RenovaBio já prevê a possibilidade de certificação para o etanol importado. Hoje, apenas os produtores nacionais podem emitir CBIOs — quem importa etanol não tem esse direito.
“No entanto, isso deve mudar quando houver uma regulamentação específica para permitir que o etanol vindo de outros países também passe pelo processo de certificação. Esse processo incluirá a definição da pegada de carbono do produto, o volume elegível e outros critérios técnicos necessários para que o etanol importado possa gerar CBIOs no futuro”, diz.
Para Wanderley, permitir que empresas que importam etanol emitam CBios não deverá provocar impactos significativos no mercado, uma vez que o preço do CBio anda muito baixo, em torno de R$ 35/crédito. Ou seja, a depender da nota de eficiência energética-ambiental, e do volume elegível desse etanol eventualmente certificado no programa RenovaBio, o prêmio sobre o etanol importado seria de menos de 2-3 centavos de real por litro", diz.
"Um ponto de inflexão no mercado seria mesmo a redução da tarifa de importação sobre o etanol importado. Isso sim poderia provar um grande impacto no mercado, sobretudo agora que os preços do etanol no mercado doméstico estão em alta, arrefecendo um pouco o impacto negativo da queda dos preços do açúcar no fluxo de caixa das usinas", afirma.
Mesmo com a tarifa maior, os EUA devem exportar 650 milhões de litros de etanol para o Brasil em 2025/26, um crescimento de 160% em comparação com a safra anterior, avalia a Datagro, consultoria agrícola.
"A expectativa é de que os EUA aumentem a sua presença no mercado brasileiro de etanol, sobretudo caso haja a negociação da tarifa", afirma a consultoria em relatório divulgado em outubro.
O crescimento nas importações de etanol neste ano é impulsionado pelo aumento da demanda, especialmente em função da elevação da mistura de etanol na gasolina, que passou de 25% para 30% desde agosto.
Isso, aliado à quebra na produção de etanol de cana, tem contribuído para a recuperação dos preços no mercado interno, apesar do aumento na produção de etanol de milho.
Em 2024, os EUA aumentaram suas exportações globais de etanol em 34,8%. Os embarques do biocombustível americano cresceram pelo 15º ano consecutivo, atingindo um valor recorde de US$ 7,5 bilhões.
Se o Brasil eliminar as tarifas sobre as importações de etanol dos EUA, o biocombustível americano pode ganhar espaço no Nordeste, região com déficit de oferta, o que pressionaria os preços internos e afetaria o mercado do Centro-Sul, principal polo produtor de etanol do país, segundo a Datagro Consultoria.
"Se o Brasil ceder à pressão de Trump, o mercado, especialmente o nordestino, seria inundado pelo etanol norte-americano, o que reduziria os preços para os produtores em todo o país, pois também afetaria as transferências de etanol da região Centro-Sul para o Norte-Nordeste, cujo volume médio anual é em torno de 1 bilhão de litros", afirma a consultoria.
Outro fator que favorece a importação é o custo: o etanol norte-americano é mais barato do que o etanol brasileiro. Ele chega às regiões Norte e Nordeste 12% a 15% mais barato em relação ao produto nacional.
Normalmente, o Brasil compra o biocombustível americano em momentos de alta demanda interna, quando a produção local não consegue suprir as necessidades. Esse etanol é utilizado na mistura obrigatória de 30% de etanol anidro na gasolina.